quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

Desprazer

Pois bem, por onde devo começar? Alguns dias sem escrever me dão a impressão de que perdi uma habilidade há muito adquirida com custos, como um hábito que demorou anos para se formar, mas que se perdeu com uma reviravolta que me fez esquecer o que fazia constantemente e apaixonadamente.

Não é o caso, de qualquer forma, já que não tenho feito uso da escrita por motivos que transcendem até mesmo minha própria capacidade de expressá-los por meio da mesma. O fato é que tenho sido acometido por uma grave enfermidade: a falta de vontade, ou como prefiro chamar: preguiça existencial.

Sabe quando o simples trabalho de respirar ou fechar os olhos para dormir torna-se um fardo pesado demais para carregar? Minha mente tem lidado com o peso que é simplesmente existir, ainda que seja vegetando por sobre uma cama sem fazer nada de útil ao meu país.

Me mudei recentemente, para um bairro que fica no lado oposto da cidade, e mesmo sabendo que deveria me ocupar em organizar as coisas que por si já estão caóticas, eu simplesmente venho procrastinando. Eu vejo as coisas bagunçadas e jogadas de qualquer jeito, e não consigo reunir o mínimo de força para fazer nada. Poderia dizer que me sinto assim por conta do cansaço físico e da fadiga que o esforço da mudança exige, mas não tenho feito nada para me cansar de fato. Até mesmo os compromissos da Igreja eu tenho cumprido apenas pela formalidade social de não abandonar algo que comecei, mas o faço no modo automático. Não tenho encontrado prazer sequer nas coisas que antes me faziam sorrir: gastei horrores em maquiagens que há dias não uso nem em ocasiões que normalmente o faria, não tenho me empolgado com as músicas novas que me aparecem, e nem com as pessoas ao meu redor. Com efeito, a exceção de meus amigos mais próximos da banda, não tenho nenhum contato com as outras pessoas além do estritamente necessário...

Acho que estou passando por uma fase difícil. Parece muito um período de interiorização, e bem que poderia sê-lo, mas o fato é que quando fecho os olhos, não me vem nada a mente, senão que figo vagando por lugares distantes, aleatórios até adormecer e acordar novamente com o mesmo sentimento de vazio com que fui dormir.

Daí chamar essa enfermidade de preguiça existencial. Experimento uma sensação insípida de não desejar nada. De não saber o que querer, de deixar as coisas fluírem da forma que quiserem, sem que tenha de controlá-las para seguirem o caminho que espero, porque não espero nada.

Não tenho sentido mais a necessidade sequer de prender algumas pessoas em minha vida, senão que tenho percebido que seria bem melhor se de fato se afastassem de mim. Querem ir? Que partam logo! Querem ficar juntos? Que fiquem, e que sejam felizes no inferno bem longe de mim!

Mas eu sei que não deveria ser assim, sei que não deveria ter se apagado em mim a chama, o gosto, pela vida. Mas olhando com cuidado dentro de meu peito eu não vejo mais uma centelha de vida, senão que vejo um abismo, onde minha voz já não reverbera mais pelos paredões de rocha fria, pois já não grito e nem choro, apenas fico ali, contemplando o abismo, enquanto ele também olha para mim.

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