terça-feira, 22 de julho de 2025

Depois da Euforia

Em dias que estou eufórico, eu não penso nas consequências. Quero um livro? Que tal comprar mais do mesmo autor, mas isso pode elevar um pouco o valor. Dois mil, três, quatro, cinco mil em livros? Parece okay. Suplementos alimentares, canecas, perfumes... Mas tudo isso é um problema meu. No fim eu vou ter que dar um jeito de pagar. 

O problema real é quando, nesses dias, eu falo demais. E aí, no dia seguinte, depois de uma noite consumida de desejo que se tornou cinza, eu me vejo em meio a um campo de batalha. Convoquei exércitos, lancei bombas, todos se viraram contra mim. E então ela retorna, a depressão, o fundo do abismo que não apenas te olha, mas ameaça te devorar. 

Com tudo isso vem de novo o medo da solidão, de ser deixado para trás enquanto os outros riem e sorriem. Mas, afinal, eu já não estou sozinho mesmo? O que muda? Claro, a minha aceitação a esse destino, amor fati, mas que, no entanto, é mais fácil falar do que fazer. 

Em momentos como esse, o silêncio, as parcas palavras, a distância, tudo diz para minha mente distorcida que é de novo uma nova condenação de memória, de silêncio, de solidão. Vou alimentando um monstro que quer me devorar. Prenunciando uma profecia autorrealizável. 

E então, numa monstruosa contraposição, o mundo de silêncio se enche de barulho, e eu, que até então tateava na escuridão por companhia, me vejo querendo fugir de tudo e todos. Quando tudo era silêncio, eu clamei por alguém e só podia ouvir minha voz num eco, e agora, quando não quero senão a solitude, as vozes não me deixam. Por mil infernos! 

Sempre querendo algo, seja a companhia no silêncio ou a calmaria em meio a uma imensa multidão. 

Em momentos assim eu nem sei quem sou. Eu ou a doença. Essa energia toda é finalmente um bom dia ou um episódio hipomaníaco que vai deixar rastros de destruição. Essa depressão, esse cansaço absurdo, tristeza profunda, é só um dia ruim como todos têm? Eu já não sei mais o que sou eu, o que é efeito da medicação, quem são os amigos, quem eu amo de verdade? O que é real? O que estou vendo sob o véu de um transtorno afetivo? O que estou imaginando como se fosse o efeito colateral bizarro de uma anestesia mal aplicada?

E sei também que isso cansa, não só a mim, mas os outros. Por isso os amigos logo se vão, por isso os convites se tornam escassos, por isso eu deveria ficar cada vez mais sozinho. Ninguém suporta tanta mudança, uma pessoa tão instável. Com uma demanda constante por afeto tão esmagadora. Num querer, num gostar, num amar que muitas vezes me tira até o fôlego. Amar é complicado. Sentir é complicado. Mas eu só sei sentir assim. Uma chatice, insuportável. E então as mensagens vão se tornando cada vez mais raras, a menos que alguém precisa de mim. E no fim é isso que resta: alguém que é útil, mas que ninguém quer ter por perto. Uma bomba de efeito retardado. 

É solidão, mesmo quando acompanhado.

"Não desejo nada mais que um sono reparador. 
Contudo, parece que já estou dormindo. 
E que vivo um estranho sonho." 

“Kumonosu-jō” (1957) 
Dir. Akira Kurosawa

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