terça-feira, 31 de outubro de 2017

Sobre o sofrimento humano

E agora eu fraco que farei, 
que patrono invocarei, 
se a mim mesmo eu matei? 

Sofrimento, ta aí uma realidade humana da qual não podemos fugir, por mais que tentemos, choremos ou imploremos o sofrimento ainda existirá. O sofrimento dobra o homem, sua vontade e seu corpo, a uma vontade superior, ainda que essa vontade seja o acaso.

Por isso diz-se que o sofrimento pode ser de dois tipos: Há o sofrimento natural e o sofrimento humano. O natural é o sofrimento que advém das circunstâncias da vida, está alheio a nossa vontade e acima de qualquer força humana e o sofrimento humano, causado por nós ou por outros, dependendo exclusivamente de nossa vontade ou capacidade de fazer a nós mesmos ou ao outro sofrer.

Do sofrimento natural não há muito o que ser dito, apenas que contra ele não há como lutar. Não se luta contra um tsunami ou um terremoto, mas se sobrevive a ele, às vezes. Das doenças também não há escapatória, pois ainda que a medicina evolua a cada dia sempre haverá esse ou aquele malefício capaz de dobrar o homem ao manto da dor e da morte. Do sofrimento natural não á escapatória senão na torpe batalha onde o homem tenta sobreviver.

O sofrimento humano é então o ápice da miséria humana, pois não bastando os sofrimentos naturais, dos quais não se pode fugir ou se esconder, o homem buscou ainda refinar a arte de causar dor a si e aos outros. O homem tende naturalmente ao sofrimento, a sofrer e a fazer sofrer, e não há de encontrar paz e sossego nessa terra antes de causar a todos a dor e o desespero que no fundo de sua alma ele sentiu. 

Muito diversas podem ser as formas empregadas pelo homem para fazer o outro ou a si sofrer, mas das muitas que conheço e que já tive o desprazer de experimentar a que mais me aterrorizou foi a do sofrimento auto-infligido, aquele que sem ajuda externa o homem causa a si mesmo.

É como se, andando de olhos vendados, o homem pisasse em espinhos por vontade própria, sabendo que à direita ou à esquerda da estreita faixa de espinho há uma estrada segura. É um sofrimento profundissimamente imbecil, pois a vida já reserva a cada um de nós uma vasta gama de dores e dissabores, mas nós, do alto de nossa soberba, acabamos por tomar o punhal sagrado da mão do destino, com que ele haveria de nos ferir e nos ferimos nós mesmos. 

Oh, quanta tolice há num gênero que causa dor a si mesmo pelo puro e simples prazer de ver-se curvado sobre a dor e o desespero. Ainda que fosse outro homem a causar-nos a dor, mas não, somos nós mesmos. 

E assim, com o punhal do destino cravado em nosso ventre, tentamos nos erguer, caminhar sem vacilar, e nos entristecemos quando percebemos que já perdemos sangue demais para continuar a lutar. Oh, antes não tivéssemos cravado-o em nossas entranhas, e esperado com fortaleza as intempéries que o futuro por si só já reservava para nós. 

E agora eu fraco que farei, 
que patrono invocarei, 
se a mim mesmo eu matei? 

domingo, 29 de outubro de 2017

Resenha "My Bromance - The Series"

Busquei várias maneiras de começar a escrever a resenha deste domingo, mas ainda me encontro sem palavras para expressar o que sinto. É uma mescla de extrema felicidade, com um forte toque de fofura obsessiva e claro, muito amor! Dito isto, é com gratidão que guardarei a série que acabo de ver, My Bromance - The Series, e que certamente redefiniu o meu conceito de QUALIDADE!

Diferentemente da maioria das coisas que vejo essa não foi indicação de algum grupo do Facebook, mas havia baixado aleatoriamente enquanto buscava algo bom na internet, e depois de ver o filme que a inspirou (de mesmo nome, do qual falei aqui) eu decidi acompanhar, e agora me arrependo por não tê-lo feito antes, ou por não ter assistido mais pausadamente... 

Bom, como ja disse, a série é baseada no filme de mesmo nome e mostrou basicamente a mesma história, com as mudanças óbvias de um roteiro para um filme de quase duas horas para uma série de doze episódios. O plot permaneceu inalterado, enquanto a forma como a história foi desenvolvida foi melhor explorada. 

Bank se muda para a casa do novo esposo de sua mãe, e conhece Golf, filho de seu padrasto, um garoto problemático que não aceita o novo relacionamento do pai e nem seu novo irmão. Na tentativa de compreender e ajudar seu novo irmão ele acaba descobrindo mais sobre seu passado enquanto tenta superar seus próprios traumas e complicações. Vemos então um romance se desenrolar entre os dois em 2008, ao mesmo tempo que vemos eles ainda resolvendo seus problemas em 2016, quando ambos retornam para a Tailândia, percebendo o quanto ainda se sentem atraídos um pelo outro. 

Primeiramente eu gostei muito da forma como se desenrolam os episódios, pois parte da história se desenrola no passado e outra parte no presente. Achei interessante essa perspectiva pois as respostas das questões atuais se encontram muitas vezes no passado e dessa forma a narrativa pode ser mais diversificada e ainda explorar a curiosidade do espectador. Por exemplo, logo de cara vários problemas foram apresentados, como a morte da mãe de Golf e como ele e seu "irmão" começaram a namorar e terminaram de forma aparentemente trágica, mas cujas respostas só são encontradas vários episódios a frente. 

Temos então no passado um Bank meigo, companheiro e esforçado, que tenta ter um bom relacionamento com Golf, que ao contrário só quer fazer com o que pobre saia de sua vida e leve sua mãe junto. O Golf do passado é grosso, vingativo e muito complexado. Só eu identifiquei uns três distúrbios de personalidade nele e ainda perdi a conta de quantas pessoas ele esmurrou na série. Eu simplesmente passei a odiá-lo nos primeiros 3 ou 4 episódios, tamanha era a maldade dele para com o fofo do Bank, que só queria ser legal. Só aos poucos ele foi compreendendo que preferia estar próximo dele e que para isso precisaria mudar, ser mais amável e compreensível, enquanto tentava lidar com os sentimentos que cresciam dentro de seu coração, sem que ele entendesse.

No presente Bank está noivo de um americano, e se tornou um profissional respeitado, além de responsável e preocupado em cuidar da família. Golf se manteve afastado por oito anos e continua rebelde, mas voltou decidido a reconquistar seu irmão, muito embora suas abordagens quase nunca sejam as mais corretas. 

O roteiro é o ponto forte da série. Sério, simplesmente fantástico. A forma como arramaram a trama foi bem desenvolvida, e exceto por alguns exageros bem típicos das séries tailandesas eu considero um dos melhores dos lakorns BLs que já vi. Enquanto exploravam o delicado processo de entendimento entre os irmãos várias subtramas são desenvolvidas, e quase todas muito interessantes. Vários personagens foram bem explorados e como todos estavam bem ligados ao casal principal todos contribuíram de certo modo pro crescimento da história e do amadurecimento dos mesmos personagens.

Essa é talvez a coisa que mais me chamou a atenção, a forma como mostraram o amadurecimento de cada um. Desde um Golf grosso, que queimou as roupas do irmão e que depois buscou tentar ajudar os amigos para que ninguém sofresse perto dele ao Bank ingênuo que buscou superar a separação e ficou noivo de um estrangeiro, afinal não poderia ficar para sempre preso ao passado. Claro que quando eles se reencontram, oito anos depois, é normal que a carga afetiva retorne no máximo, o que pode passar a ideia de que eles nada mudaram em todo esse tempo, mas logo entendemos que a forma que ambos lidam com os problemas é diferente agora. E claro, eles se relacionam de tal modo que passamos a desejar de forma obcecada que fiquem juntos de qualquer maneira. 

Um dos poucos pontos negativos é a atuação, que não é das melhores. Na Songkhla Patpasit (Cooper) foi excelente nas cenas onde Golf explodia de raiva, e foi o que melhor demonstrou ter uma gama variada de expressões, pois soube ser sério, malvado, engraçado (muito) e até mesmo romântico. Além de ser um dos caras mais gatos de que me recordo nessa longa experiência em séries tailandesas, coisa que eu com certeza não poderia deixar de comentar. Mesmo sendo um completo idiota nos primeiro episódios ele ainda conseguiu minha atenção, mas também, com um olhar desse, quem é que não se apaixona?

Chaiya Jirapirom, que fez o Bank, é um fofo (meu crush, ninguém toca) e conquista pela doçura de seu olhar, mas não pela atuação. Ele é a cara do Beam de Make it Right, por isso me apaixonei. Achei o personagem um pouco mais apagado do que deveria, e acho que por ser o protagonista deveria ser um pouco mais decidido e não tão passível aos outros. O lado bom disso tudo é que a série não perde pela fraca atuação, mas o trabalho de direção e roteiro foi tão bem construído que conseguiu superar essa dificuldade. Se salva pela beleza e pelo carisma, aliás, aposto que aquele sorriso conquista até terrorista se quiser.
A trilha sonora incidental é fantástica e, principalmente nos primeiros episódios, contribuiu grandiosamente para a construção das cenas. A primeira metade da série é particularmente aflitiva, de tão dramática. 

Outra coisa que poderia ser melhorada, e que espero seja resolvida na 2° temporada (já confirmada), é a construção das cenas mais românticas (leia-se beijos e cenas de sexo). Os beijos foram aquela coisa que já vimos em Make it Right e Lovesick, e agora o povo quer tudo no nível de Together With Me, que se destacou justamente pela ousadia nessas cenas. A última cena mais quente, digamos assim, foi feita de forma delicada, bem artística, mas ainda assim não conseguiu ser lá muito realista, embora tenha um importante valor pra história. 

O conjunto da obra é uma série equilibrada, com um história incrivelmente cativante, que te prende do começo ao fim e faz querer ver todos os episódios de uma só vez. Tive de me controlar para não assistir demais e acabar prejudicando a faculdade, mas ainda assim a vi em pouquíssimos dias. A produção peca aqui e ali, em alguns momentos pelo exagero e outros pela falta de química entre os atores. 

Como disse no início, agora preciso redefinir a minha lista de séries favoritas, e My Bromance certamente vai parar no topo agora, e espero ansioso pela segunda temporada, a única coisa capaz de me tirar do limbo desesperador da depressão pós-série. Infelizmente ela não me pareceu ser muito reconhecida aqui, ao menos não nos grupos que participo, o que é uma pena, pois tenho certeza que a maioria iria, assim como, se apaixonar por ela!

sábado, 28 de outubro de 2017

Oh Beleza!

Oh beleza intocável, viril, douradamente proibida aos braços deste homem pecador. Oh beleza intocável, cuja resplandecência encanta os olhos, aguça o paladar e desperta no homem seu desejo mais primitivo...

Oh beleza inalcançável, cujo toque pode despertar a fúria dos deuses. Beleza feita para ser admirada, desejada, não possuída, não dominada. Beleza capaz de despertar os torpes apetites de um animal enjaulado. Beleza inalcançável, reprimida.

Oh beleza ímpar, de tom aveludado e superfície plasmada pelas mãos inspiradas do demiurgo. Quem atreveu-se a criar tamanha perfeição para coloca-la em posto tão inalcançável aos que nela pousam o olhar? Quem se atreverá a desafiar os desígnios divinos para provar de teu tão doce néctar virginal e de inexperiente desejo? Quem se atreverá a devorar a sua carne branca e rosa, que inocentemente anda pelas estepes perigosas? 

Oh beleza inocente, a sua veste branca desperta no animal o olhar letal do assassino incontrolável, que deseja saciar sua sede com seu sangue derramado, não ao chão, mas sob o corpo eufórico, excitado. 

Oh beleza de lonjura inigualável, seu olhar doce, verde, penetrante, desperta no mesmo animal o desejo, a obsessão, por sua doçura visceral, pela sinceridade de seu falar, e pelo pulsar do seu deleite vivificante. 

Oh beleza indescritível. Tão inebriante quanto o vinho. Mais hipnótica que o sol nascente ou poente. Mais viciante que o ópio. Mais aterrorizante que o leão.

Oh beleza inegável, qual será o som de sua voz quando inebriado de prazer luxuriante se entrega aos braços de um amante? 

Como se nada tivesse acontecido

O dia amanheceu, e uma brisa fria vem entrando pela janela, tocando meu rosto com delicados sopros e fazendo balançar o meu cabelo. Parece-me que toda a natureza carrega consigo uma espécie de poder arrebatador, que nos faz flutuar para aqueles lugares em que sonhamos, ao lado de quem sonhamos... Ou talvez nós, os apaixonados, que tenham a mania de se desligarem do mundo para sonhar com aquilo que nunca terão. 

E admito que só hoje já pensei nele umas dez vezes, e isso porque nem saí da cama ainda, mas ah, as imagens já me vem a mente com uma força irrefreável. Irrefreável e irrefutável, e o apaixonado, que tenta não pensar naquele que lhe causa dor e amor, se percebe sendo fraco, frágil e falho. Fraco por não ter forças para lutar contra os próprio ímpetos, frágil por permitir-se quebrar com tanta facilidade e falho por não conseguir tomar a firme decisão de fazer o que é certo para si e para o próximo. 

Como disse Mario Quintana certa vez "Eu, agora - que desfecho! Já nem penso mais em ti... Mas será que nunca deixo de lembrar que te esqueci?" me sinto como quem esqueceu, mas que apenas repetiu para si mesmo essa verdade na tentativa de convencer o próprio interior, mas que não conseguiu superar, não conseguiu esquecer. Antes ainda, parece até que as lembranças que deveria esquecer se solidificaram no fundo de minha alma. Agora, mais duras do que o aço, parece-me que nunca me deixarão em paz, e voltarão sempre a me amedrontar, sempre a jogar em cima de mim todos os erros que cometi, para que hoje ele não estivesse aqui.

E daí advém um vazio, cujas tentativas de preenchimento se mostram tão patéticas quanto as dos homens tentarem vencer a fome no mundo. É uma batalha sem rumo, sem sentido. Não há como encontrar solução. Todas as coisas que faço se mostram tentativas falhas de preencher o vazio deixado por outras pessoas, como se ao estarem comigo pegassem uma parte de mim, e ao saírem levassem consigo essa mesma parte, deixando um vazio no meu ser.

Oh, como queria poder demonstrar em palavras o que sinto quando penso em você, e quem sabe ser capaz de fazer você compreender. Se pudesse entender pensaria que se trata de sua casa o meu coração, de tanta coisa sua que há em mim, mas como você não está aqui, só o que resta é o vazio que essas coisas insistem em recordar.

Talvez o meu maior inimigo seja minha própria memória. Talvez o segredo para minha felicidade seja o esquecer. Oh, como quisera esquecer, e não mais me entristecer. Mas ao que me parece, ao menos que receba uma forte pancada na cabeça, não há como viver como se nada tivesse acontecido... Será que a vida seria mais doce assim? Será que o céu brilharia em lindas cores para mim, e não mais me entristeceria até mesmo com o mais belo azul a cintilar sob o meu olhar?

sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Seu nome

Quase duas da madrugada, e enquanto voltava para casa, observando as cores e as luzes passarem como flashes pela janela do carro, a sua música começou a tocar. Não me lembrava dela naquele CD, e levei alguns segundos pra perceber as lágrimas que escorriam e aqueciam o meu rosto. Não entendia o motivo daquele choro, mas logo percebi que era uma reação automática do meu corpo ao ouvir o seu nome. Não precisei pensar para chorar ao ouvir seu nome, mas qual o problema disso?

O problema está no sentir, no que eu senti. Está no que vivi, no que acreditei; o problema está na forma como acabou, como acabamos, o problema está na história que se encerrou antes mesmo de seu ápice; o problema está em todas as coisas que precisavam ser ditas, mas que não poderiam ser compreendidas. 

Eis me aqui agora, sob a luz do poste, sob a cruz do seu nome a ecoar no rádio e no meu coração. O que eu farei? Se quando chegar em casa não haverá nenhuma ligação sua no meu celular, se quando me deitar para dormir não haverá a certeza de que dormiu pensando em mim. E mesmo depois de tanto tempo, ainda dói, e ainda choro, apenas por ouvir seu nome. Mas é mais do que isso, são as poucas letras que, juntas, me trazem a um mundo de escuridão, onde as poucas luzes de suas memórias me cegam a alma e me fazem desejar sumir. 

Eis me aqui agora, sob a luz, sob a cruz, chorando ao lembrar de tua voz... Ao que me parece será uma longa noite... As gotas de chuva na janela parecem ser uma solidariedade dos céus em chorarem comigo. Necessito ser consolado pelo cosmos pois você não está comigo! O que farei? Para onde devo ir? Não quero ir para casa, naquela cama fria. Mas também não quero ficar aqui, no meio do nada, chorando por ouvir seu nome. Eis me aqui agora, e não sei o que farei... 

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

Viver tentando esquecer

Certa vez Fernando Pessoa disse: "Quem quer dizer o que sente não sabe o que se há de dizer.  Fala: parece que mente...  Cala: parece esquecer..." E é com essa reflexão que me debrucei na tarde de hoje, a perguntar ao meu eu o que haveria para se dizer sobre mim. Como era de se esperar não consegui mais do que alguns balbucios, vislumbres de um ente muito maior, mas que minhas palavras são incapazes de descrever. 

A inspiração para as palavras que digo vem do amor. Mas não só do amor. A inspiração vem do amor, da dor, da tristeza e do langor. O amor sendo doce e visceral, a dor sendo dor, a tristeza como uma duna descomunal e o langor, ah, a languidez é o que sente quem sente tudo. 

Mas tudo isso não é mais do que uma mentira. E é mentira pois o que sente o homem de verdade ele não é capaz de dizer, afinal muitas vezes nem o sabe, mas não por não querer saber, mas por temer saber. É mentira pois, e não confusão, que o homem não sabe o que quer, pois ele o sabe, mas teme dizer até mesmo para si. O julgamento do outro é então impresso no próprio juízo que ele faz de si, e temendo a represália do outro repreende a si mesmo. 

Que infelicidade a do homem, viver desejando esquecer o que se deseja. Triste destino o da estirpe condenada a desejar, sonhar e aspirar e não a viver. O que vivemos então? Vivemos a mentira de realizar os sonhos que nunca sonhamos, enquanto silenciosamente sufocamos o grito do desejo que no profundo ser de cada um deseja viver. 

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Resenha My Bromance (Filme)

Profundissimamente abalado! Essa foi a única sentença capaz de definir como me sinto nesse momento, ainda ouvindo as últimas notas da faixa dos créditos finais de um dos filmes mais lindos que já tiveram a honra de me arrancar lágrimas: My Bromance!

Já havia baixado o filme há muito tempo, mas por algum motivo ele sempre orbitou naquela pasta de filmes que vamos adiando sabe-se lá o motivo, e que nunca tinha me interessado sequer por ler a sinopse. Isso até algumas semanas atrás, quando num grupo ouvi comentários animados com o anúncio do lançamento da continuação, e então os que já haviam visto começaram a indicar efusivamente, tanto o filme de 2014 quanto a série, adaptada no ano passado. 

Temia que a produção fosse inferior aos BLs mais atuais e por ser tão pouco falada, acreditava que não iria gostar. Oh, quanto arrependimento, se tivesse visto antes teria me apaixonado e já há mais tempo viveria o amor que agora sinto. 

"Golf é estudante do ensino médio e agressivo. Ele cresceu sem ser amado por seus pais. Um dia Bank um colega estudante do ensino médio quatro meses mais jovem, entra em sua vida para se tornar seu meio-irmão. Para Golf, que nunca teve de lidar com a ideia de ser um irmão mais velho, isso virá como um golpe. Mas as coisas começam logo a mudar."

A sinopse como sempre traz a essência sem entregar os detalhes. E de fato o filme é tão lindo que não poderia ser expressado nem em um livro. 

Obviamente os dois novos irmãos precisam começar a se entender, e graças a gentil doçura de Bank ele consegue amolecer o coração do jovem irritadiço, e daí nasce uma bela amizade que logo torna-se um belo e trágico amor. Nem preciso dizer o que traz o drama ao filme certo? Afinal nem nos BLs um romance gay entre dois irmãos, ainda que não sejam irmãos de verdade, não é lá a situação mais simples a se administrar, ainda mais em se tratando de jovens em idade escolar. 

O elenco me chamou a atenção de primeira, já que conhecia os dois protagonistas de outras obras. O pequeno e fofo Bank é interpretado pelo gatíssimo Sripinta Pongsatorn, que também protagonizou aquele drama/suspense Red Wine In The Dark Night, que divide opiniões até hoje quanto a sua qualidade e a única certeza que todos tem é que ninguém entendeu nada do final. A atuação dele não é das melhores em nenhum dos dois filmes, mas como no segundo ele se aventurou de verdade nas cenas mais quentes, digamos assim, eu admito que esperava um pouquinho mais nesse quesito. No mais ele conseguiu melhorar sensivelmente na terceira parte do filme, e eu realmente me emocionei com suas lágrimas, muito embora seu drama fosse um pouco bobo, o que é mais uma falha do roteiro do que do ator em si.

Também conhecia Lohanan Teerapat (Fluke) que interpretou o Golf. Ele também atuou em Sotus, e pra ser sincero a atuação dele nesse filme e na série é bem parecida, inclusive os personagens são muito semelhantes também. Ambos tem o pavio curto, e escondem a bondade e a delicadeza por trás de uma casca grossa de seriedade e rompantes de fúria. Admito porém que me surpreendi com as cenas em que estava mais meigo, digamos assim, no auge do romance. 

O roteiro não é lá dos mais elaborados, e francamente se o cara tinha sofrido um acidente de carro não tinha a menor necessidade de inventarem uma doença terminal pra ele. As vezes acho que se dependesse dos roteiristas asiáticos metade da população mundial morreria de câncer (não é spoiler, afinal o filme é de 2014). Mas ainda apesar dos apesares eles ainda nos entregam uma história fofa, dramática e até bem impactante. Mesmo que nos vença pelo cansaço, acabamos nos rendendo as lágrimas e claro, as risadas, afinal quem não rir (ou ter um ataque de fofura, como eu) nas cenas em que os dois se comportam como um casalzinho, nem gente é!

Enfim, impulsionado pelo filme eu comecei a ver a série baseada nele também, e logo termino, para começar a esperar ansiosamente pela continuação. E que venha My Bromance 2! 

Profusão

Uma súbita onda de sentimentalismo vai irrompendo de minha alma e tomando o controle de meu corpo. Meu coração acelera e repentinamente vai se tornando mais difícil respirar. Algumas lágrimas vão surgindo aos poucos, juntamente com imagens que em minha mente não param de pulular, e fazendo a tristeza subir a minha garganta eu começo a engasgar.

Notas tocam os meus ouvidos, e tento me concentrar nos timbres que as diferenciam. São vozes doces, apaixonadas, e pianos tristes, decepcionados, combinando-se em estranhas profusões, confusas, difusas, como as aglomerações sentimentais que dominam o meu ser. 

Os jovens cantam o amor, os homens o perdão, e os violinos melodiam a traição, o horror. E tudo se une numa sinfonia da condenação da existência humana. Felizes os violinos que, sabendo expressar a dor não precisa senti-la para tocar... Ao contrário do homem que, não conhecendo a dor e o horror, nenhum som consegue ressoar.  

Um novo romance, uma nova história, mas as dificuldades logo se mostram na primeira esquina dessa longa avenida do desconhecido futuro ao lado de quem se ama. Um amor revoltado, tão profundissimamente magoado com a própria história que decidiu viver em função do seu próprio ódio. Mas um amor que não consegue resistir aos seus ímpetos mais profundos e animalescos, que despertaram ao pousar o olhar sobre o semblante delicado de um silfo que surgiu em sua odiosa existência. Seu sentimento primitivo passou a lutar com seu sentimento odioso e isso fez o outro chorar, e chorando ele percebeu o que amava de verdade, que não amava odiar, mas sabia que queria apenas amar, e assim esquecer o luto pelos fantasmas do seu passado. 

Oh, que deleite seria para os olhos dos anjos que viam seu amor se ele tivesse entendido antes que ele partisse para nunca mais voltar. Oh, como a melodia de seus gemidos seriam para eles uma sinfonia de profusa alegria. Mas quando suas lágrimas caíram sobre a pedra fria do catafalco onde estava o caixão de seu amado, ele percebeu que a morada eterna daquele que fez com entendesse que o amor é mais belo que o ódio seria aquela madeira, e não os seus braços quentes. Era tarde demais. 

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

A Contemplar

Eu pensei que hoje choveria. Passei a tarde observando o céu azul acinzentar-se pela janela do meu quarto, esperando que as lágrimas pesadas das nuvens caíssem sobre mim. Enquanto observava percebi que o céu de minha cidade não era o único que tornara-se cinza. Cheguei a conclusão que também o céu do meu ser tornou-se sem vida como o céu de chuva.

Mas eu sei que o cinza não é o fim, e não me refiro ao fim da tempestade, em que o azul voltará a imperar por sobre as nossas cabeças, oh não... Me refiro a água das chuvas que molhando a terra traz a vida. É irônico o céu sem vida nos trazer a vida, e pode ser que exista uma boa comparação com o céu do meu ser... Talvez tenha sido me dado a honra de perceber a ligação entre o cinza do céu, e o meu coração.

Vejo o dia de hoje como uma conversa encorajadora, com um amigo silencioso, que me leva a crer que devo continuar a lutar, ou ao menos continuar a contemplar, pois já não encontro razão no viver senão no contemplar o belo. 

Frente aos meus olhos os dias passam, fugazmente, e as pessoas passam, uma a uma, entrando e saindo de minha vida como as folhas caem de uma árvore para brotar novamente na estação seguinte, com o perdão da comparação infantil. 

Frente aos meus olhos os dias nascem, e a negritude da noite se dissolve no amarelo da manhã, que logo dá lugar ao azul delicado e quente que o sol a pino nos dá. O azul é cruelmente cortado por um laranja poderoso, que por fim termina num grosso véu estrelado da noite, para no dia seguinte dissolver-se novamente no amarelo. E esse ciclo mantém-se inalterável, não importando o que os homens façam, mostrando que o todo ainda é esmagadoramente maior que o um, ainda que o um seja mais numeroso. 

Não encontro mais razão no lutar, mas encontro alento no contemplar a vida pela minha janela, e enquanto a beleza do mundo ainda me encantar não pensarei em outra coisa que não seja contemplar. 

domingo, 22 de outubro de 2017

Vulcão

Antes pensava que apenas os dias frios, escuros, fossem propícios aos devaneios, aos pensamentos que lentamente entram em nossas veias como veneno, e que em questão de instantes nos leva a uma letargia total dos sentidos e do coração. Oh, como desejo agora que só estivesse sujeito ao veneno dos pensamentos nos dias frios... Se assim fosse, num país tropical como o que vivo, pouco me queixaria de sonhar com aquilo que me não outra coisa senão dor e mais desamor próprio. 

Estou nesse momento há poucos centímetros da janela, e  relógio diz que já se passaram das 19h, mas graças ao horário de verão o dia lá fora ainda reina, assim como o mormaço de uma chuva que há mais de uma semana se anuncia mas nunca chega... Tentei me distrair olhando as folhas do terreno vizinho farfalharem, mas tenho motivos para acreditar que o vento parou de soprar com força para tal no exato momento em que essa ideia me ocorreu. A única brisa que sinto é a do aparelho ventilador que sopra contra meu rosto uma baforada quente mas ainda assim reconfortante. Nem tanto pelo frescor quase inexistente, mas mais pela brisa que tocando meu cabelo me faz sonhar com aquela brisa amena, em que com uma mão serena, em meu colo soprava, enquanto numa tarde longínqua, o leque das folhas me acalentava. 

No meu olhar há vislumbres desconexos, pouco explicáveis pelos leves distúrbios de personalidade que um dia carreguei, há paisagens passadas e futuras, enquanto me ocupo de tentar esquecer, ou ao menos compreender, o presente. A segunda ducha nas últimas 5h lavou alguns dos pensamentos de desconforto do calor, mas foi inútil em levar os outros. Antes, acabei por mergulhar ainda mais naqueles sonhos que nunca acontecerão. 

Penso ser comum, pelo que já me disseram, sonhar em viver uma vida inteira com alguém que sequer conhecemos, e ainda que seja um exercício inútil a mente, fantasiar com desconhecidos é divertido. A diversão termina em obsessão quando nos vemos fazendo a mesma coisa com conhecidos, principalmente em se tratando aqueles em que nem em milhares de éons pensarão o mesmo. 

O sonhar, antes doce e inofensivo, torna-se uma perigosa arma nas mãos despreparadas daqueles que sonham para fugir da realidade sem graça em que vivem. "Deveriam mudar a própria realidade" dizem os outros, mas mal sabem eles que já estamos firmemente presos, acorrentados, aos nossos próprios ideais impossíveis de felicidade.

Oh que felicidade ser parte dos que num dia de calor, apenas se incomodam com a temperatura, sem precisar suportar o vulcão que dentro de nós clama pela destruição... 

sábado, 21 de outubro de 2017

Resenha Project S - The Series "Side by Side"

Acredito que um dos prazeres da (minha) vida seja o contemplar o belo. Oh, tenho uma inclinação natural ao contemplativo que apenas o próprio ato de contemplar pode tornar-me contente, é apenas na contemplação que minha alma encontra alento, força para continuar a viver. 

Das coisas que meu coração tende a contemplar espaço especial tem aquelas histórias de amor que, sendo perfeitas e suficientes por si, tem o poder de preencher os espaços vazios do meu âmago, e até mesmo os espaços que não sabia ter acabam preenchidos. 

Assim me senti ao terminar uma história que há muito adiava, aumentando a expectativa em escalas atômicas quase imensuráveis. A segunda temporada de Project S - The Series é diferente da anterior, mas igual em qualidade e quase mais emocionante também. "Side by Side" foi, desde o anúncio da série, a minha maior espera. Assisti "Spike" apenas pra não pular, e me surpreendi grandiosamente, e com a segunda, ainda que a expectativa fosse grande, consegui me emocionar ainda mais. 

Conheça o caloroso poder do amor de uma família de esportistas, através da história de duas viúvas, Tum (Ple Hattaya Wongkrajang) e Tang (Sukwan Bulkul). Vizinhas, elas criaram os dois filhos ajudando-se mutuamente, como se o filho da outra fosse o seu. Os dois garotos cresceram como irmãos. Yim (Tor Thanapob), filho de Tum, é autista e seu desenvolvimento mental e físico é de uma criança de 6 anos. Tang, ex atleta de badminton, que pratica o esporte com seu filho Dong (Sky Wongravee), decide treinar Yim na prática esportiva, com a esperança que isso o ajude no seu desenvolvimento. Entretanto, um verdadeiro milagre acontece quando eles descobrem que Yim é um excelente jogador de badminton, superior a Dong. Tang, então, decidem formar uma dupla profissional entre Yim e Dong. Mas ninguém, nem mesmo a própria família, parecem estar preparadas para as dificuldades que essa decisão irá causar.

Por incrível que pareça a história é só isso, e acredite quando digo que já é o suficiente pra grossas e pesadas lágrimas. 

Primeiramente todos nos tornamos reféns da doçura de Yim, e apreensivos com suas constantes crises. Tendo um elevado grau de dificuldade de socialização o jovem não consegue assimilar o básico do comportamento que se tem ao se lidar com o próximo, e explode com facilidade, deixando sua família embaraçada e os desconhecidos assustados. Sendo ele um atleta dedicado e talentoso ele é, nesse campo, superior ao seu primo, o que somado a sua necessidade de atenção e carinho constante acaba por deixar Dong por viver a sombra de seu primo, sendo sempre deixado em segundo plano, ou tendo de se sacrificar por ele. 

Obviamente temos um questionamento de valores em todos os episódios, e não é de se surpreender que cada espectador comece a se perguntar como seria sua própria conduta em tal situação. Todos os pontos de vista são justificáveis e compreensivos, ainda que o pareçam cruéis e egoístas, o que nos leva a temática principal: o amor ao próximo e a si mesmo. Qual o limite que separa os dois, e até onde se deve sacrificar em função do outro? A realização está no fazer a própria vontade ou no fazer o outro participante de nossa alegria, ou ainda de participar na alegria da realização do outro? 

Essas são apenas algumas das perguntas que fiz a mim mesmo enquanto chorava rios, sorrindo e esbravejando ao mesmo tempo. 

Além de uma história emocionante, um roteiro muito bom, temos também atores excelentes. Já havia dito que Project S é muito superior a maioria das séries tailandesas que já vi, e de fato a qualidade nessa segunda temporada se manteve. 

Tor Thanapob, que não conhecia,  é simplesmente genial em sua atuação. Suas explosões de fúria, bem como momentos de alegria são como que verdadeiras pérolas. Nada menos do que um esforço hercúleo em representar um personagem total e completamente distinta que qualquer outro personagem. Aqui não era apenas uma personalidade que devia ser representada, mas uma dificuldade real. Anseio por vê-lo agindo "normalmente" agora, pois como autista ele simplesmente me cativou. Preocupava-me com alguns vídeos que via durante a divulgação, e perguntava-me se um ator tão bonito teria o talento para tal missão, pois bem sei que o mundo do entretenimento tailandês preza muito mais pela beleza do que pelo talento. Me enganei completamente! O cara, além de um tremendo gato, é um grande ator. As atrizes que fazem as mães também são muito boas, já quero fazer parte da família!

Sky Wongravee foi outra surpresa. Olhei sua ficha online e de fato ele não esteve em nada que eu ja tenha visto, e me apaixonei a primeira vista. É sério, ele é o meu príncipe encantado! Muito embora o seu personagem basicamente só tivesse duas expressões básicas, ódio e tristeza, ele ainda me encantou. Talvez mais pela beleza do que pelo talento, mas ainda assim reconheço, ele chora muito bem, e tem profundidade pra personagens complexos, pois consegue apenas com a expressões nos passar uma gama enorme de pensamentos concretos, não apenas emoções. Em mais de um momento ele, sem dizer nada, nos disse muita coisa apenas com as expressões. Detalhe ainda para os, poucos, sorrisos que ele deu, que sorriso lindo! (Já quero BL!)

Sim, infelizmente a série não é BL, e tudo o que temos é um beijo rápido entre os priminhos (foto que não é spoiler porque aparece no trailer), o que parece ser uma prática comum na família dele, mas nada realmente BL, nem as insinuações mais do que declaradas da temporada anterior. 
Claro, isso não tira o mérito da série, e quase não encontrei defeitos. Bom, a narrativa é um pouco lenta demais em alguns pontos, o que nos deixa com a impressão de que mais coisa deveria acontecer, e olha que a série só tem 8 episódios. Também senti falta de um alívio cômico, de fato cômico, pois rir de um garoto autista não é legal. Não tinham muitos personagens desenvolvidos, e exceto pela menininha que era amiga de infância dos primos, quase ninguém apareceu fazendo outra coisa senão observar atônito a complicada realidade familiar deles.

A trilha sonora é de novo outro ponto positivo, não tão boa quando a de "Spike", mas ainda excelente em fortalecer o clima de cada cena. Destaque pro encerramento, fenomenal!

Finalmente temos um Drama com D maiúsculo, para ver ao lado de um pote de sorvete e caixas de chocolate, além de muitos lenços. A história é emocionante, cativante, e você sente vontade de fazer parte dela mesmo sendo absurdamente triste. Mais do que obrigatória para qualquer um que queira se emocionar e refletir, sobre o próprio amor e sua relação com o próximo.

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

Resenha - Lovesick The Series

Gosto de boas surpresas, e quem não gosta? Afinal é ótimo quando você não espera por nada e é surpreendido com uma tonelada de coisas boas não é mesmo? Principalmente em se tratando de histórias, é bom se sentir cativado, sentir que participa de algo, é bom se sentir tão inteiramente absorto em algo que essa coisa passa a ser parte de você. 

Terminei de ver a primeira temporada da série tailandesa cujo nome é obrigatório na lista de qualquer amante de BLs: Lovesick - The Series! Obrigatória pois, mesmo não sendo a primeira do gênero, foi ela que de certa forma abriu as portas paras as séries que vieram depois. 

Lançada em 2014 e renovada no ano seguinte para uma segunda temporada ela inaugurou o que hoje estamos vendo no gênero lakorn BL, e mesmo sendo bem inferior, já adianto, as obras posteriores, o seu posto está mais do que bem conservado como a precursora desse movimento tão lindo. 

Como assisto a maioria das coisas por indicação dos grupos de fãs de BL do Facebook eu a deixei por muito tempo no limbo da lista de espera, mas decidi ver antes de começar outras mais novas que também se encontram por lá, e antes também de acompanhar as atuais, ainda em lançamento.  

E olha, não poderia ser uma surpresa mais agradável. Admito que a expectativa estava bem baixa, justamente pelo fato de ter sido produzida antes de toda a experiência do meio. E essa é justamente a palavra chave da resenha de hoje: Experiência.

O que mais me marcou em Lovesick foi a presença inexperiente dos atores que eu já conheço tão bem de tantas outras produções. Claro, todos ainda crus, em processo de aprendizado, mas ver que de onde vieram os artistas que hoje eu tanto admiro foi uma experiência simplesmente fantástica. Em cada cena a gente se depara com um rosto conhecido dessa ou daquela série, desse ou daquele filme... 

O plot da série é diferente das que se seguiram a ela, não foca em um casal apenas mas numa gama impressionante de personagens. Tem gente pra caramba, e óbvio que nem todo mundo foi bem desenvolvido, coisa que, espero eu, tenha se resolvido na segunda temporada, com 36 episódios. A sinopse não revela nada do enredo, e diz apenas: 

Baseada na BL novel online “Lovesick:A caótica vida dos garotos de shorts azul.”A série acompanha a vida de garotos do ensino médio, e suas paixões e desilusões amorosas na adolescência. Além de rivalidades, pressão familiar e dos colegas, relacionamentos, etc.

A primeira surpresa foi a faixa de abertura, SHAKE do Boy Sompob, que eu já conhecia por ter cantando a Trilha Sonora Original de Waterboyy - The Movie, e que coisa boa ver que ele já fazia parte do meio BL nessa época... 

O foco principal da série é o relacionamento entre Phun e Noh, que por conveniência decidiram fingir um namoro gay. Phun é presidente do Conselho estudantil e filho de um homem rico, que quer obriga-lo a se casar com uma desconhecida. Noh é líder de uma banda que por um erro no orçamento pode vir a ser prejudicada se o presidente do conselho não ajudar, coisa que ele faz em troca de Noh se passar por seu namorado, para que a sua irmã caçula (amante de BLs) o ajude a convencer seu pai a não obriga-lo a se casar. 

Muito embora esse plot tenha sido esquecido ao longo dos 12 episódios da primeira temporada foi por causa dele que os meninos começaram a confundir sua relação. O resto é o que dá o preenchimento da história. Eu gostei do absurdo que isso parece. Imagine, um garoto aceitar se passar por gay para não casar e o outro aceitar para não prejudicar os amigos? É fantástico. 

Mas as coisas boas na vida deles acabam aí, já que eles logo passam a sentir algo mais um pelo outro, e como ambos tem namoradas essa confusão na cabeça deles é garantia de muitas lágrimas, e também risadas, além de momentos românticos, claro. Nesse ponto a série é muito bem equilibrada, nem o drama e nem a comédia tomaram o brilho do outro, foi muito bem balanceado, fazendo os episódios de pouco mais de 40 minutos se tornaram pequenos. Com exceção dos dois primeiros, que de fato são bem difíceis de engolir, dado aos fatores que direi logo adiante.

Os problemas que a série apresenta, completamente compreensíveis, são todos de ordem da direção e roteiro. Ambos meio confusos em toda a série, mas ainda piores nos dois primeiros episódios. Tentaram colocar histórias demais que não relacionavam tanto entre si. Ainda que a maior parte dos personagens se conheça ficamos muitas vezes nos perguntando se era mesmo necessário explorar tantas histórias assim. Algumas bem chatinhas, aliás... Mas fora isso, achei o conjunto muito satisfatório, sem muito a dever das séries que hoje passam nas telas tailandesas.

Eu gostei do desenvolvimento do casal principal, e achei bem fiel no quesito "peso na consciência" que os meninos costumam sentir ao descobrirem sua sexualidade e também na batalha interior entre medo e desejo. Sem exageros nem cômicos e nem dramáticos foram bem felizes nessa parte do roteiro. Eles realmente se sentiram doentes, ao ficarem juntos, mas ao mesmo tempo sabiam que o que sentiam era forte demais para ignorar, estavam "doentes de amor"!

Agora minha parte favorita: o elenco! Claro, nenhum deles tem uma atuação fabulosa, mas eu me empolguei por reconhecer tantos rostos familiares, sinal de que poucos não se mantiveram no meio... 

Começando pelos protagonistas, Phun é interpretado por Phumphothingam Nawat (White) que eu conhecia de Water boyy - The Series, como Fah, foi bom ver como foi seu começo, e embora em Water Boyy seja hétero, ver que também foi o precursor de tantos casais fofos do BL que tanto amamos foi incrível... Ele faz par com o Noh, interpretado pelo Kongyingyong Chonlathorn (Captain) que, mesmo não fazendo meu tipo, é tido como um dos queridinhos das meninas por lá... Ele atuou também em U-Prince, como o White,  e em Love Songs Love.

Minha maior surpresa foi o Luangsodsai Anupart (Ngern), que eu conhecia de Water Boyy – The Movie, o que me marcou como um dos meus filmes favoritos de todos os tempos! Um dos poucos que ainda me faz chorar toda vez que vejo... Aqui ele também faz um personagem gay, e bem mais resolvido que no filme, que no entanto não foi muito explorado, exceto em sugerir um possível triangulo amoroso com o casal principal na próxima temporada.

Outro rosto conhecido é o de Cheewagaroon Harit (Sing), figurinha carimbada de Senior Secret Love: Puppy Honey, Slam Dance e My Dear Loser. Um fofo ele...  Também tem a estréia de Arpornsutinan Chanagun (Gun ou Gunsmile) que fez o Prem de SOTUS e que também participa de My Dear Loser, e já confirmado para retornar em SOTUS S. Mas talvez a carinha mais conhecida seja a do fofíssimo orelhudo Kuariyakul Jirakit (Toptap) que tem uma lista longa de participações em lakorns, BL ou não, sendo a mais marcante em Water Boyy – The Series.


Por fim, Lovesick nos dá uma história excessivamente fragmentada pela quantidade de personagens, mas que soube manter o equilíbrio entre momentos de drama e descontração, faltando só mesmo um pouco mais de romance. Como já disse, simplesmente indispensável na lista dos amantes de BL, tanto pelo valor histórico quanto pela trama. 

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Lento efeito

Surpreendi-me absorto em devaneios, em sua maioria de ordem existencialista e sentimental, durantes alguns momentos de uma densa aula de filosofia que assisti nesse fim de tarde/início de noite de terça.

Após uma sessão de terapia também reveladora no tocante a algumas compreensões que ainda não estavam claras em minha mente. Percebi que já tinha conseguido sim chegar a algumas conclusões, em si muito importantes, mas que, antes de demarcarem minha vitória numa espécie de competição de maturidade comigo mesmo, me mostram que essa mesma maturidade é em si mesma um caminho, não um objetivo final. Me atreveria a dizer que se trata de uma causa com fim em si mesma, isto é, o objetivo de se atingir a maturidade não é chegar num estágio final, mas aprender a caminhar de tal forma que se diferencie da forma de caminhar os imaturos, aqueles que ainda não conhecem o caminho.

Refletia também acerca do meu estado atual de mente. Percebi que a minha necessidade constante de um estado mais ou menos permanente acabou me cegando para a inconstância que eu mesmo sou. Com efeito, frequentemente classificava os períodos de minha vida com etiquetas que pudessem, ao menos até certo ponto, refletir o que se passava comigo. Minha tendência negativista fez com essas etiquetas fossem todas preenchidas com palavras tão pessimistas que chego a me perguntar sobre minhas tendências quase obsessivas com a dor e a doença.

Por isso era comum ouvir de mim que passava por uma fase “difícil, complicada, dolorosa” que na verdade apenas ofereciam ao ouvinte, que na maior parte das vezes tratava-se de mim mesmo, uma perspectiva pouco pragmática sobre a ordem real das coisas. Minha necessidade de classificar a tudo fez com que eu me irritasse com a incapacidade de fazê-lo, afinal um dado momento de vida não pode ser reduzido a uma mera palavra, ou a uma oração curta, sendo tampouco expressa em longos textos, que foi o que fiz em muitas dessas fases.

Retomo a reflexão de saber em que fase da vida me encontro: não o sei! Ora, se a complexidade da realidade em que me encontro supera de forma abismal a minha capacidade literária de descrever o que vivo, sinto e penso, logo sou completamente incapaz de dizer como tenho vivido, podendo apenas me abster em dizer alguns dos aspectos dessa mesma fase. Fase essa que tem sido marcada por descobertas, conclusões, mas apenas marcada e não exclusivamente definida por tais coisas.

Essa pode ser apenas uma forma longa e demasiado cansativa de dizer que não sei bem o que tem se passado comigo, e isso pode ser bem verdade, já que em dados momentos eu não faço a mínima ideia do que tem acontecido ao meu redor, mas também em outros momentos penso saber exatamente o que se passa ao meu redor.

Não sei, portanto, se meu sofrimento vem do sentimento que não vi crescendo dentro de mim, ainda que eu mesmo o tenha cegamente o alimentado. Ou se vem dos sentimentos passados que ainda não consegui enterrar e que me assustam como fantasmas podres que um dia viveram ao meu lado; talvez venha da minha inconstância, ou da minha constante teimosia em desejar o inalcançável. Não sei ao certo, e por hoje pouco me importa, se no fim das contas poderei deitar minha cabeça sobre o travesseiro e sentir o efeito lento dos benzodiazepínicos tomar conta do meu ser já ficarei bastante grato por nada compreender. 

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Filha do destino

Depois de uma noite difícil, brutalmente torturado pelo calor lancinante dessa época do ano, fui levado a uma segunda reflexiva, motivada pelas palavras do novo curso de filosofia tomista em que me inscrevi e também pelos acontecimentos das últimas semanas, que aos poucos vem cravando no meu coração os ensinamentos profundos que apenas a experiência com o outro pode nos ofertar.

Com efeito, aprender uma lição na pele é mais valoroso que no intelecto, e por isso continuo a crer que o corpo dobra o intelecto. Repetia continuamente a mim mesmo, que não me deixaria levar pela emoção e pela ilusão de um relacionamento perfeito, sem mágoas ou cicatrizes. E justamente cegado pelo meu discurso de amadurecimento eu me vi fazendo exatamente os mesmos passos que tantos outros "teóricos da decepção" fizeram... 

Mas agora, aos poucos como deve ser todo amadurecimento, eu vou compreendendo que o esperar é o principal gatilho da decepção. Esperamos do outro o melhor, e ele não é capaz de corresponder a essa expectativa. Já me debrucei longamente sobre isso em diversas vezes, mas é diferente quando o coração entende o fato e não a palavra. 

E começo a arranhar a superfície do entendimento de que na verdade não sou bom para estar com alguém, muito embora o deseje tão fervorosamente. Isso porque além da grandiosa imaturidade afetiva há ainda uma anormal mania de perseguição que me rende as mais tenebrosas experiências de abandono, que agora vejo serem justificadas. 

Compreensível a visão que os outros tem de mim, e que agora começo a ver também, que tem se mostrado mais real do que a que costumava ter. Infelizmente me trazem mais conclusão doloridas do que perspectivas de futuro, mas creio que seja um primeiro passo importante. 

Me pergunto agora quais serão os próximos capítulos de minha história. Se conseguirei superar as dificuldade que me tornam tão desprezível aos olhos dos outros, se conseguirei me entregar aos que demonstram interesse por mim e não por aqueles que mal sabem de minha existência. Penso que a primeira medida a ser tomada deva ser a superação dessa veia masoquista que me leva sempre a desejar o que não poderei ter, e que obviamente sempre me leva aos mesmos destinos de dor e tristeza. 

Pois bem, entendo que a palavra me deu certa compreensão, mas apenas a vivência me levou ao primeiro estágio da sabedoria, apenas a dor soube me ensinar o que a palavra gritava em meus ouvidos, e apenas a dor, essa filha do destino, poderá me fazer compreender o que é a vida...

domingo, 15 de outubro de 2017

Sonhando sem parar

Algumas pessoas foram feitas para serem felizes, outras para perderem suas vidas em fábricas e escritórios. Algumas também foram feitas para consumirem-sem em sonhos inalcançáveis e outras para conquistarem o mundo e ainda assim não conseguirem se sentir satisfeitas.

Acontece que algumas pessoas simplesmente podem e serão algo que podem ou não querer ser ou também podem nunca chegarem a ser nada. 

Tenho dificuldade para acreditar em destino, mas também me sinto tentado a crer que as coisas estão já escritas, e que nós caminhamos por um caminho já traçado. Não quer dizer que não tenhamos liberdade, mas que já está dito o que faremos com essa liberdade. Como quando dizemos a alguém "faz o que você quiser" mas a sabedoria e a experiência já sabem o que a pessoa vai fazer, mesmo que tenhamos dado a ela a possibilidade de fazer ou não.

Quero dizer que algumas coisas podem ser, e outras podem não ser, e tentar quebrar uma coisa inquebrável é mais do que burrice, é masoquismo! Por isso alguns foram feitos para sonhar e não para alcançar.

Alguns foram feitos para escrever lindas canções, outros para ouvir, alguns ainda para criticar. Alguns foram feitos para observar, outros para tocar e alguns até para beijar, mas alguns, ah, esses vão para sempre só sonhar... 

Faço parte dos que nasceram para sonhar... Sonho com o mar, com a música de um piano numa sala lotada ou de um violino sozinho na praia. Sonho com uma brisa sob a luz do luar e com uma mão delicada a me tocar. Sonho palavras que nunca vou ouvir e com olhares que nunca vão me olhar... Sonho, sonho sem parar... 

As bodas do Cordeiro

A Liturgia deste 28° Domingo do Tempo Comum é para nós um misterioso convite a conversão e a busca pelo Reino de Deus. Em linhas gerais a temática das Bodas do Cordeiro permeiam as leituras e o salmo e culmina na Parábola dita no Evangelho. Como boa parte das escrituras as literatura bíblica exige sempre ser lida a luz do Divino Espírito Santo para que só assim possa fazer uma mudança profunda em nossas vidas.

Num contato inicial a primeira leitura, retirada do livro do profeta Isaias, pode nos parecer de mais fácil compreensão que o Evangelho, e de fato sendo mais simples ajuda na compreensão deste. Numa visão profética e apocalíptica, mas não no sentido devastador que normalmente atribuímos a palavra 'Apocalipse', Isaías nos oferece a promessa do convívio dos eleitos, e descreve boa parte do que deve ser a visão beatífica daqueles que estão diante de Deus. 

"O Senhor dos exércitos dará neste monte, para todos os povos, um banquete de ricas iguarias, regado com vinho puro, servido de pratos deliciosos e dos mais finos vinhos." (Is 25, 6)

Realmente a promessa das bem aventuranças, do paraíso, é sempre regada de belas visões e paisagens demasiado românticas em nossa mentalidade. Isso se deve ao fato de que estamos sempre em busca de satisfazer nossos desejos e a imagem de um Deus que satisfaça esses desejos é tentadora a nossa consciência. O que deve mover nossa busca não é, no entanto, a banquete do Cordeiro, mas O Próprio Cordeiro que de bom grado nos oferta o banquete. Trata-se então de uma percepção de qual deve ser nosso fim: a convivência com Deus, que nos fez uma promessa de uma vida eterna, ao seu lado, alegria está que só pode ser comparada as maiores delícias do mundo pois o homem é incapaz de compreender as maravilhas de Deus em sua totalidade.

É por isso que em inúmeras passagens bíblicas, e em outros inúmeros escritos de santos, vemos o paraíso retratado como um banquete. Isso porque o banquete é também símbolo de Deus: que nos une, partilha, alegra! O verdadeiro cristão é então movido a converter-se pela promessa do viver com Deus e partilhar de seu amor pela eternidade, delícia suprema. 

A nossa infelicidade terrena muitas vezes se deve pela busca da felicidade aqui nessa vida, daí a justificativa do apóstolo Paulo ter aprendo a viver na miséria e na abundância. Para ele, e para o cristão, não há alegria no possuir aqui, servindo tanto o muito como o pouco, sendo que o essencial Deus não deixa faltar. 

"Irmãos: Sei viver na miséria e sei viver na abundância. Eu aprendi o segredo de viver em toda e qualquer situação, estando farto ou passando fome, tendo de sobra ou sofrendo necessidade." (Fl 4, 12)

Infelizmente nos cegamos com a promessa de felicidade, das delícias do banquete eterno, e passamos a crer que teremos tudo isso aqui, e quando não conquistamos o que queremos muitas vezes nos voltamos contra Deus, dizendo que este não cumpriu sua promessa de felicidade aqueles que o seguirem. Mas ora, se ele prometeu a alegria eterna de sua convivência não deveríamos buscar essa alegria aqui, onde nada é eterno. Por isso a felicidade cristã está na pobreza evangélica de saber viver com o pouco, e não se deixar cegar pelas falsas promessas que se disfarçam de Palavra de Deus. 

Com a compreensão da promessa do Banquete Divino iluminada pela sabedoria de São Paulo entendemos melhor o que a parábola do Evangelho de hoje. Com um final inesperadamente duro por parte de Nosso Senhor nos deparamos com um cenário também apocalíptico: a parábola trata-se da história da salvação! E continua sendo tão atual quanto o era para a comunidade ao qual o Evangelho de Mateus se destinava.

Para um melhor aprofundamento podemos dividir a parábola em duas partes, uma relacionada aos judeus e a outra aos cristãos, sendo ambas atuais. A primeira delas refere-se ao chamado de Deus ao povo eleito, que deus as costas ao Messias que o enviaram de tal forma que preferiram leva-lo a cruz do que ouvir sua boa-nova. 

"Mas os convidados não deram a menor atenção: um foi para o seu campo, outro para os seus negócios." (Mt 22, 5)

Assim também nós não nos ocupamos das coisas de Deus por estarmos demasiado ocupados demais com as nossas próprias coisas. O mundo nos ensina a buscar sempre algo que possa preencher aquele vazio no coração do homem e que o aflige desde o primeiro pensamento. Devemos preenchê-lo com conhecimento, alegrias, prazeres, mas nunca com Deus. E então nos esquecemos de ir ao seu banquete, ignorando que o rei pode lançar seu exército contra nossas cidades, como dito no Evangelho logo em seguida.

Isso porque o homem esqueceu-se do inferno também, além do próprio céu. Até mesmo em nossas Igrejas hoje já não se escuta essa palavra 'inferno', já não se acredita mais nisso e portanto não há necessidade de mudança de vida. Não se fala no inferno, não se fala no céu e não se fala em conversão, mas isso não exclui a existência dos mesmos, antes, nos exclui sim da convivência beatífica. 

"Então o rei disse aos que serviam: ‘Amarrai os pés e as mãos desse homem e jogai-o fora, na escuridão! Aí haverá choro e ranger de dentes’." (Mt 22, 13)

A segunda parte, quando o rei ordena que os servos busquem convidados para seu banquete nos caminhos e encruzilhadas, corresponde ao chamado de Deus aos povos que não faziam parte da aliança do povo de Israel. Somos nós, todos aqueles chamados porque os judeus não ouviram, e todos incorporados ao corpo místico de Cristo por meio de sua Igreja.

Também nós fomos chamados, mas não buscamos dar a resposta mínima que o rei exige: a veste nupcial! 

No Novo Testamento diversas vezes encontramos a expressão da veste, na parábola do filho pródigo, nas palavras de São Paulo e no Apocalipse de São João, e podemos entender que, mais do que uma veste exterior, a veste de que fala Jesus é a da conversão, que motivada por uma expressão exterior, reflete numa expressão interior. 

Não devemos excluir a veste exterior em virtude de uma interior. Isso é antes de tudo uma outra faceta do relaxamento característico de nosso tempo. Coloca-se a atitude exterior em segundo plano em nome de uma interiorização maior. Mas esquecem-se que uma move a outra simultaneamente, e esquecendo-se de uma, logo se esquecerão também da outra. 

O interior não tem então prioridade sobre o exterior, mas os dois devem se enriquecer mutuamente, afim de que o todo encontre a conversão. 

A mensagem central desta liturgia é o chamado a conversão, que por sua vez nos leva a participação no Banquete do Cordeiro, mas que requer de nós uma resposta, uma veste nova, para então ser realizada em nosso interior e refletida em nosso exterior. 

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Levando flores

"Sinto abalada minha calma,
Embriagada minha alma,
Efeitos da tua sedução..." (Cartola)

O efeito da paixão é, acredito eu, infinitamente mais poderoso que o da embriaguez. Viver dessa forma é viver perigosamente no limite fino entre a realidade e a obsessão travestida de fantasia. 

Dificilmente consigo perceber quando estou a cruzar os umbrais de uma consciência limítrofe a razão... Mas agora, quando já estou a contemplar os horizontes da antiga existência segura, me vejo a tremer de pânico, com minha alma a arder na noite escura. 

Mas eu sei, e como sei, o quanto é perigoso cruzar esse limite. Pois como bem já vivi a muralha entre o sentimento bom e racional e o sentimento fatalmente desequilibrado é tudo o que impede uma pessoa de cair na completa loucura, movida pelos desejos luxuriosos de sua mente deturpadamente perturbada.

Mas a paixão é como uma chama lúgubre ardendo numa parede escura. Encanta o olhar e o coração atraindo a atenção para sua inebriante e tórrida morte. Ah a paixão... Abalar a alma é um eufemismo demasiado exagerado para explicar a paixão. A paixão é cegueira, é morte traiçoeira, é um amarrar-se sozinho no cadafalso da própria condenação!

Os apaixonados levam flores aos amados, mal percebem eles que levam flores também aos próprios túmulos, depois de tê-los eles mesmos cavados as suas covas, e entregado-se aos braços enamorados dos seus carrascos. 

"Sinto abalada minha calma,
Embriagada minha alma,
Efeitos da tua sedução..." (Cartola)

Da língua

Vivemos tempos difíceis, onde o combate nos aguarda em cada esquina, e em cada passo uma nova luta é travada dentro e fora da pessoa humana. Alguns buscam a vitória nas armas, outros se escondem atrás da religião e alguns ainda colocam outros para lutar em seu lugar. De fato as estratégias são tão diversificadas quanto são as pessoas que as usam, e para ser sincero, diria que a crueldade das pessoas é a única coisa maior que a luta que cada um deve travar.

Dentre as muitas armas que um homem pode portar uma em especial me encanta, ao mesmo tempo em que me aterroriza mais do que qualquer outra. Quando digo 'arma' poderiam pensar na bomba, na guerra ou quem sabe na doença, mas não, a arma de que digo é uma bem menor, mas com um poder devastador infinitamente maior que o de qualquer guerra, aliás, é capaz de controlar qualquer guerra.

Me refiro a língua, a palavra. Uma arma por vezes esquecida mas continuamente usada ainda em larga escala para matar, roubar e destruir, e mesmo sem saber ou perceber continua sendo a especialidade do homem.

A língua mata, e ouso dizer que mata mais do que qualquer doença ou bomba criada pelo homem, e no entanto não foi criada pelo mesmo. A língua é de longe o veneno mais letal e corrosivo que pode vir a correr por entre as veias senis de uma alma. As palavras com frequência ferem com mais profundidade que as balas que carregam as armas. 

Apenas quem já foi ferido por uma língua afiada como aço frio sabe o poder que ela tem, e com frequência a usamos sem nem ao menos perceber o mal que podem fazer. Claro, poderia também falar do bem que ela pode fazer, mas estou confiante em crer que o homem aprende mais com a dor do que com o amor, então um panorama visual do poder destrutivo da língua é mais eficaz do que uma sugestão adocicada de seu poder construtivo.

Um veneno natural pode ser neutralizado com uma amostra do que contém em si, mas uma palavra não, muitas vezes não existe forma no mundo de dizer 'perdão' que possa curar uma ferida provocada por uma língua maldita.

Mas as pessoas não ligam para isso. Assim como usar as armas para colocar sob seus pés os seus inimigos também usam da língua para curvar a si sua mente e seu coração. Por isso diz-se que a língua corrompe, dobra até mesmo o aço, e mata até mesmo a mais bem intencionada consciência.

Também roubamos do outro sua vontade de viver, seus sonhos e esperanças quando nossas palavras passam a ser repetidas sem discriminação por qualquer um; Colocamos sobre o outro o peso de nossa língua e lhes roubamos o direito a uma vontade própria. Como é triste ver uma pessoa cuja palavra se calou e cuja língua não é outra senão a língua daquele que a domina. 

Desespero grandioso é o sentido por aqueles que precisam viver sob o peso das palavras de aço dos que o cercam. Essas lhe cortam mais do que o ferro que foi levado ao fogo, e certamente ardem mais do que o próprio fogo... Ah, o homem não compreende o poder que tem, e ainda o usa sem temor, dobrando o outro a si e envenenando sem perceber os que diz amar, mas que apenas deseja a si curvar. 

Bestialmente

Os dias passam, as horas correm... Vem o dia, vem a noite, e eu prometo a mim mesmo que amanhã será diferente, que vou levantar disposto a mudar, a lutar, mas todo dia é a mesma coisa.

Sair da cama já exige um esforço enorme, e sair por algumas poucas horas me deixa completamente exausto. Passei horas dormindo depois de ter ido a missa ontem cedo. Meu corpo não tem conseguido se curar, não tem conseguido viver.

Acreditava que seria uma questão psicológica, e que a força de querer levantar poderia me bastar, mas não bastou. Mesmo depois de dormir mais de 5 horas direto e eu ainda não conseguia levantar sequer para tomar água. O sol queimava minha pele mas eu nem ligava, só queria ficar deitado ali, pra sempre. E quando chegou a noite, esperava que o sono não viesse, mas logo ele apareceu, forte e pesado como uma barra de chumbo. Não dormi por 8 horas, como sugerem, mas por 12, e esse tempo é ainda maior em alguns dias, já cheguei a passar 16 horas direto sem conseguir sequer trocar de posição. 

A disposição para escrever tem sido outro problema. Quando finalmente consigo superar a dificuldade de ficar desperto o suficiente para escrever qualquer coisa que seja, as ideias simplesmente somem da minha mente como fumaça entre os dedos. Nada permanece, nada fica.

E essa tem sido a manifestação pessoal que tem se dado em todos os aspectos da minha vida: a permanente transitoriedade de tudo. Dizem que a única constância do universo é a inconstância, mas aceitar isso é mais difícil do que repetir as palavras. A inconstância tem me dilacerado por dentro, e tem feito eu desejar mais do que nunca a eternidade, o perfeito; Quisera eu me tornar a existência perfeita, e cobrir com minha consciência a totalidade da existência, mas quanto mais desejo isso, mais percebo o quanto isso é um sonho tolo, infantil. Ora, não é isso que desejam as crianças, um mundo onde ninguém os contrarie? 

Tudo o que tenho feito então é desejar como uma criança que meus desejos sejam atendidos, sem no entanto perceber o quão ridículos eles são. Por isso a dor, o sono, a letargia, pois meu corpo percebeu o perigo que é para mim e para os outros ficar acordado, sonhando e pensando. Por isso o meu corpo se encarrega ele mesmo de proteger o mundo de minha bestial mente...

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Silêncio e veneno

As últimas noites tem sido difíceis. Percebi que tenho esperado que o tempo resolva, que o tempo me acalme, que o tempo me console. Mas tudo o que tem acontecido é que o tempo tem me deixado ainda mais apreensivo, ainda mais magoado.

Tudo o que o silêncio sepulcral da noite faz é me lançar num abismo de pensamentos sórdidos, e embora os dias estejam quentes tudo o que minha alma encontra é a frialdade inquieta do aço de uma espada a me transpassar o coração. O aço é frio, e as palavras também são frias, não há no mundo para o meu coração abrigo, condenado a viver em eterno exílio. 

O meu silêncio é resposta de mais silêncio, mas já não sei mais quem responde a quem. O meu silêncio é reflexo do medo que meu coração tem de mais uma vez ser abandonado sobre as palavras frias de adeus. 

É com um sorriso macabro no rosto que eu me recordo que todas as minhas ações foram e continuam sendo movidas pelo medo de ficar só. E foram elas que me deixaram como estou: só! A cruel ironia do destino como um dardo inflamado foi lançada no meu coração, e a paralisia que se segue ao contato do veneno com meu sangue me deixou ao chão. 

Não há uma conclusão, um insight, uma compreensão. Há apenas silêncio, dentro e fora de mim, enquanto espero o veneno terminar de fazer efeito e finalmente ceifar a vida miserável que ainda insiste em existir. 

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Sentença

Meu lamento tem sido a dor da perda. Minhas lágrimas mais uma vez correm pelas costas que foram viradas para mim. Minha voz grita pelo olhar que se fechou...

As pessoas dizem que precisamos superar a partida dos amigos. Dizem que amigos vem e vão o tempo todo, que ninguém fica para sempre na vida de outra pessoa, e isso é bem verdade. Mas como conseguem superar as perdas? Como conseguem esquecer alguém que te tocou tão profundamente a ponto de deixar uma assinatura na sua alma e uma marca no seu coração? 

No último sábado eu ganhei um abraço, como há muito não ganhava... Foi uma despedida? Foi aquele abraço o último gesto de carinho daquela pessoa em minha vida? 

Minha condenação é a despedida. E eu não sei dizer adeus... É só mais uma das coisas que não sei dizer. Assim como não consigo dizer "me perdoe" ou "eu te amo", isso porque pronunciar as palavras mesmo que seja difícil ainda é mais fácil que perdoar ou amar de verdade. E viver uma despedida é mais difícil que dizer adeus. Por isso eu fico apenas olhando as pessoas que amo, uma a uma, me darem as costas e irem em frente, seguindo com suas vidas, seus caminhos, seus amores, e me esquecendo... 

Como uma sinfonia que cresceu e numa apoteose encantou a todos o som dos que me amam vai diminuindo lentamente até sumir, e tornar-se apenas uma recordação distante, uma sombra, do que um dia já foi. 

Somo hoje mais um, a longa lista dos que me deram as costas, dos que eu amei e que acreditei que iriam me amar eternamente. Cumpro mais um dia de minha sentença!