não procuro convencer os demais."
(Edgar Allan Poe)
Para uma amizade inexistente e um amor morto-vivo
Alguém que trabalha num hospital postou as imagens daquela aparelhada que fica ligada a alguém que está em observação, e os gráficos indicavam queda e dos batimentos cardíacos. Na legenda, algo como "do lado de cá vemos o quanto a vida se vai rápido, então ame enquanto é tempo."
Discordo. Minha vida tem transcorrido numa velocidade irritantemente lenta. Não quero amar enquanto é tempo, pois no tempo em que amei, o que recebi em troca?
Entendo que isso já implica uma discrepância na compreensão mesmo do amor que, por definição, não pede nada em troca, mas dá sem medidas. Como dizia Santa Teresinha, "porque quem ama não sabe calcular."
Mas o amor me machucou, e muito. Portanto, não me seria penoso partir imediatamente. Algumas perdas, sim, me machucariam, mas essas não se enquadram ao amor que digo aqui. E ainda assim, acredito que eu partiria com gratidão. Se eles, no entanto, se fossem agora, ai, sim, me doeria.
Queria escrever sobre coisas menos melancólicas, na falta de palavra melhor. Mas se a lembrança dos últimos dias persiste em despertar em mim a fúria, não há o que fazer. Queria poder falar dos sabores que descoberto nos chás. Nos perfumes dos óleos essenciais, nos detalhes da decoração que em nada mudam a horrenda aparência da minha casa. Sobre como é bom poder estar só numa manhã nublada e fresca. Acredito que seriam temas ótimos.
Mas, bem, não será possível. Queria mandar mensagem para ele dizendo que não precisa se conter perto de mim, somos humanos, homens, pensamos provavelmente as mesmas coisas, embora em níveis diferentes, mas ainda partindo da mesma experiência. Mas isso também seria me humilhar demais. Se ele mostra esse lado a uma desconhecida. Mesmo que isso signifique aceitar de modo radical que nossa amizade não é real.
De súbito me veio um lampejo de energia, para que me arrumasse, levantasse, comesse algo e assistisse de modo a não depender do outro a minha felicidade. Talvez seja o único instante de lucidez das últimas semanas. Não sei de onde ela veio, ou melhor, sei que foi apenas outra oscilação de humor, não um indicativo de que estaria recuperando alguma força. Não sei se algum dia terei forças novamente.
Os últimos golpes que levei foram doloridos demais, não sei quanto tempo levará para cicatrizarem, e nem se vão um dia se tornar apenas uma mancha em meu corpo, uma cicatriz, e não uma ferida aberta e apodrecida como agora.
Eu realmente espero que a morte seja menos que isso.
- Quanto veneno é necessário beber para morrer?"
(Lothian Andrade)
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