segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Último dia

É o último dia do ano, e é impossível não pensar em tudo o que se passou, em todas as coisas que aconteceram. E verdade seja dita, apesar de terminar o ano com um absoluto pessimismo no peito, é inegável que coisas boas também aconteceram. 

Mas é que meu poeta interior não consegue olhar para o sol nascente ou para uma bela rosa iluminada pela manhã sem com isso recordar não algo bom, senão que usar essas imagens como fundo para o mais tristes dos cenários. 

Vejo que algumas pessoas ao meu redor são indiferentes a passagem do ano, como meus pais que nem ligam pra isso e sempre dormem cedo para não serem incomodados pelos fogos, mas outras estão sempre animadas, como se a perspectiva de mudança pudesse de fato mudar alguma coisa. Eu não consigo me animar como essas pessoas, longe disso, só consigo pensar na quantidade de Rivotril que eu preciso tomar pra não ouvir nenhum fogo estourando durante a noite. 

O ano se foi, e eu queria deixar a dor nele, mas infelizmente ela vai comigo. Começo o novo ano com novas cicatrizes, brilhando vergonhosamente no meu braço. Não consegui enterrar nenhum de meus fantasmas, e todos eles me assombrarão no ano que vem. 

Trago comigo a certeza de que sou um incômodo na vida daqueles que mais amo, e que meu amor não é nada comparado ao amor dos outros. Trago comigo a certeza de que, na vida do homem que amo, não sou senão um estranho, alguém que sequer deveria ter a coragem de dizer que o ama. Trago comigo a certeza de que ele encontrou na pessoa que eu mais odeio a sua realização. 

Esse ano me destruiu ainda mais, e cheguei a pensar que poderia ser o meu ano, o ano do amor, o ano em que as coisas dariam certo. Mas não, eu nem sequer desejo que o ano acabe, mas que tudo acabe. Que esse último dia de 2018 seja realmente o último!

domingo, 30 de dezembro de 2018

Quase Ano Novo

É quase Ano Novo, e eu estou aqui deitado, pensando no que vou fazer daqui pra frente, e chegando a conclusão de que não tenho ideia de como será meu futuro. É quase Ano Novo, e se for como no Natal eu temo por outra crise numa noite solitária, e se me arriscar assim pode ser que eu não saia de alguma dessas crises. 

É quase Ano Novo, e eu vejo que não fiz nada nesse ano, senão que me debrucei sobre mim mesmo e escrevi páginas e mais páginas sobre ele, sobre como me sentia com relação a ele, sobre meus sentimentos para com ele, sobre o que se passou com a gente e sobre como acabou. 

É quase Ano Novo e eu ainda não consigo escrever sobre outra coisa, como se somente ele habitasse minha mente. Ele roubou até a poesia que havia em mim. É quase Ano Novo, e eu não consegui me livrar dessa corrente ainda. É quase Ano Novo e eu já prevejo entrando no novo tempo preso a ele. É quase Ano Novo mas as prisões são velhas, e os pesos que trago comigo também. 

É quase Ano Novo mas eu só queria sentir a leveza de um novo amor. É quase Ano Novo e eu só queria poder olhar a janela e sentir a brisa amena sem que isso me traga lembranças dolorosas. Só queria poder dormir com um sorriso doce, sem as constantes lágrimas de pesar, sem as lembranças a apertar a garganta, sem a dor do abandono a me desconsolar. 

É quase Ano Novo e eu só queria ter certeza que não perdi a capacidade de amar. 

sábado, 29 de dezembro de 2018

Dor, torpor e agulhas

Minhas mãos tremem, e meus olhos custam a ficar abertos. A luz ainda que seja fraca, penetrando pelas frestas da cortina que não consegui tapar, machuca minha visão, e a escuridão se torna estranhamente acolhedora... O vento machuca as folhas das plantas no quintal, e os cantos da casa gritam em protesto. O barulho da chuva vem e vai, como ondas impetuosas de um mar, que as vezes se quebram violentamente contra a praia e às vezes chegam a ela de forma calma, quase como uma carícia de amor.

Meu braço arde, como se dele minha pele se desprendesse, como se a carne deixasse os meus ossos e aos poucos o brilho fosse deixando minha existência. Linhas finas brilham num escarlate como agulhas carmesim, o ardor me lembra que ainda estou vivo. Eu me machuquei mais uma vez, na esperança de assim esquecer a dor que fazia arder o meu peito. Engano meu! A dor se transformou num torpor, que me envolveu em seus tentáculos gelados como a frialdade da terra, e dele não pude escapar, senão que mostrei ao mundo uma face fria da qual eu não me orgulho. 

Quando finalmente pude me deitar, o sono não esperou sequer que fechasse os olhos, antes disso, me dominou como um leão feroz ao devorar a sua vítima, como ele devora minha força, como ele devora meu ser, deixando apenas os restos a serem devorados pelos vermes. E então adormeci, um sono profundo que, no entanto, não durou para sempre.

Droga! Quantas vezes adormeci na esperança de que não acordasse mais, quantas vezes adormeci na esperança de conseguir fugir do pesadelo que sou obrigado a viver todos os dias, quantas vezes adormeci na esperança de que ao acordar vesse uma mensagem me esperando, e dizendo que tudo o que vivemos não passou de um teste, uma mentira...

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Do desespero

Nada

Morte

Horror

Solidão

Frio

Abandono

Vazio

Fogo

Torpor

Cinzas

Nada

Eu menti, para mim primeiramente, quando disse estar enfrentando a morte de frente, encarando-a face a face, sem medo. Não poderia estar mais enganado. Eu estou com medo, aterrorizado, absolutamente e completamente paralisado pelo medo de ser deixado, abandonado, trocado, por aquele que mais amo.

É um medo tão grande e tão poderoso que todos os aspectos da minha vida foram por ele dominados. Meu corpo, minha mente, minha alma. Tudo se encontra em trapos graças a esse medo. O que, no entanto, não compreendo é que já deveria ter me acostumado, afinal já fui de fato trocado, deixado, abandonado. 

Eu apenas aguardo pelo veredito oficial, uma vez que a sentença já foi aplicada. Eu apenas aguardo pela palavra que declare a minha morte, uma vez que já estou morto de verdade. 

A imagem do exército é a mais viva em minha mente nestes dias. O exército alto, forte e poderoso que marcha impiedosamente sobre mim, e eu, fraco, pequeno e indefeso, sem conseguir levantar sequer a voz para me defender dos ataques cruéis e desumanos que sofro. 

Não sou um oponente digno, senão que sou uma criança brincando de soldado, mas que volta para casa chorando ao ralar os joelhos nas pedrinhas do chão. No entanto, dessa vez, não enfrento inimigos imaginários, mas um exército de verdade, um inimigo verdadeiro, um inimigo que não posso vencer. 

Seria então fraqueza de minha parte, ou pura covardia, poupar o esforço de ser morto pela lança do inimigo e transpassar eu mesmo o meu próprio coração com um punhal? Estaria eu sendo um covarde? Mas convenhamos, eu sou um grande covarde!

Em mim restou a respiração arrastada, de quem se esforçou além do limite, de quem não aguenta mais correr. Minhas mãos tremem e meus olhos estão vidrados e cheios de lágrimas, numa estranha combinação de ausência e desespero. Talvez tenha me fechado em meu próprio enquanto ele é destruído pelas chamas, consumido pelas cinzas, reduzido a nada, o mesmo nada ao qual eu serei lançado. 

As trombetas do apocalipse ressoam pela minha mente até os cantos mais obscuros da minha alma. A tuba gloriosa vai convocando os mortos que habitam em mim para se apresentarem perante o trono do Rei, implorando clemência, implorando para que não sejam jogadas no fogo ácido, e nem no limbo do nada, onde nada acontece pela eternidade. 

Nada

Morte

Horror

Solidão

Frio

Abandono

Vazio

Fogo

Torpor

Cinzas

Nada

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Depois da guerra

Não imaginava que dentro de mim houvesse tamanha altivez, com efeito, para alguém que está prestes a ser morto e abandonado aos vermes por quem mais amo, estou de cabeça erguida e com um impassível sobre a face. Na verdade, acho que já me acostumei com a ideia de ter o peito transpassado por uma lança empunhada pelo meu amado. Já me acostumei com o fato de que ele escolheu a ela e não a mim para seguir os seus dias. Aceitei que não há nada que meu amor possa fazer, e que não há nada mais a lutar, senão que minha batalha já foi perdida, e eu me encontro derrotado, mas não caído ao chão, de pé e ensanguentado, mas olhando de cabeça erguida a vitória de meu inimigo mais cruel.

Minhas mãos estão machucadas, e o aço frio da espada arde nas feridas abertas por empunhar com força a arma que usei para tentar tirá-lo das garras do dragão. No meu peito, a lâmina da lança quebrada atravessa meu coração e uma brisa fria faz o cheiro do meu sangue inebriar o ar. Meus olhos não choram, minhas lágrimas secaram, e a única coisa que escorre pelo meu rosto é o líquido vermelho e quente de minha vida que aos poucos se esvai, fluindo como uma fonte, pingando lentamente na terra. 

Das gotas de meu sangue no chão uma rosa nascerá. Quando eu já não mais estiver pisando ali, quando eu já tiver sido devorado pelos monstros das ruínas. Essa rosa se erguerá solitária em direção ao sol, e em uma de suas pétalas haverá uma gota de sangue, uma única gota, que como numa poesia declarará que meu amor para sempre habitará este solo por onde andei, onde lutei, onde fracassei. 

terça-feira, 25 de dezembro de 2018

Espírito de Natal - Pt. 2

O efeito do benzodiazepínico veio lentamente, como uma névoa, sobre mim na noite de ontem, e me envolvendo num abraço acolhedor e letárgico me fez relaxar. Acordei menos tenso e felizmente, para meus amigos e família, intacto. 

Não é segredo que pensei coisas terríveis durante essa que, embora repleta de luzes coloridas, foi uma noite de profunda escuridão. Não é segredo que queria que essa foi a última noite de triste Natal, não é segredo que pensei muito em fazer com que ela fosse a minha última noite de Natal. Fui salvo por 6mg de bromazepan e pelo temor de magoar aqueles que amo, mas também fui salvo pela minha covardia. 

Muito embora esteja razoavelmente melhor quando comparado com o estado absolutamente lamentável de ontem a noite, eu ainda sinto um gosto ruim na boca, algo metálico, como sangue, como um prenúncio. As palavras dele ecoam pelo meu corpo e me fazem arrepiar, a lembrança de seu toque, seu abraço, me enchem os olhos de lágrimas. Aquele abraço me destrói, pois me faz desejar ficar ali para sempre. No último abraço eu o segurei, com força, porque queria que durasse para sempre, mas tivemos que nos separar, e ele teve que ir embora. Não. Isto está errado, ele não teve de ir embora. Ele quis ir embora. E eu andei na direção oposta, sem força, sem ânimo, como tem sido os últimos dias de minha vida. 

Me deitei no sofá, na penumbra da sala iluminada apenas pelas luzes da rua que insistiam em entrar pelas frestas das janelas e cortinas apesar de meus esforços em cobri-las. Os primeiros compassos da Sinfonia N° 6 do Tchaikovsky "Patética" logo me fizeram mergulhar num mundo só meu, muito embora a voz preocupada de minha mãe constantemente tentasse me arrastas de lá. Deus sabe o que poderia ter acontecido se ela não o tivesse feito. Fiquei pensando no quanto aquela música diz sobre mim. Quando, finalmente, morrer, estará nela a minha carta de despedida, ela contém a verdade de minha vida, e cada um de seus movimentos é como uma declaração precisa da minha existência. Nada que eu escreva me descrevera melhor do que a música do mestre russo...

O espírito de Natal que me possuiu foi o da melancolia, que me fez deitar e chorar por um alguém que longe daqui sorria, provavelmente de contentamento por saber o quanto sofro por ele. 

E como na sinfonia, meus compassos vão aos poucos diminuindo, depois de explosões de fúria, depois de sonhos inebriantes, depois de valsas repletas de nostalgia. Diminuindo num lamento solitário, abandonado, até chegar ao seu inaudível fim... 

segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Espírito de Natal

O espírito de Dezembro que me perdoe, mas minha noite de Natal será regada pelas lágrimas que escorrem de meu coração. 

Lágrimas vermelhas, lágrimas de solidão. 

Quando nos vemos, nos abraçamos, e o seu abraço tem mais poder sobre mim do que mil bombas atômicas. Quando então damos as costas e nos despedimos, fingimos que não existimos, é como se fôssemos dois completos estranhos. 

Nessa noite de Natal o meu espírito se quebrou, e eu pressinto a morte lenta se aproximando ladeada pelo fantasma do abandono que foi quem preparou a minha alcova. Não me mate lentamente, dê apenas um golpe, não seja cruel. Mas parece que você gosta de me torturar, e mesmo dizendo que não vai me deixar, sabe que se escolher ela, é isso que estará fazendo, pois não pode ter a ela e a minha amizade ao mesmo tempo, e eu não significo nada para você a ponto de que com isso você queira me escolher. 

Meu Natal será na solidão da noite escura de meu quarto. Com meus gemidos sendo abafados pelo som de seu sorriso, que passará esta noite ao lado de quem ama, e não serei eu. 

Meu Natal será chorar sobre as feridas que você deixou abertas em meu coração, onde você grosseiramente salgou com seu abraço. 

Meu Natal será fazer sair pelos meus pulsos o sangue do coração que bateu por você. 

Meu Natal será chorar a tristeza que é saber que não me ama, e que pra você deveria ser apenas mais um estranho no meio da multidão. 

Meu Natal será chorar o amor que sente pelas mulheres, e que eu nunca poderei tocar...

O espírito de Dezembro que me perdoe, mas minha noite de Natal será regada pelas lágrimas que escorrem de meu coração. Lágrimas que escorrem lentamente pela minha pele, fazendo arder os cortes que tracei para expurgar minha dor, fazendo com que me lembre que essas lágrimas são as lágrimas de um homem que vive contra sua vontade, amando sem ser amado pelo amado, derramando lágrimas de sangue pela sala.

Lágrimas vermelhas, lágrimas de solidão. 

Do fim e de sorrisos

Já há alguns dias que eu olho no espelho, e vejo que preciso mudar algo. Fazer a barba, que há semanas não aparo, cortar o cabelo que já começou a perder a forma, ou simplesmente colocar um sorriso que seja. Isso já faria muita diferença. Mas não consigo.

Não tenho disposição pra isso, mesmo sabendo que seria bom pra mim, mas não, só quero continuar aqui, existindo, sem precisar comer ou dormir, sem precisar fazer nada de útil, sem fazer nada, apenas existindo esperando pelo dia que seja convidado a deixar da fazê-lo. Essa tem sido minha rotina. 

Eu olho no espelho e não reconheço o homem que aparece lá. Ele me parece triste, o rosto macilento e a pele oleosa mostram o descuido com o corpo, reflexo de um interior que já se cansou, de tudo. 

E é isto, tenho até sorrido, quando estou com meus amigos, o que tem sido meus únicos momentos de alegria, mas depois disso, sou tomado pelo mais absoluto vazio, e pintado pela escuridão mais profunda, e uma voz que sussurra que meu fim está próximo... Mas se ainda estou aqui, tirando forças sabe-se lá de onde, é porque eles estão comigo, e porque sei que mesmo depois de um dia cheio e cansativo, eles ainda estarão lá, comigo, abafando os sussurros da morte com o seu sorriso, e me fazendo sorrir, e me dizendo que não, meu fim não está próximo, minha alegria sim!

sábado, 22 de dezembro de 2018

Alegria de Natal

São quase três da manhã, e as gotas esparsas da chuva escorrendo pelo telhado fazem um barulho engraçado na janela do meu quarto. Estou quentinho aqui dentro, mas o meu cabelo brilha com a umidade que me atacou quando fui abrir o portão agora a pouco. São quase três da manhã e eu acabo de fechar a porta depois de meus amigos terem ido embora, mas ele deixaram uma coisa comigo: seus corações.

Há muito, muito, não sentia esse calor no meu peito. Há muito não sentia essa sensação, de que há uma razão para estar aqui. 

Fizemos uma Cantata de Natal num comércio aqui da cidade, o que foi muito divertido, e pouco depois viemos aqui pra casa, como é de costume. Cantamos, brincamos, sorrimos, conversamos, e foi isso, apenas isso, capaz de acender de novo a fagulha que dentro de mim havia se apagado. E mesmo com a chuva forte chapinhando na janela e o vento uivando com o poder de um temporal de primavera o calor aqui dentro ainda me faz feliz. Eu sorrio aqui, sozinho no escuro do meu quarto iluminado pela tela do notebook, que também preenche o ar com o som doce e alegre de Kana Nishino. Alegria simples, alegria de Natal. 

Mesmo tendo motivos pra isso, não senti vontade de chorar, e sequer lembrei dele nessa noite, coisa que até pouquíssimo tempo me era impossível. Mas não, não foi preciso eu sonhar com ele me fazendo feliz porque eu já estava ali, feliz! E isso me basta!

O choro e o abismo

Você é frio como as paredes de um abismo, onde reverberam os sons dos gemidos de meu choro mais sincero e sentido. Você é assustador como a escuridão desse mesmo abismo, que em seu silêncio sepulcral e ameaçador que apenas a morte pode ser achada neste oceano de escuridão que é seu coração. A luz não chega lá, o amor não consegue te tocar e, no fim, restará somente o chão brutalmente duro de sua expressão de absoluto desprezo por mim.

Que lutei, que tentei te fazer feliz, que a você me dediquei mais do que deveria, mais do que seria absolutamente correto fazer. E ainda assim não foi suficiente. Eu não mereci sequer um pedido de desculpas, eu não mereci um olhar compadecido, não fui digno sequer daquele olhar de compaixão que você daria a um cão ferido prestes a morrer. Para você, sou menos do que aquele cão.

Para nunca mais

Eu olho para ele indo embora agora, e não me levanto para correr atrás e impedir que se vá, antes disso, eu apenas observo, sem reação. Não vou chorar, não vou chamar por seu nome, não vou gritar. Eu não vou me mover daqui a menos que seja para percorrer meu próprio caminho.

Que vá embora, que vá com os diabos para o inferno! A distância que tanto amaldiçoei é agora a que me consola, estando longe não pode me fazer nenhum mal. Estando longe eu posso ver o que antes não podia por estar cego, por estar preso.

Você já tomou meu coração para si, o quebrou, reduziu meus sonhos a pó e os lançou aos quatro ventos. Você me despedaçou em tantos pequenos pedaços que não sou mais do que um pedaço de homem agora. E você sorriu. Sorriu da minha dor, sorriu do meu sangue derramado, sorriu do meu ser desnudado diante de ti. Você me incendiou, me transformou em cinzas, me soprou para longe, e depois se virou como nada ali existisse.

Portanto que se vá, que se vá sem se despedir, que se vá sem pestanejar, eu só peço que deixe o que restou de mim aqui, para que de alguma forma eu possa me reconstruir. Abandone-me, e me deixe só, como tantas vezes o fez, mas agora não volte para me humilhar mais uma vez. Que vá como se eu não existisse porque sei que para você eu nunca existi de verdade. Vá para nunca mais voltar!

quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Desprazer

Pois bem, por onde devo começar? Alguns dias sem escrever me dão a impressão de que perdi uma habilidade há muito adquirida com custos, como um hábito que demorou anos para se formar, mas que se perdeu com uma reviravolta que me fez esquecer o que fazia constantemente e apaixonadamente.

Não é o caso, de qualquer forma, já que não tenho feito uso da escrita por motivos que transcendem até mesmo minha própria capacidade de expressá-los por meio da mesma. O fato é que tenho sido acometido por uma grave enfermidade: a falta de vontade, ou como prefiro chamar: preguiça existencial.

Sabe quando o simples trabalho de respirar ou fechar os olhos para dormir torna-se um fardo pesado demais para carregar? Minha mente tem lidado com o peso que é simplesmente existir, ainda que seja vegetando por sobre uma cama sem fazer nada de útil ao meu país.

Me mudei recentemente, para um bairro que fica no lado oposto da cidade, e mesmo sabendo que deveria me ocupar em organizar as coisas que por si já estão caóticas, eu simplesmente venho procrastinando. Eu vejo as coisas bagunçadas e jogadas de qualquer jeito, e não consigo reunir o mínimo de força para fazer nada. Poderia dizer que me sinto assim por conta do cansaço físico e da fadiga que o esforço da mudança exige, mas não tenho feito nada para me cansar de fato. Até mesmo os compromissos da Igreja eu tenho cumprido apenas pela formalidade social de não abandonar algo que comecei, mas o faço no modo automático. Não tenho encontrado prazer sequer nas coisas que antes me faziam sorrir: gastei horrores em maquiagens que há dias não uso nem em ocasiões que normalmente o faria, não tenho me empolgado com as músicas novas que me aparecem, e nem com as pessoas ao meu redor. Com efeito, a exceção de meus amigos mais próximos da banda, não tenho nenhum contato com as outras pessoas além do estritamente necessário...

Acho que estou passando por uma fase difícil. Parece muito um período de interiorização, e bem que poderia sê-lo, mas o fato é que quando fecho os olhos, não me vem nada a mente, senão que figo vagando por lugares distantes, aleatórios até adormecer e acordar novamente com o mesmo sentimento de vazio com que fui dormir.

Daí chamar essa enfermidade de preguiça existencial. Experimento uma sensação insípida de não desejar nada. De não saber o que querer, de deixar as coisas fluírem da forma que quiserem, sem que tenha de controlá-las para seguirem o caminho que espero, porque não espero nada.

Não tenho sentido mais a necessidade sequer de prender algumas pessoas em minha vida, senão que tenho percebido que seria bem melhor se de fato se afastassem de mim. Querem ir? Que partam logo! Querem ficar juntos? Que fiquem, e que sejam felizes no inferno bem longe de mim!

Mas eu sei que não deveria ser assim, sei que não deveria ter se apagado em mim a chama, o gosto, pela vida. Mas olhando com cuidado dentro de meu peito eu não vejo mais uma centelha de vida, senão que vejo um abismo, onde minha voz já não reverbera mais pelos paredões de rocha fria, pois já não grito e nem choro, apenas fico ali, contemplando o abismo, enquanto ele também olha para mim.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Sabotagem

Meu corpo tenta aos poucos se recuperar da última crise. Há dias que não consigo me concentrar em nada, e há dias que meu sono tem sido minha única companhia. Odeio dias assim, pois me sinto fora de órbita e as pessoas falam comigo exigindo o mínimo de atenção, e tudo que eu consigo é contemplar a imensidão de um abismo que há dentro de meu próprio peito. 

Por indicação de uma amiga eu fui fazer uma entrevista de emprego num colégio no município vizinho, e fui chamado para dar uma aula experimental no dia seguinte, sob a supervisão da coordenação pedagógica.

Como alguém que gosta de falar em público, e que tem uma razoável capacidade de expressão, eu não me senti pressionado com isso, mas o fato de estar sob olhares de julgamento me deixou completa e absolutamente aterrorizado. 

Um verdadeiro vendaval surgiu dentro de mim, e a ansiedade atingiu níveis alarmantes. Como resultado eu fiquei praticamente de cama, incapaz de ter qualquer contato com o mundo exterior.

Preparei as aulas, com uma crescente insegurança, e passei a questionar a minha capacidade mesma de dar aula. Por outro lado me recordava dos anos de faculdades, dos muitos livros e cursos que fiz para me capacitar cada vez mais, mas ainda assim passei a crer que seria insuficiente.

Passei a ter a certeza de que não conseguiria. Passei a crer na minha completa incapacidade de fazer aquilo que passei 5 anos me preparando para fazer. Mesmo sabendo da incapacidade de grande parte das pessoas em julgar o que digo e penso, mesmo sabendo ser superior eu temia o julgamento daqueles que eu sabia que não iriam me compreender.

Na noite antes do dia marcado eu saí com uma amiga, e por alguns momentos consegui me distrair, enquanto apreciava as musicas de uma apresentação da banda sinfônica da Escola de Música de Brasília. Mas a ansiedade não tinha passado, apenas estava se preparando pra me dar o bote. 

Tentei conversar, mas procurei a pessoa errada. Ele não me entendeu, ele não me ouviu, ele novamente me ignorou e isso é claro que me abalou. Se já estava vulnerável depois de falar com ele a ansiedade encontrou espaço dentro de mim.

Ela cresceu e me dominou novamente. As dores se espalharam pelos braços e pernas. Meu estômago fechou. Só consegui dormir porque o cansaço físico dessa mesma crise foi tão grande que eu certamente teria apagado em qualquer lugar. 

No outro dia acordei, mas exausto é pouco pra descrever o que sentia. Algo me apertava o peito e a garganta. Meu estômago revirava. Não podia fechar os olhos pois mergulhava num abismo de escuridão e terror. Não conseguia parar de tremer, não conseguia comer. 

Chegando lá eu tive de esperar. E esperar. E pra um ansioso isso é a pior coisa que pode acontecer. 

Mas tudo isso era uma sabotagem. E das grandes. Eu mesmo me sabotei... 

Claro que quando eu realmente precisei enfrentar a aula, tudo transcorreu na mais tranquila ordem, afinal não é minha primeira vez dando aula. Depois, quando cheguei em casa, o peso foi tirado de cima de minhas costas, e eu capotei, dormi o dia inteiro, numa evidente necessidade que meu corpo tinha de descansar...

Acho que essa é minha pior e mais destrutível mania: me destruir mesmo quando as coisas são apenas como são. Eu me saboto, a minha cabeça é a minha prisão, eu sou meu maior inimigo. Eu vejo, tantos aspectos de minha vida que poderiam ser melhores se eu não tivesse esse péssimo costume de me sabotar. 

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

O início da inexistência

Eu tentei, eu tentei mesmo, com todas as minhas forças, com tudo que tinha em mim. Cada fibra do meu corpo, cada parte do meu ser, tudo lutou, e eu vejo hoje que não fui um covarde. Eu não fugi, eu fiquei e enfrentei mesmo quando o inimigo se colocava em cima de mim e me machucava profundamente, mesmo quando o sangue caía em meus olhos e me tapava a visão, eu continuava tentando me levantar, tateando às cegas, indo contra os protestos de cada músculo que gritava para que não mais me levantasse, para que ficasse ali deitado, esperando a morte... 

Estou agora prostrado novamente, com estranho riso no rosto, de quem não se rendeu mas que sabe que logo o inimigo se aproxima para dar o derradeiro golpe. Engasgo com o sangue de minha garganta cortada, e meu pulmão em chamas clama pela gula da terra, que logo me destrua. Não sinto minhas mãos, e meus pés estão em carne viva. Não tenho mais forma humana, senão que sou uma garatuja, um não sei quê que ainda por pouco respira, um coração que bate em meio a carne que já começa a apodrecer. Sinto fome, mas meu corpo não aceita mais alimento, meu corpo já se decidiu pela morte.

O que sinto já não é mais dor, mas é o início da inexistência. O que sinto é o meu corpo se desfazendo em meio ao veneno do ar que respiro. Veneno este que foi preparado pelas rosas que me atraíram com sua beleza, para então me corroerem até os ossos para então ser devorado pelos vermes que habitam suas raízes. 

domingo, 9 de dezembro de 2018

Ganhos

Sabe, eu podia me sentar aqui e escrever de novo sobre ele, sobre o quanto o amo, sobre tudo que sinto quando penso ou o vejo, sobre o quanto fico triste ao saber que fui trocado ontem de novo por ela. Podia dizer o quanto meu coração se entristeceu ao vê-los juntos. O quanto quis gritar, bater, chorar... Mas pra quê? 

O que eu ganho me derramando mais uma vez, chorando mais uma vez, sangrando mais uma vez em nome de um amor que só existe na minha cabeça? O que eu ganho colocando um sorriso falso no rosto para os meus amigos, enquanto minha mente vaga triste e distante, tão distante quanto ele?

Mas isso não é uma declaração de superação, não, antes é apenas um peso que não aguento mais carregar, mas do qual eu não consigo me livrar senão que serei levado ao fim por ele, esmagado por uma corrente de amor e ódio que não pode ser quebrada.

É uma luta que não posso lutar, uma batalha que não posso ganhar. 

Inferno Particular

Outro dia, outra sabotagem.

Sentado no escuro, absolutamente dominado pela carência, depois de uma noite de Lexotan e tequila, pensando nele e sabendo que ele não pensa em mim. Sim, sei bem que o que tenho dito não varia muito. Sei que não sou dos escritores mais habilidosos, afinal as minhas palavras giram em torno de um tema bem específico: meus relacionamentos fracassados, frutos da minha capacidade sempre impressionante de me apaixonar por quem nunca conseguirá corresponder o que sinto. 

De qualquer forma eu já me acostumei com essa realidade, e se a boca fala daquilo que o coração está cheio, de que outra coisa poderia falar, senão que de minhas mágoas? 

Como costumo dizer: hoje é um dia daqueles! E meu corpo já começa a protestar, desejando um outro alguém. A ansiedade que ontem me atingiu forte na cabeça hoje deu espaço para a carência me abraçar, e os tentáculos gelados dela já começar a rodear a minha mente e meu coração. 

Choro por qualquer coisa. 

A chuva me faz lembrar dele. 

As flores me fazem lembrar dele. 

O céu escuro me faz lembrar dele.

As estrelas me fazem lembrar dele.

Minha cama vazia me faz lembrar dele. 

Meus braços soltos me fazem lembrar dele. 

Tudo me faz lembrar dele. 

E eu sei que ele nem sequer se lembra de mim.

Novamente um sorriso irônico surge em meu rosto. Acho que é um costume estranho o que adquiri, o de rir de minha própria desgraça. O de rir mesmo em meio as lágrimas que me surgem ao pensar que ele pode deitar-se com outra nessa noite, entregando seu corpo a um alguém qualquer, enquanto sozinho eu penso nele, em como gostaria de tê-lo ao meu lado. E então eu fecho os olhos, e aos poucos aqueles sentimentos vem me dominando aos poucos.

O medo. 

A solidão.

A angústia crescente.

O desejo pela morte.

As cicatrizes de meu braço ardem, clamam para serem reabertas, para que possa sair por ali a dor que em meu peito transborda. Os pensamentos que há muito venho combatendo ganham força. Deveria continuar existindo? Deveria continuar insistindo nessa vida patética, sofrendo por quem sequer pensa em mim senão como algo menos importante do que um inseto? 

Como nos compassos de uma marcha fúnebre eu sinto o meu fim se aproximando. E a cada dia eu me convenço mais de que serei eu mesmo o meu carrasco. 

A risada do demônio desconstróis os temas da minha alegria pregressa. E tudo retorna ao nada. E tudo vai desmoronando, e eu mais uma vez mergulho no meu inferno particular, dentro dos recessos da minha própria mente. 

sábado, 8 de dezembro de 2018

Tudo isso

O meu corpo está cansado, das atividades, dos compromissos, dos problemas, das noites sem dormir direito. A minha mente está contente, pelos meus amigos, pelas risadas, pelas brincadeiras. O meu coração está triste, pelo abandono, pelo silêncio, pela razão. 

Como pode alguém viver em realidades tão distintas? Como posso viver com essa confusão dentro de mim? 

Eu olho ao meu redor, e vejo o quanto algumas pessoas me tem em mais alta conta, e ao mesmo tempo percebo que para outros, ocupo o mais desprezível dos lugares. E adivinha qual deles permito que me afete? 

É com um sorriso irônico no rosto que escrevo, e que penso ao fechar os olhos, que quanto mais desejo que pensem em mim, quanto mais desejo que me amem, quanto mais espero que me desejem, mais desprezível me torno aos seus olhos. E o mais que faço não vale nada, porque a minha existência não vale nada. 

Observo meu passado e vejo o quão desprezível tem sido minha caminhada por esta terra, e não fosse o sorriso dos meus amigos mais chegados já teria colocado eu mesmo um fim a esta existência patética.

Minhas vitórias são risíveis, minhas batalhas pífias, minhas lágrimas injustificáveis, minhas poesias são areia ao vento, se desfazendo no ar sem deixar uma marca. As únicas marcas que ficaram foram aquelas deixadas pelos outros, e não deixei nada em seus corações. Não há nada de bom em mim que possa servir ao outro, e prova disso é o absoluto desprezo que recebo daquele que amo. 

Mas e então, se minha continuidade é apenas para não deixar os outros tristes, mesmo estando triste sabendo que quem amo não me ama. Será que é só isso? É pra isso que eu vim ao mundo? 

E todo esse amor que há dentro de mim? Pra que serve essa porcaria? O que devo fazer com algo que tenho de monte mas que ninguém quer? De que adianta tudo isso? 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Marcas

Algumas coisas deixam cicatrizes em nós. Algumas pessoas deixam cicatrizes em nós. Marcas tão profundas que chegam a queimar a carne e os ossos. Marcas que talvez nunca nos deixarão.

Eu olho para algumas marcas do meu corpo. Algumas eu fiz para marcar um tempo de vitória, como as tatuagem, e outras para marcar uma dor. Algumas eu só posso ver ao olhar para dentro de meu próprio coração, e outras eu vejo no meu corpo um retrato do que se passou na minha alma. 

Eu vejo que algumas marcas já sangraram muito, mas que hoje são apenas uma leve mancha na pele, ou no coração. Servem pra me lembrar das coisas que se passaram, mas não doem mais. Outras marcas ainda sangram, e sinto dor só de lembrar o quanto doem. 

Eu vejo as marcas que quase desapareceram, e que hoje são uma lembrança distante, e vejo que outras nunca sumirão. Vejo que algumas dores eu carregarei pra sempre comigo, e vejo que algumas feridas nunca vão se fechar.  

Estamos no último mês do ano, e eu consigo ver um pouco as marcas que os últimos meses deixaram em mim. Algumas eu sinto que já começaram a se fechar, mas outras, ainda sinto como se tivessem sido abertas nesse exato momento. As dores desse ano me marcaram, e essas marcas eu levarei comigo pra sempre. Algumas pessoas me queimaram e abriram feridas com lanças e punhais, e eu sei que essas cicatrizes ficarão pra sempre aqui

Mas outras eu sei que é possível colocar um curativo. Algumas coisas eu sei que é possível remediar e as vezes até operar. Algumas vitórias eu sei que posso buscar. 

Algumas coisas deixam marcas em nós. Algumas pessoas deixam marcas em nós. Marcas que talvez nunca deixarão de existir. 

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Tumbling down

Acredito que possa dizer que eu sou a prova viva, ma non troppo, do quanto uma pessoa pode ser prejudicial a outra, mesmo sem querer. Estou nesse momento deitado, depois de dormir quase 12 horas seguidas, ainda cansado do fim de semana que, excluindo minha batalha pessoal foi corrido como tantos outros. 

O que me deixa cansado não é a correria que todo fim de semana sou obrigado a suportar, não, a essa já estou acostumado. O que me cansa é o estresse que a presença dele me causa, o que me cansa é o fluxo ininterrupto de sentimentos poderosos que tenho quando estou perto dele, ou quando sei que terei de vê-lo. 

Deitei ontem a tarde, e em poucos instantes meu corpo se entregou ao cansaço que já vinha se anunciando por tantos sinais. A voz gasta, os olhos fundos, os reflexos atrasados. Tudo indicava que a fadiga já estava cobrando de mim uma certa taxa de vida. E mesmo deitando não consegui descansar completamente. Senti como se uma grande bola de ferro fosse retirada das minhas costas. Quando me deitei, era como se tivesse me tornado uma massa, disforme, sem membros ou ossos. Apenas estava ali, a espera de sabe-se lá o quê. A impressão que tinha era de que havia perdido os contornos da minha existência, e assim estava me transformando em outra coisa.

Até mesmo agora, sinto meu corpo pesado, e dores por todo lado. A ansiedade é uma vilã cruel, que sem nenhuma misericórdia faz com que eu sinta que estou deixando de existir. Ela faz com que eu não reconheça o que vejo no espelho, ela faz com que eu já não saiba mais quem sou, perdido em meio a dor. 

Isso me coloca num estado obsoleto, de uma inutilidade generalizada, onde sou completamente incapaz de fazer qualquer coisa. Não consigo comer, nem estudar e nem sequer conversar direito. Que poder é esse, que me reduz ao pó, que me faz pensar que sou um nada? O que é isso que ele faz comigo, que me destrói com mais força do que tentam meus próprios inimigos? 

Não consigo dar forma a esse texto, não consigo sequer reconhecer minha própria forma. Não consigo fazer mais do que continuar existindo. E então retorno ao início, onde disse ser eu a prova viva do quanto alguém pode ser prejudicial a outra. Quando me perguntam como estou, respondo sinceramente que estou vivo, e isso é o máximo que posso dizer de mim mesmo. 

Continuo existindo, e nada mais. 

E tudo retorna ao nada, e tudo vai desmoronando, desmoronando, desmoronando...