Deus, não permita que minhas ilusões sejam para mim mais do que a realidade que criastes. Dai-me a virilidade de aceitar com coragem aquilo que as coisas são, como elas são, sem que minha mente infantil queira mudá-las. Que as pessoas do mundo não sejam nada para mim, além de almas a serem salvas, e que eu nada seja para elas, sem a necessidade e o desejo profundo de querer moldá-las à minha imagem e semelhança.
Pois o preço de todo apego é a decepção de uma ilusão destruída, restando apenas a ruína, dessa idealização maligna. Que eu não queira a aprovação, o amor, a admiração e o desejo daqueles que nem sequer olhariam para mim. Que eu não deixe esse desejo pervertido tomar minha atenção, tomar meu coração, de modo que eu já não consiga ver a verdade.
Que eu não deixe de sentir a tristeza, mas que ela não me paralise jamais, que eu possa continuar andando, ainda que em lágrimas, que eu possa continuar andando olhando pro céu, ainda que esteja rastejando. Que eu não chore em vão, que eu não me abale a ponto de perder a esperança, não de um mundo onde seja amado, mas de um mundo onde possa amar.
Que eu não deixe de admirar a luz da rua refletida nas gotas de chuva à noite, ou o orvalho pela manhã. Que a brisa fresca ainda possa beijar minha face, que o perfume da terra molhada ainda possa inebriar. Que tudo que é belo me recorde, que eu não posso colocar nas criaturas as minhas esperanças, mas que delas apenas aprenda a ver a transcendente verdade de Tua presença.
Deus, me dê coragem de viver, e não apenas animado eu, pois, de tamanha falta de virtude, que me sinta feliz com as conquistas terrenas que nada significam diante da eternidade. Deus, que eu não coloque os homens em Teu lugar. Deus, que as carícias não sejam para mim mais valiosas que o Teu amor na cruz por mim.
Deus, não permitais que me separe ainda mais de vós, pois quanto mais distante de Tua luz, mais fortes são os tentáculos das trevas ao meu redor se estendendo em direção aqueles que amo; A eles, acabo não fazendo o bem que quero, mas trazendo o mau que não quero. E, mesmo sabendo que são pecadores como eu, não quero eu ser eu causa de juízo e condenação, mas apoio na fragilidade para, caminhando nas estradas deste mundo rumo ao céu, possamos cruzar os agrestes escarpados do amor humano em busca da perfeita alegria e, sabendo usar os bens que passam, dentre os quais nosso próprio corpo, desejos e vontades, possamos abraçar os que não passam.
Deus eterno e onipotente, fonte de toda beleza e bondade, não permitais que me engane com as belezas deste mundo e de teus homens. Que eu reconheça neles uma fração de Ti, que aponta e me leva a Ti, mas que não me fixe neles, que não lance sobre eles as flechas inflamadas de luxúria que minha vontade decaída faz inebriar os ares dos odores putrefatos de uma humanidade decaída em si mesma.
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