sábado, 28 de dezembro de 2024

Mentiras

Era uma citação engraçada, que dizia algo como "dormir sobre um peitoral resolveria minha ansiedade, mas beleza, vamos seguindo no tarja preta mesmo, se é isso que você quer indústria farmacêutica." E, além de combinar com meu humor autodepreciativo, ela revela bem o que tenho passado. É que cada dia começa, e depois outro, e outro, e eu continuo olhando ao meu redor e não consigo pensar em nada para fazer além de dormir. 

Meus planos para as férias foram arruinados, mas eu não estou dizendo que queria voltar, mas eu também não queria ficar aqui somente. Mas eu não tenho, ou não consigo ver, outra opção. E então a cada dia quando me levanto, olho pela janela, mesmo que esteja um clima bonito como hoje, fresco e nublado, e sinto um tédio tão profundo, sinto um desprazer tão absurdamente grande no ser, na vida e em tudo mais, que só consigo pensar em dormir 

e dormir

e dormir

e desejar que não mais acorde.

Mas eu sei que sou covarde demais pra fazer isso acontecer. Então eu vou só esperando, 

e esperando

e esperando

até que chegue o fim. 

Poderia procurar um parque? Cinema? Pizza? Caminhar à beira do mar? Só de pensar nessas coisas penso no quanto estou só, que não teria companhia, que não tenho peitoral para deitar. 

E então volta-se contra mim minha maior fonte de conforto: as histórias que dizem que na vida encontramos amigos, e companheiros e heróis. Nas histórias há sorrisos bonitos e olhares irresistíveis, há pele e cabelo perfeitos, há pessoas que aceitam e declaram seus sentimentos. Nas histórias há amor, reconciliação, finais felizes, pessoas que lutam umas pelas outras. No mundo real as pessoas fogem de si mesmas e, incapazes de se aceitar, machucam os outros. Vivemos machucando uns aos outros. Não há sorrisos doces como Kongjiro nem olhares irresistíveis como Thomas. 

Talvez nas histórias seja assim, porque aqui, eu me levanto, olho pela janela o dia bonito, e me vejo na mais completa e absoluta solidão. Na vida real encontro apenas o nada.

Não há nada como o amor que mostram, nem mesmo com o amor de que fala a Igreja. Não há paciência, nem bondade, mas há inveja e orgulho. Há malícia e egoísmo, há ira e rancor. Há injustiça e mentira. Nada sofre, em nada crê, nada espera, nada suporta.

Era uma citação engraçada até, mas eu me lembro dela deitado no escuro, em estado de letargia e absoluto desânimo. 

Na vida essa tem sido minha única realidade. 

Minha única verdade. 

O Nada.

O sol já começa a despontar, em meio a névoa, indicando um dia quente que vem por aí. E nada mais.

"Matamos o tempo. O tempo nos enterra." (Machado de Assis)

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