sexta-feira, 8 de agosto de 2025

Adágio para um Corpo Imóvel

Depois do intenso barulho eu prefiro ficar em silêncio, absoluto, até pelo menos o fim desse dia. Mais um. À noite tem alguns lançamentos, entre eles a série do Sarin, sempre me cativando pela doçura e maturidade, sem prescindir da leveza e beleza. Mas, de resto, preciso do silêncio. Da solidão que me foi imposta como um fardo e que hoje abraço como velha amiga. Tantas outras coisas eu queria dizer, mas se perderam em meio ao vozerio... Palavras que eu sei que não vão retornar. Estão perdidas, o que, acredito, seja um fim apropriado, afinal eu também estou, então é normal que minhas palavras também encontrem seu fim na perdição de um deserto ou de um mar violento que se estende infinitamente. 

As consequências serão devastadoras. Olho no espelho e vejo o quanto estou inchado, e isso me deixa apavorado. As pessoas me dizem para fazer academia, que absurdo! Alguém que nem consegue sair da cama para comer ou tomar banho, indo à academia? Todos esses remédios para dormir sem controle nenhum... Acho que nessa semana toda não fique mais do que dez horas acordados. O restante do tempo eu dormi. Completamente apagado, completamente inconsciente. 

E hoje foi mais uma vez. 

Fernegan, Ciclobenzaprina, Dramin, Diazepan, Zolpidem. 

Eu sei que estou me matando.

Mas eu sei que deverei pagar por isso. 

Ou já será esse o preço?

É mais uma sexta, e hoje nem sequer vi a cor do dia. Apenas a escuridão anuviada do meu sono e os brevíssimos momentos despertos. Caixas abertas de remédio estão espalhadas pelo quarto, bem como as roupas que troquei por conta da onda de ar polar que fez com a temperatura caísse. Tirando o frio, eu não faço ideia do que pode ter acontecido. 

Nem preciso dizer que esse sono é absolutamente solitário. 

Minha vontade era de pedir ajuda, e comento às vezes com algumas pessoas, mas elas não entendem. Não posso culpá-las, é claro, mas ainda assim é uma realidade dura. Queria não ter vontade de dormir o dia todo, queria sair, visitar parques, ir ao cinema ou a um café, mas, ao mesmo tempo, não quero nem mesmo olhar pela janela para ver como está o dia. 

E sinto a vida passar. Com um certo pesar mas também sem conseguir mudar nada.

Pedi tão pouco à vida
e esse mesmo pouco a vida me negou.
Uma réstia de parte do sol,
um campo,
um bocado de sossego com um bocado de pão,
não me pesar muito o conhecer que existo
e não exigir nada dos outros
nem exigirem eles nada de mim.

Isto mesmo me foi negado,
como quem nega a esmola não por falta de boa alma
mas para não ter que desabotoar o casaco.

(Fernando Pessoa)

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