quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Depois da guerra

Não imaginava que dentro de mim houvesse tamanha altivez, com efeito, para alguém que está prestes a ser morto e abandonado aos vermes por quem mais amo, estou de cabeça erguida e com um impassível sobre a face. Na verdade, acho que já me acostumei com a ideia de ter o peito transpassado por uma lança empunhada pelo meu amado. Já me acostumei com o fato de que ele escolheu a ela e não a mim para seguir os seus dias. Aceitei que não há nada que meu amor possa fazer, e que não há nada mais a lutar, senão que minha batalha já foi perdida, e eu me encontro derrotado, mas não caído ao chão, de pé e ensanguentado, mas olhando de cabeça erguida a vitória de meu inimigo mais cruel.

Minhas mãos estão machucadas, e o aço frio da espada arde nas feridas abertas por empunhar com força a arma que usei para tentar tirá-lo das garras do dragão. No meu peito, a lâmina da lança quebrada atravessa meu coração e uma brisa fria faz o cheiro do meu sangue inebriar o ar. Meus olhos não choram, minhas lágrimas secaram, e a única coisa que escorre pelo meu rosto é o líquido vermelho e quente de minha vida que aos poucos se esvai, fluindo como uma fonte, pingando lentamente na terra. 

Das gotas de meu sangue no chão uma rosa nascerá. Quando eu já não mais estiver pisando ali, quando eu já tiver sido devorado pelos monstros das ruínas. Essa rosa se erguerá solitária em direção ao sol, e em uma de suas pétalas haverá uma gota de sangue, uma única gota, que como numa poesia declarará que meu amor para sempre habitará este solo por onde andei, onde lutei, onde fracassei. 

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