quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Com toda minha alma

Minha mente é minha maior inimiga. Quando eu mais devia me alegrar por perceber que infundadas eram minhas paranoias, por perceber que ao meu redor tem pessoas que me amam e que zelam por mim eu simplesmente fico atônito. 

Atônito por não conseguir crer que eu sou merecedor dessa amizade, de todo esse carinho e atenção quando carinho e atenção eram justamente aquilo que eu queria. E como eu queria! Eram, literalmente, tudo o que mais almejava com toda minha força de alma carente. Tudo o que eu queria era suprir essa patológica necessidade de atenção e, quando isso acontece, me sinto indigno de tudo isso. 

É como se fosse errado aceitar isso, como se estivesse roubando o que era para ser de outra pessoa e não para mim. 

Sabotagem. 

Há algo em mim que não crer ser capaz de nada, que não acredita merecer nada. Há algo em mim que gosta de sentir-se derrotado, no chão lamacento da derrota, chafurdando na imundície da mediocridade. 

Não sei dizer o que é isso, mas é como um demônio, que cresce se alimentando de mim, de minha dor muitas vezes autoinfligida. 

Mas eu não quero esse demônio, eu quero me sentir feliz!

Feliz porque percebi que tenho amigos que me amam de verdade a ponto de discutirem como me ajudar, amigos que se importam, que me querem por perto, que me querem ver como vencedor, amigos que amam e que demonstram esse amor. Eu quero ser feliz porque já tenho tudo aquilo que queria, que almejava com toda a minha alma!

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Indigno

Eu pensei em chama-lo pra conversar. 

Pensei em tentar, mais uma vez, uma aproximação. Mas ao invés de encontrar uma pessoa eu apenas encontrei uma barreira, uma muralha enorme entre eu e ele. E então desisti. Estendi a mão em sua direção e logo a puxei de volta, lenta e pesadamente, com a triste sensação de que, não importa o quanto tente, não consigo fazer ele me olhar. Não consigo fazer ele me notar. Acho que, para ele, sou um estranho entediante e dramático, alguém que não merece a sua atenção. 

Isso faz eu me sentir inferior,
indigno,
não merecedor.

E é horrível me sentir assim.

domingo, 25 de agosto de 2019

No vale da sombra


Dia de batalha, onde uma guerra imensa é travada, dentro do meu coração. De um lado, a responsabilidade de cumprir com aqueles compromissos feitos posteriormente. De outro, a necessidade de me fechar e de ficar sozinho, trancado no fundo de meu quarto e de só sair de lá em um ou dois meses. 

É uma crise que se anuncia.  Há o medo da verdade, o medo de ficar só, a racionalidade já se foi, me deu adeus pela janela do cruzeiro pois dará a volta ao mundo em oitenta dias. Posso sentir, o gosto de sangue em minha boca, a aura. Minha única arma é apelar para os remédios que prometem me manter de pé quando o ímpeto de meu ser é deitar no chão e chorar. 

A novidade? Não há liberdade nesta existência. Sou sempre cativo, de minhas crises ou das drogas que me mantenham longe delas. Não seria isto também claramente uma crise? Mas eu preciso de um remédio que me deixe ruim, mas de pé, do que ficar em casa cortando os pulsos e chorando por imaginar uma porção de cenários dantescos e apocalípticos para meu futuro.

Entrar em uma crise forte é dez vezes mais rápido do que sair dela. E eu não quero isso, não agora, na verdade não quero nunca mais. Eu não quero aquela ansiedade, aquele medo que aos poucos vai transformando meu coração num recanto de pavor, como se a qualquer momento eu fosse explodir completamente. Eu não quero aquela dor esmagadora sob meu peito novamente. 

Me resta deitar e fechar os olhos, enquanto espero os benzodiazepínicos fazerem algum efeito, para que, de alguma maneira, eu ainda consiga ser eu mesmo a noite, para que eu consiga ser eu mesmo quando precisar passar pelo vale da sombra da morte eu talvez consiga sobreviver.

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Capitão

Ó Capitão! meu Capitão! Finda é a temível jornada,
Vencida cada tormenta, a busca foi laureada.
O porto é ali, os sinos ouvi, exulta o povo inteiro,
Com o olhar na quilha estanque do vaso ousado e austero.
Mas ó coração, coração!
O sangue mancha o navio,
No convés, meu Capitão
Vai caído, morto e frio.

Ó Capitão! meu Capitão! Ergue-te ao dobre dos sinos;
Por ti se agita o pendão e os clarins tocam teus hinos.
Por ti buquês, guirlandas... Multidões as praias lotam,
Teu nome é o que elas clamam; para ti os olhos voltam,
Capitão, querido pai,
Dormes no braço macio...
É meu sonho que ao convés
Vais caído, morto e frio.

Ah! meu Capitão não fala, foi do lábio o sopro expulso,
Meu calor meu pai não sente, já não tem vontade ou pulso.
Da nau ancorada e ilesa, a jornada é concluída.
E lá vem ela em triunfo da viagem antes temida.
Povo, exulta! Sino, dobra!
Mas meu passo é tão sombrio...
No convés meu Capitão
Vai caído, morto e frio.

Walt Whitman

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Elogios

Oh quantos elogios a beleza! Quantas palavras ditas em honra de tão grande soberana de minha vida! Cada gota de sangue de meu corpo insufla minhas células com amor, e o amor só pode existir em sintonia com a beleza que o expressa. Seja um sorriso, uma palavra ou uma imagem bela, o amor se expressa no belo e o belo inebria a alma por meio dos sentidos. Uma vez preso não se pode mais fugir dele, do amor. 

E este sangue que há em meu coração e que percorre cada canto de meu ser, esse sangue colérico, apaixonado, rubro como o fogo, esse sangue faz meu eu pulsar em êxtase pela beleza ínfima de uma singeleza infinitesimal. Eis o meu dom: encontrar a beleza em toda dor! 

Ver beleza naquilo que os outros ignoram, encontrar a beleza perfeita na criatura mais menosprezada da terra. É ver a beleza de um universo inteiro numa pequena folha que rodopia ao sol sob o beijo delicado do vento. É ser tocado por essa brisa leve que acaricia meu cabelo e ficar contente por imaginar que talvez essa mesma brisa leve para ele as minhas carícias.  

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Pelo belo

Tenho apreço pelo Belo.

A beleza me seduz, 
me hipnotiza, 
me atrai como polo magnético. 

A beleza me encanta o olhar, 
me penetra a alma, 
me abarca o coração. 

A beleza é meu maior risco, 
me faz perder a razão, 
a beleza me prende a emoção.

E eu, 
pobre homem encantado pela beleza
me vejo outra vez apaixonado

Por um corpo forte e bronzeado,
por um não sei quê
que balbucia meu nome desconcertado

Pelo olhar perdido,
pelo cabelo preto e bagunçado
pela fala mansa e inexperiente

E eu fico desconcertado, 
sorrindo abobalhado
apaixonado!

Como não se apaixonar?
Como não se deixar levar?
Como resistir?

A tão brava postura
a tão delicada doçura
a tão forte cerviz?

Isso é culpa do meu apreço pelo Belo.

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Unilateralmente

Preso numa vida unilateral, uma vida de doação onde me entrego muito mais do que recebo. Uma doação generosa, é verdade, mas também uma doação parasitária, que me suga sempre mais e mais, até não sobrar nada. Exigem de mim compreensão, firmeza, alegria. Exigem que dê o máximo de mim. Mas eu termino sempre sozinho, sempre em busca de algo superior, e ninguém entende essa busca, ninguém entende esse meu desejo, que surge no âmago do meu coração. Todos riem-se de mim. Todos riem do meu sonho de conhecer, de me deixar levar pelo belo, bom e justo. Eu não sou mais do que uma piada para os outros por buscar a verdade. 

Mas que há de bom em estar ajustado numa sociedade onde todos já se esqueceram do que realmente importa? Perderam completamente o senso de importância e, com isso, perderam-se a si mesmos no caminho. Não passam de vagantes, tão perdidos quanto eu mas que, ao contrário de mim, sequer sabem que buscam alguma coisa. 

Essa busca pela Verdade para preencher o vazio, aquela imperfeição fundamental, é o que move o homem em sua existência. É a admiração de que falava Aristóteles, que é capaz de fazer a alma humana desejar conhecer. E é essa admiração que faz o homem desejar que ele deve encontrar no outro e, dessa maneira, encontrar pessoas que queiram e rejeitem as mesmas coisas.

Assim deve ser. 

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Bagunça

Sinto-me tomado por uma poderosa e debilitante melancolia. Sinto-me preso, atado a pesadas correntes que pesam meus pés e não me deixam sair. Olho pela janela e tudo que vejo são as folhas escuras e o céu cinza, triste, também ele está melancólico.

Tenho estado com tanto sono, e tenho andado tão cansado. Mas eu não tenho feito nada. Isso tem acabado comigo. É como se estivesse sem conseguir dormir, mesmo dormindo bem todas as noites, acordo ainda mais cansado. Exausto, na verdade. E sigo o dia todo com sono, cansado demais sequer para comer ou responder aos outros.

Tomado por um desânimo estarrecedor eu fico sentando, de boca aberta, olhando para o teto como se nele houvesse algum mistério encantador. Mas a verdade é que meus olhos já não vêem nada de encantador. Tudo é cinza assim, sem graça, sei lá... 

Em alguns dias eu me sinto enérgico, consigo arrumar o meu quarto, por exemplo, e cuidar de mim mesmo. Lavar o cabelo, tomar um bom banho, passar perfume... Outras vezes eu apenas luto para continuar respirando. Tudo se torna um caos absoluto, e nada mais faz o menor sentido. Parece que a bagunça no meu quarto vai se acumulando, assim como na minha cabeça. Tem dias que eu arrumo tudo, e olhar o quarto todo arrumadinho, a colcha estendida, as roupas dobradas e a janela aberta me traz a sensação de estar bem, realizado. Mas as vezes está tudo uma bagunça, tudo jogado de qualquer jeito, e me sinto assim também.

Não sei se é o quarto que reflete a bagunça que há em mim ou se é o contrário, só sei que, às vezes, fica tudo bem e, às vezes, está tudo uma bagunça aqui dentro. 

sábado, 17 de agosto de 2019

Opróbrio

"Tornei-me objeto de opróbrio para todos os inimigos, zombaria dos vizinhos e pavor dos conhecidos. Fogem de mim os que me vêem na rua. 
Fui esquecido dos corações como um morto, fiquei rejeitado como um vaso partido. 
Sim, eu ouvi o vozerio da multidão; em toda parte, o terror! Conspirando contra mim, tramam como me tirar a vida." 
(Sl 30)

Tenho medo, do meu futuro. Tenho medo, daqueles que me cercam. O mundo se tornou inseguro para um jovem como eu. O pânico social me consome, o horror se alimenta de minha carne, mina minhas forças até o tutano, suga meu ser, quase me leva ao limiar da existência. 

Ele vem a minha casa mas me odeia. Ceia comigo mas trama minha morte na primeira oportunidade. Sinto seu olhar de desprezo em minhas costas, seu toque está cheio de rancor e não sei a razão disto. Como alguém a quem sempre dei o meu melhor pode me detestar tanto? 

O que me tornei? O que será de mim? Serei de fato mais um da estirpe de condenados à cem anos de solidão que não terão uma segunda chance sobre a terra? Todos que eu amo estão decididos a me deixar? Que me restará então? E eu, pobre, que farei, que patrono invocarei quando for deixado só?

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Descoberta

Uma gaita, 
uma voz esganiçada numa técnica estranha, 
um violão triste numa balada que, 
suponho, 
cante o amor ou desamor da vida. 

De repente uma percepção: 
é uma música linda!

Uma música que sequer sei o nome, pois não sei ler tailandês e entendo pouco mais do que um bom dia nesse idioma.  E aqui, nessa tarde triste de céu claro, eu encontro uma razão de ser. Estou aqui pela beleza, por essa beleza que me enche a alma e que me alegra o coração. 

Estou aqui por isso que me dá sentido, 
no belo, 
naquilo que torna o mundo mais bonito. 

É isto! 

Recordare

Recordar é viver. 

Acho que foi justamente por isso que eu busquei esquecer aquele dia. Busquei fingir que não aconteceram aquelas horas de terror. Não queria, de maneira alguma, reviver aquela manhã de pânico onde, não conseguindo controlar meus pensamentos permiti que eles me fizessem cativo, onde transbordei em lágrimas e dor, onde meu coração quase explodiu em desespero. Não queria, não quero, reviver aquele medo.

Mas aconteceu. E não posso fingir que, naquele dia, fui esmagado por um céu cinza, que fui levado ao último estágio do horror, que, mesmo após ser medicado e dormir metade do dia, ainda me sentia derrotado, sem ânimo e nenhuma energia para dar um passo sequer. Não conseguia falar, senão que respondia a todos com gemidos inefáveis, nem mesmo eu entendia o que queria dizer. Só queria, na verdade, deixar de existir. 

O céu cinza continua pesando sobre mim, neste exato momento eu o observo pelas grades da minha janela. Eu me sinto preso, por elas, aqui. Me sinto preso nesse quarto que, de maneira convidativa parece me chamar ao descanso, mas eu sempre descanso e nunca deixo de estar cansado. É como se o cansaço tivesse se impregnado nos meus ossos até o tutano. 

A lembrança daquele dia me persegue como uma memória distante, mas ele está bem ali, me espreitando, rondando com seus tentáculos gelados, esperando o momento certo de me matar. É assim que me sinto. 

Tenho buscado fugir do que me deixou assim. Fugir de ver que as pessoas ao meu redor querem se livrar de mim. Fugir de perceber que o meu mundo está desmoronando e que eu nada posso fazer para impedir. Fugir de aceitar que, na verdade, o meu fim está próximo. 

Se todos se forem, o que será de mim?

Eu não entendo, qual o significado de tudo isso? Qual a razão para delimitar meu ser nos laços e nas diferenças entre eu e os outros se, no final, todos me deixarão sozinho? 

terça-feira, 13 de agosto de 2019

Nuvens cinzas

O céu está cinza, desde cedo está cinza, triste, vazio. Não mais julgo como sendo reflexo de meu estado. Não, o que eu percebo agora é que eu reflito o que se passa no céu, de alguma maneira. Desde cedo estou cinza, triste e vazio.

Ontem foi um dia difícil. Atordoado pela nuvem de incertezas que paira sobre minha cabeça quanto ao meu futuro eu me vi em desespero, o que me levou à uma crise horrível. Uma das piores de que consigo me lembrar. Meu coração doía, meus pulmões queimavam, eu chorava compulsivamente de horror pela perspectiva da solidão. Acabei no hospital, algumas horas depois, sendo medicado com um antipsicótico. 

Voltei para casa e deitei, na esperança de que, quando acordasse, tudo estivesse melhor e o medo tivesse passado. Mas não passou, continuava ali, a espreita, e continua aqui, sobre minha cabeça como as nuvens cinzas que prenunciam as chuvas.  

Desde então tenho notado o céu cinza, triste. Desde então as piadas não tem mais tanta graça. Desde então eu espero pelo momento em que chegue a hora do juízo final, aquela palavra que será minha sentença de morte, a declaração de que minha existência até aqui não teve nenhum propósito, e como isso seja finalmente libertado para o abraço da morte. 

Uma frente fria vem se aproximando da região. E com ela o fantasma que me ronda se aproxima cada vez mais de meu coração. Ele espera pelo momento certo de me matar. Ele espera para, na próxima crise, dar cabo de minha vida de uma vez por todas. Ele espera para, no fim desta semana, acabar com o que restou daquele que há muito vem torturando com requintes de crueldade. 

sábado, 10 de agosto de 2019

Antítese

Sabe, é tão estranho ser assim... Fiz mais coisas nos dois últimos dias do que havia feito nas últimas semanas inteiras, e ainda me sinto bem com isso. Consegui dar algumas aulas que, modéstia à parte, considero que forame excelentes. Preparei uma missa complicada e cerimoniei, preparei outra ainda mais complicada e me preparo para servir amanhã. Também cuidei do meu corpo, fiz a barba, hidratação no cabelo, limpeza de pele, esfoliação nos lábios. Assisti vários filmes que queria, coloquei algumas séries em dias... Enfim, tantas coisas. 

Nem parece que, no início dessa mesma semana eu nem conseguia levantar da cama pela manhã direito, não fosse apenas pela força da obrigação de trabalhar ou ver pessoas. E pensar que dias atrás eu estava deitado, olhando vagamente para o nada, sem conseguir reter qualquer coisa que fosse. E pensar que, só alguns dias atrás, eu pensava a todo momento em tirar minha própria vida, tomado pela total falta de entusiamo pela minha existência. 

E é estranho perceber isso, que em alguns dias eu consigo sorrir e ir ao shopping comprar coisas bobas pelo simples prazer de testar novos produtos, e em outros dias eu sinto raiva por simplesmente abrir os olhos e perceber que continuo vivo. É uma dualidade complicada, essas forças conflitantes dentro de mim. Não parece comigo. Eu olho no espelho e me vejo, alguns dias me acho muito bonito e em outros, menos. Mas em alguns dias eu não consigo sequer me reconhecer, e é horrível ver um completo estranho imitar seus movimentos num espelho. 

É estranho ser assim. Ver a luz no fim do túnel e outras vezes apenas a escuridão. É estranho ser sol e chuva, numa antítese que nunca termina. 

Flores lá fora


Do alto de uma grande cerejeira em flor uma pequenina pétala se desprende das outras. Flutua leve e graciosamente, aparentemente sem rumo, por aí. Girando, girando, refletindo o sol brilhante com seu rosa pálido. É uma bela imagem. Lentamente ela vai se aproximando do chão, mas não o toca, senão que toca os lábios doces de um jovem que descansava à sombra daquelas árvores. Ele acorda, abrindo os olhos devagarinho e vê a pequena pétala subindo novamente, para desaparecer em meio a tantas outras que ali flutuam. 

Um sorriso doce, um pequeno beijo do mundo que se pintou de rosa e branco. Uma luz que, embora fraca e tímida, se acendeu e iluminou todo o mundo que antes estava dominado pela cinzenta realidade. Lágrimas nascem de seus olhos. Talvez não seja o fim, talvez não seja a hora de desistir. Talvez as flores lá fora estejam dizendo pra continuar. 

Ainda Aqui Sonhando


O mundo explodindo
E eu ainda aqui sonhando
Em ter um amor
O mundo explodindo
E eu ainda aqui sonhando
Sonhando solitário a minha dor
Do fato dado de estar
Inundado por um sonho

Barragens se rompendo
E eu ainda aqui querendo
Aquele amor
As lamas escorrendo
E eu ardendo por um sonho
Um certo cara e o seu calor
Tão displicentemente
Ele entra nos meus sonhos
Sonhos de amor

E ele já não me quer mais
Por que ele entrou assim
No fundo de dentro de mim?

Tanta gente sem amor
E eu pedindo por favor
Pra ele me salvar de mim
E o mundo em chamas por aí
E não será a última vez
Sete bilhões de solidões
Fascismo a todo vapor
Medo, ignorância e dor
E eu sem saber mais de mim
Por que me sinto só assim?
Ele já tem um novo amor
Por que isso dói tanto aqui?
Eu achei que era amor

Fascismo se espalhando
E eu ainda insistindo
Em ser um cantor
Pessoas sendo mortas
E eu ainda aqui com medo
De ser alguém aquém de quem eu sou
De não dar conta de cantar
O canto dos meus sonhos
Cantos de amor

Como se não coubesse em mim
O canto que se pede aqui
Num mundo em pleno desamor
Medo, ignorância e dor
E eu pedindo por favor
Pra ele me salvar de mim
E o mundo em chamas por aí
Fascismo a todo vapor
Ele já tem um novo amor
Por que ele entrou assim
No fundo de dentro de mim?
Sete bilhões de solidões
Tanta gente sem amor
E não será a última vez
Por que me sinto só assim
Eu achei que era amor
Eu achei que era amor

Eu achei

O mundo explodindo
E eu ainda aqui sonhando

(Leo Cavalcanti)

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Socorro

Socorro, alguém me ajude. Alguém consegue me ouvir? Pode me escutar? Por favor alguém me ajude! Eu não sei mais o que fazer, não consigo respirar, minhas costas doem, meus músculos não obedecem. Eu estou com medo, todos estão se afastando de mim, todos estão me dando as costas, todos estão, um a um, indo embora e me abandonando. Eu não quero ficar sozinho, eu não quero mais chorar. Mas eu estou sempre sozinho, eu estou sempre chorando. É patético. Eu não quero mais ser assim. Mas é assim que eu sou, medroso, covarde, sozinho. E de novo eles estão indo embora, de novo todos se vão. E eu fico, sozinho. Nunca é o suficiente. Não importa o quanto me esforce, não importa o quanto lute, não importa o quanto eu me entregue de corpo, mente e alma, nunca é suficiente. Eu nunca sou bom o bastante. Eu nunca mereço um elogio, eu nunca mereço um olhar de compaixão, eu nunca mereço uma mão estendida em ajuda. Eu não mereço nada além da solidão. Esse é meu destino, esse é meu prêmio. Todos estão indo embora e, por mais que eu grite, nenhum deles olha pra trás. Eu estou só, de novo. Sozinho, de pé, na chuva. A silhueta deles some no horizonte, e ainda posso ouvir suas risadas. Eles estão felizes e eu, triste, sozinho. Ficar sozinho me deixa desesperado. Eu não gosto disso. Não gosto do escuro, não gosto do silêncio, não gosto da solidão. Tudo isso é demais pra mim. Minha mente está se desfazendo, eu posso sentir. É como se meu cérebro fosse liquefazendo-se aos poucos. Já não consigo pensar como antes, já não consigo fazer nada tão bem quanto antes. Sinto que estou enlouquecendo, que aos poucos estou desaparecendo. E eu não quero desaparecer. Mas ao mesmo tempo eu quero, preciso desaparecer, porque só assim poderei me livrar dessa dor que me aprisiona aqui. Me sinto acorrentado a esse medo de ficar só, me sinto sufocado e, talvez, a morte seja a única liberdade absoluta para mim. É desesperador olhar ao redor e não ver ninguém, fechar os olhos e ouvir as risadas felizes daqueles que estão melhor sem mim. Minha presença é ruim. Eu sou a causa de tudo que há de errado ao meu redor. Por isso eu tenho de desaparecer. Eu preciso sumir. 

terça-feira, 6 de agosto de 2019

Resposta


Minha mãe me fez, na tarde de hoje, uma pergunta que não soube como responder. O que é tudo isso que eu sinto? Fiquei em silêncio pois a torrente de pensamentos que me sobreveio naquele instante que minha reação não poderia ser outra além de travar, diante de tanta confusão.

Acontece que nos últimos meses, talvez anos, eu venho me sentindo cada vez mais instável, cada vez mais suscetível às mais diversas crises. Tudo isso movido por um medo que me assombra desde o momento em que acordo até a hora de dormir: ficar sozinho! 

Não no sentido físico do termo, apenas, pois gosto particularmente de ficar sozinho, mas no sentido mais amplo, de viver sozinho. Eu olho ao meu redor e percebo que não tenho nenhum vínculo real com quem quer que seja. Não encontro espaço para mim no mundo em que vivo. 

Mesmo na Igreja ou entre meus amigos mais chegados, que frequentam minha casa, ou entre meus próprios parentes. Não sinto que haja um laço que me ligue a nenhum deles, não me sinto parte de nada, embora fisicamente faça parte de tudo isso é como se na verdade não fosse necessário em lugar nenhum. Se não sou necessário, não há razão portanto de estar aqui; e a qualquer sinal de minha dispensabilidade, por assim dizer, eu me sinto angustiado. Me sinto vulnerável as mais diversas situações, apenas um cumprimento diferente ou um olhar estranho que recebo já é o bastante para inundar minha mente de paranoias, e essas paranoias me consomem, todos os dias, a todo momento. Há uma voz dentro de mim que me diz coisas horríveis, que me diz que deveria desaparecer, que deveria morrer por não há motivos para existir! Ninguém precisa de alguém tão patético assim. Essa voz me deixa angustiado, desmotivado. 

E essa angústia cai sobre mim várias vezes ao dia, das mais diversas maneiras. Fico deprimido, agitado, chorando por qualquer motivo. Me descontrolo, gasto demais na tentativa de preencher o vazio do meu peito. As vezes me machuco, e a isso tenho recorrido várias vezes, pois a dor física faz com que a dor do meu peito diminua um pouco. Ver o sangue escorrendo de meus braços é como se, por um breve momento, a dor escorresse de dentro de mim. Outras vezes busco dormir, o dia inteiro se possível, pois o sono me impede de pensar em coisas ruins. Mas nada disso adianta. No dia seguinte as cicatrizes não sangram mais, o acordar traz de volta todos os pensamentos. Levantar a cada manhã é um sofrimento, pois sei que terei de ver novamente muitas pessoas, sendo dispensável para todas elas. 

E sigo assim, com um grande buraco no meu peito, uma sensação de vazio, de inutilidade que nunca passa. Viver pensando assim é exaustivo, nunca consigo descansar de verdade, sempre inseguro, com um medo constante, sempre cansado demais de existir, cansado de viver. Sinto como se fosse um grande desperdício de espaço, sinto vergonha por existir, sinto o constante desejo de desaparecer, pois, se eu sumisse, apenas faria um favor a todos, afinal eu de nada sirvo, eu nada consigo fazer de realmente necessário. Todos são substituíveis mas eu sou absolutamente desnecessário. E por isso, por ser desnecessário, sinto que todos um dia me deixarão sozinho, e esse é meu maior medo, ficar só, um medo que nunca cessa, nunca diminui, nem mesmo quando estou rodeado por uma multidão. 

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Um erro


Quem é você? 
O que veio fazer aqui? 
Como se atreve a entrar em nossos domínios? 

O solo em que estás é solo santo
criado para aqueles que são filhos do criador
você não é um de nós.

Somente pessoas especiais podem estar aqui, 
e você não é especial, 
você nem sequer é humano!

Você é só uma boneca de trapos, 
um fantoche nas mãos daqueles que o manipulam. 

Você é uma desonra por ter aparência humana. 
Você é só um monstro que se faz de humano. 
Você não é um de nós. 

Você é imundo, 
não passa de uma deformidade pecaminosa, 
uma aberração aos olhos de Deus e dos homens, 
que são imagem e semelhança de Deus. 

Você é imagem e semelhança de tudo o que há de ruim e perverso nesse universo renegado, 
você um arremedo de ser humano, 
uma casca vazia, 
um desvairamento do destino que deu à luz uma horrenda criatura. 
É isso que você é!

Por isso não tem direito de estar aqui, 
vá embora! 

Vá para onde ninguém nunca mais tenha de olhar para sua face bestial, 
onde ninguém mais se incomode com sua existência patética e hedionda. 
Vá e não volte nunca mais! 
Morra! 

Sua existência é uma ofensa a todas as criaturas, 
não passa de um aborto, 
uma criação imperfeita, 
um erro. 

Talvez haja um lugar para você no inferno, 
mas longe até mesmo dos demônios mais horrendos,
que um dia foram anjos,
você nunca foi nada!

Você sempre foi um erro!

Todo dia

Tenho impressa em mim a cruel e amarga convicção de que a vida de todos ao meu redor seria melhor sem mim. Essa constatação me corta o coração como uma espada afiada de aço frio e me enrijece a alma. Não há razão de ser, de permanecer. 

E, de repente, as coisas mudam. O céu se enche de uma certa cor, a vida parece adquirir certo brilho e eu até mesmo começo a sorrir um pouco. Mas logo sou jogado novamente às cinzas, onde todo e qualquer aspecto da existência é triste e sem graça. 

E todo os dias é a mesma coisa: me sinto grato e feliz por estar vivo e, minutos depois, amaldiçoo a minha própria existência como a mais desgraçada das vidas por falta de um objetivo, de uma razão de ser, de uma razão para viver. Duas, três vezes. Vou do sorriso às lagrimas de uma hora a outra. 

E todos os dias é a mesma coisa, levantar movido pelos objetivos mais tolos, tornar a dormir na esperança de aproveitar as mais parcas experiências de gozo, viver um dia de cada vez sem, no entanto, ter uma razão real que me faça querer viver cada dia no limite, afinal, cada dia é só mais uma tortura infindável entre pensamentos felizes e tristes que vem e vão a todo momento. 

Vejo nos outros o sorriso, o olhar, parecem que, ou não estão conscientes da entropia que os rodeia ou realmente possuem uma razão para viver, e vejo que, no meu lugar, uma pessoa sem razão para viver, de fato não contribui com nada, por isso a cruel, amarga e esmagadora convicção de que a vida de todos ao meu redor seria melhor sem mim. E todos os dias, a cada dia, essa convicção se torna mais e mais profunda, marcada a ferro e fogo no meu peito e na minha alma. 

domingo, 4 de agosto de 2019

Almofadas e flores silvestres

Os meus parentes vão chegando, aos pares, todos cumprimentando, sorrindo e brincando. Nem parece que há alguns meses atrás trocavam indiretas nas redes sociais e discutiam o destino de algumas poucas terras da família que deveriam ser divididas. Vão chegando, e a conversa vai aumentando. Desde cedo o barulho não cessou por um minuto sequer. Até nesse momento eu me escondo no fundo do meu quarto, abafando com música os ruídos incômodos que vem de lá de fora. 

O ambiente está preparado. As almofadas nos divãs de madeira improvisados e as flores silvestres espalhadas pela garagem, a decoração country ficou muito bonita. É o aniversário da minha irmã, a caçula da família, que ontem completou 16 anos. Hoje é dia de fazer vista grossa a todas as atrocidades que ela cometeu. Fingimos que ela nunca fugiu de casa numa atitude absolutamente irresponsável por influência de uma amiguinha de caráter duvidável. Fingimos que ela não abandonou a escola alguns meses atrás por simplesmente não se sentir mais com vontade de estudar e por achar que isso não dá futuro algum, claro, aos 16 anos ainda está no 8° ano do Fundamental II. Mas hoje nada disso importa, o que importa é celebrar a vida! Celebrar a vida de respostas atravessadas, de dramas, de atitudes grosseiras e estúpidas, uma vida de escolhas tortas que todos acham bonitinho. 

O som já começa a aumentar o volume. Mais barulho. Desde ontem o barulho tem me incomodado mais do que o normal. Parece que ninguém mais se incomoda. Acho que, como já tem barulho demais dentro de mim o excesso de ruído aqui fora se torna um pouco demais. A música é ruim, a batida é repetitiva e a letra é, digamos, pueril, na melhor das hipóteses. Não é como se esperasse uma Edith Piaf num evento como esse mas, a banalidade da cultura consumida ao meu redor é deprimente. 

Compramos uma porção de bebidas, mas não sei se quero beber. Não tem dado muito certo. Beber desperta em mim algumas coisas que tenho lutado para mantem quietas dentro do meu peito. Por um lado eu desejo um momento de liberdade, talvez? Por outro eu tenho medo do que possa sair dali... 

O borborinho das conversas, a música alta e ruim, a iluminação exagerada, as risadas estridentes, as banalidades ditas, as bebidas infindas como se no fundo de alguma garrafa estivesse o sentido da vida. Tudo me parece vazio demais, depressivo demais. E o que eu posso fazer, se sou obrigado a sair do quarto e forçar uma máscara de sorriso sendo que, neste momento, meu maior desejo seja correr para um quarto escuro e silencioso, onde possa dormir tranquilamente sob o efeito do benzodiazepínico que desde cedo corre em minhas veias?

Sabe, não quero ir pra lá, para o barulho, para as conversas fúteis. Não quero esse tipo de relação, por mais banal e fugaz que seja. Quero fugir dessas banalidades, quero a permanência, quero a verdade. Não quero a embriaguez de uma noite ou duas, não quero a risada de algumas piadas bobas. Eu quero a profundidade dos mistérios da consciência humana, eu quero o tudo e o nada, quero compreender a imperfeição fundamental que há no coração do homem assustando a sociedade desde nosso primeiro pensamento.

Desejo a fuga. Fugir daqui, para o silêncio, a tranquilidade que me permite pensar. Fugir para a tranquilidade que se contrapõe ao caos de onde estou, todos falando, rindo e preocupados com suas relações fúteis e banais. É tudo muito superficial, tudo passageiro, tudo bobo. Não há nada ali que valha a pena lutar, conhecer, compreender. É frustrante e deprimente.

"A única coisa que nos consola das nossas misérias é o divertimento e, contudo, ele é a maior de nossas misérias." 
(Pascal)

sábado, 3 de agosto de 2019

Refúgios e lugares

Tomado de súbito pelo medo, como um animalzinho assustado pela novidade da movimentação ao meu redor. Novas e numerosas vozes, barulhos de utensílios culinários, conversas desconexas, risadaria, alfinetadas de família... Tudo isso me causa medo. Medo do barulho, da bagunça, do caos que ameaça o singelo e delicado equilíbrio que há entre as coisas ao meu redor. 

Busco refúgio, em meu próprio quarto escuro, em meu próprio coração. Talvez aqui possa conseguir o silêncio que me dê a segurança de estar longe de toda aquela confusão.

A receita de gelatina não foi suficiente. O bolo ficou lindo porém muito grande, as bebidas ainda não estão geladas, a decoração ainda nem começou a ser feita. E eu nada posso fazer além de observar, catatônico, tudo o que fazem. Estou paralisado ante todo esse movimento, estou em pânico vendo tudo o que está sendo feito e sem poder contribuir, porque meu medo do outro me impede. 

Mas, ao mesmo tempo em que sinto medo do outro, sinto a necessidade de estar com o outro, para suprir esse vazio esmagador que há no meu peito. Mas, ao buscar o outro, a presença dele me sufoca, me agride, me oprime de tal maneira a ponto de me fazer desejar novamente o silêncio da solidão, continuando então com esse ciclo interminável, dessa dicotomia entre estar presente, entre ser parte de algo, e estar longe não sendo partícipe de nada, não tenho relevância num plano social imediato e nem num plano superior. 

É complicado, olhar para dentro de si mesmo e não entender qual seu papel, qual sua missão. É complicado realizar coisas e mais coisas sem com isso enxergar um objetivo maior,  algo que transcenda a experiência imediata, algo que não seja para hoje ou amanhã, mas que se marque na eternidade. É complicado, olhar a multidão em polvorosa, em sua correria, e não saber qual meu lugar diante de tantas posições possíveis e mais, não saber qual meu lugar diante de mim mesmo e de minha alma individual, aquela que se apresentará diante de Deus gemendo prostrado pelo peso de meus pecados. 

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

A estranheza de um pensar

É estranho ser assim, pensativo demais enquanto tudo ao redor continua igual. É estranho, pensar em mundos distantes, galáxias longínquas, enquanto escuta os seus amigos rirem ao seu lado. É estranho pensar... 

Pensar, sobre estar ou não presente. Pensar em sentir-me parte de alguma coisa, mas não completamente. É estar com um pé dentro e outro fora. É sentir-me não de todo humano, mas em certa parte tão estranho que não me atrevo a dizer de que outra metade é. Sentir-me não de todo amado, não de todo bem vindo, não de todo bom. 

Ao ouvir uma só frase minha mente dá duas voltas inteiras ao redor do sol, vou no passado distante e traço uma reta até um futuro incerto, caminhando por estradas já conhecidas e ligando pontos que até então tinham passado desapercebidos. É estar com os amigos, cantando um sertanejo ou um pop rock brega, seja Raul ou Victor e Léo, cantando com o coração e a pouca voz que me resta e me sentir bem com isso, numa completude diferente, mas tudo isso cessa com o soar da derradeira nota, e me sinto novamente no limbo solitário da minha própria mente, que dá dez voltas completas ao ouvir um cumprimento, e meu coração compõe dez poesias enquanto sinto o calor de um abraço. E então o calor desse abraço se dissipa, e nada mais faz sentido, me sinto sozinho pensando sobre um mundo distante que não conheço totalmente. E o calor retorna, fazendo brilhar a escuridão. E o ciclo eterno se mantém. 

E eu continuo me maltratando por pensar... Pensar, sobre estar ou não presente. Pensar em sentir-me parte de alguma coisa, mas não completamente. É estar com um pé dentro e outro fora. É sentir-me não de todo humano, mas em certa parte tão estranho que não me atrevo a dizer de que outra metade é. Sentir-me não de todo amado, não de todo bem vindo, não de todo bom. Não de todo necessário. 

quinta-feira, 1 de agosto de 2019

O chamado da beleza

Tenho pensado num perigo que, aos poucos, se aproxima de mim. Um perigo que está em me abrir demais, em me expressar demais, em ser e sentir com intensidade demais. Há um perigo, um preço a se pagar por ser assim. Claro, o salário do pecado é a morte, e a loucura é a paga devida pelos meus desvarios, mas não posso arriscar assim. 

Acontece que a beleza me chama. A beleza intocada, daquele fonte lacrada num jardim fechado. Ela chama e minha alma por ela clama. Sou um homem do belo e a beleza tem, sobre mim, seu controle. Ela me hipnotiza e me priva de toda racionalidade. A beleza me embriaga, me seduz com seu tom de bronze, com seus músculos torneados, com seu sorriso tímido escondido atrás de sua verdadeira personalidade. A beleza encanta com seu olhar perdido, de quem ainda não sabe o que quer. A beleza seduz, com sua força majestosa. A beleza é o Apolo, o senhor do sol que, com sua carruagem penetra o mundo com sua luz. Se voar perto demais dele, vai se queimar. 

Assim é o risco que corro, de me queimar por voar perto demais do sol. Mas o que fazer, se o sol me atra magneticamente para si? Como fugir da luz do sol que aquece meu coração enrijecido pelo ar frio de meu passado? Não há como resistir, mas é preciso, do contrário minhas asas derreterão e serei lançado, mais uma vez, contra o chão frio do horror. Devo ter medo do amor? Depois de tantos horrores nas mãos da paixão eu devo dizer que o deus do amor é tão assustador quanto o deus da guerra, e quanto mais o será ao lado do deus que a todo mundo abrasa com seu calor?