Tragédia anunciada. Queria escrever e logo cedo percebi que não seria possível. Barulho, muito barulho. Não uma sensibilidade auditiva nem nada do tipo, mas crianças chorando, panela de pressão, pessoas gritando, entregas sendo feitas. Talvez seja essa uma reclamação "burguesa", do tipo Odete Roitman reclamando do Brasil, mas adorando uma carne nacional, se é que o leitor me entende. Eu também amo uma carne nacional, já que não me tem sido oferecida nenhuma carne asiática.
Acontece que cada um necessita de coisas distintas. Tenho um amigo que há anos sai quase todos os dias do trabalho e da faculdade para um barzinho, nem sempre para ficar bêbado, às vezes completamente fora de si, mas para encontrar amigos, conhecer pessoas novas, ouvir música e beber. E ele fica radiante com isso, cada vez que o vejo assim eu o sinto feliz. Não sinto que é uma fuga, até pode ser, mas um hábito, algo que o faz feliz, e fico feliz em vê-lo assim.
Mas eu amo o longe e a miragem. Outra amiga me disse que eu era como uma ideia, um conceito pairando no mundo das ideias, porque me sinto triste quando estou sozinho e quando estou acompanhado, e é verdade, infelizmente. Eu preciso de silêncio, espaços, vírgulas, reticências.
Preciso fechar os olhos durante uma sinfonia de Mahler ou um concerto de Rachmaninoff e então deixar fluir pelos dedos algo que vem do coração. Do contrário, me restam dias como hoje, exaurido pelo barulho, indo dormir ao meio-dia, incapaz de continuar.
E hoje eu queria tentar ir ao cinema sozinho, mas tomei tanto remédio que provavelmente só vou acordar amanhã.
Queria tentar fazer algo só.
Queria,
só uma vez,
não ficar a mercê do que querem os outros para mim e ignorar o que eu quero. Eu queria tentar ser só e ser feliz, ou ao menos satisfeito, já que, estando só sempre, acompanhado ou não, essa é a minha forma essencial.
"O seguro desemprego acaba, e lá estamos nós, como ratos: sem nenhum lugar para se esconder, ratos que precisam pagar o aluguel, com barrigas que sentem fome, caralhos que ficam duros, espíritos que se cansam, e sem educação, sem profissão. Uma merda difícil de aguentar, como dizem, essa é a América. Não queríamos muita coisa e não conseguíamos nada. Era tudo uma merda." (Charles Bukowski)
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