quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Nada é mais longo que o dia

“Nada mais tenho que o nada.” (Fernando Pessoa)

Quando foi que comecei a olhar para as pessoas e achar que sou absolutamente insuficiente para elas? Quando se tornou normal eu me sentir inferior por não ser objeto de desejo de um homem, hétero, independente se bonito ou não? Desde quando a aprovação dele se tornou condição sine qua non para que eu me considere capaz ou, pelo menos, digno de existência? Desde quando me tornei dependente da aprovação do meio a esse ponto? Sem a necessidade de diminuir o outro, mas desde quando eu passei a esperar o juízo de um homem medíocre, como eu? 

Desde quando e até quando? 

Até quando vou pedir por atenção assim, esperar por um desejo como o meu desejo, que nasce de uma simples atenção, até mesmo da mais tênue educação? Até quando eu vou implorar, me humilhar, rastejar, esperar por uma resposta que não vai e nem pode vir porque as pessoas não são condicionadas ao que eu espero delas. Até quando vou esperar que algum cara me queira só porque o achei educado ou simpático e quero mais atenção e ternura? Até quando eu vou esperar por algo que eu sei que não existe? 

Porque eu sei que não há amor, não há esperança, não há desejo, pelo menos não quando se trata de mim. Porque eu sou diferente. Eu sou pior que todos eles. Se eles são medíocres, eu estou ainda mais abaixo, num nível tão patético que nem se pode dizer humano. Sou apenas um animal, um bichinho esperando por afago. E eles? Bem, todos devem preferir ficar com a prostitua mais suja a me dar um beijo sequer. Um animalzinho que merece ser sacrificado, de tão patético. 

Por isso o que ganho é apenas o silêncio. O último lugar. 

É bem significativo quando Fernando Pessoa disse "nunca amamos ninguém. Amamos - tão somente, a ideia que fazemos de alguém. É um conceito nosso - Em suma, é a nós mesmos - que amamos."

Com a mente à beira de um colapso, eu reconheço boa parte da minha estupidez. O exagero nos remédios, as noites sem dormir, as compras desmedidas. Não porque isso prejudica minha saúde, apenas porque torna mais difícil o que já é insuportável. E quanto mais eu penso nisso, mais forte se torna essa convicção paradoxal.

Mas penso, por exemplo, no amanhã. Preciso iniciar as artes da festa do padroeiro, organizar algumas publicações pro resto da semana e tenho um compromisso simples à noite. Para os dois primeiros, preciso de silêncio, o que só consigo por um instante de manhã enquanto o bebê dorme e a tarde ainda menos. E a tarde é o problema, porque as horas parecem se arrastar longa e indefinidamente, como se entrasse num eterno retorno. Leio, durmo, olho as redes sociais e parece que não se passaram nem cinco minutos. Um longo e cruel tormento. 

Já não consigo estudar como antes, seja por meio das aulas ou da leitura. Tampouco consigo assistir nesse tempo, o barulho ao meu redor é demais. Então minha única fuga é dormir, e antes eu dormir por horas e horas pra evitar esse transtorno. Mas agora os remédios já não fazem efeito. Só sinto aumentarem as dores, refluxo, o que só torna o dia ainda pior. E ai quando chega a noite, estou exausto e não quero sair. Por isso venho fugindo de compromissos. 

Hoje, depois de uma manhã caótica envolvendo quedas, problemas financeiros, discussões, e uma tarde de terapia em grupo, eu só consegui chegar em casa e dormir. Nada mais se fixava na minha mente e amanhã terei que reler algumas conversas para saber se esqueci algo, porque minha memória também anda bem falha, o que parece ser um combinado do meu estado depressivo com minha irresponsabilidade e consequente dependência dos remédios. 

Mas não estou demonizando-os, antes disso, estou me culpando, culpando meu corpo estúpido por não conseguir mais assimilar a única coisa que nos deu um mínimo de descanso e prazer nessa existência demasiado longa e profundamente miserável, a qual repudio e amaldiçoo com todas as minhas forças, não que tenha restado muto delas.  

Bem, mas é isso. Com a mente acelerada, o corpo em desequilíbrio total, só posso passar um chá, respirar fundo e torcer pra ter uma boa noite de sono. Sem remédio vai ser difícil. Droga. O que um homem precisa fazer pra ter um pouco de tranquilidade nesse inferno? 

“E a única salvação é não nascer.” (Sófocles)

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