Hoje foi um daqueles dias meio, sei lá. A primavera já vem dando seu ar, mais quente do que eu gostaria. Dormi a maior parte do dia, na verdade, acordei sem nem lembrar quando foi que adormeci. Mais por tédio do que por qualquer outra razão. Ando um pouco irritado.
Vejo ódio nos olhares de algumas pessoas e sinto um profundo desprezo nelas. Eu também espero o pior de todos, mas, às vezes, vejo que ao fazer isso, alguns usam isso como desculpa para serem elas o pior possível. Sei bem dos meus defeitos, mais do que qualquer outro, mas isso não significa que me orgulhe deles. Pelo contrário, sei que a minha situação hoje é, por vezes, consequência desses mesmos erros movidos pelos defeitos mais arraigados na minha alma. De tal modo que, reconhecendo a baixeza do meu espírito, ainda que não veja no outro nenhuma razão para isso, vejo na minha capacidade, natural que todos os homens por definição também possuem, me fazem querer elevar-me, ainda que apenas um pouco. Eu sei que sou ruim, mas não quero ser. E ver que as pessoas usam a desculpa de que, como todos são ruins, posso supor e querer desejar ser ainda pior, de uma baixeza atroz.
Parece que travei. É aquele momento Adélia Prado uma vez mais: olho para uma pedra e vejo isso mesmo. Também olho um canteiro de flores e só penso em como elas poderiam me dar alergia. Nada de especial há nisso, só o tédio absoluto o ser.
É mais uma sexta de solidão, com algumas mensagens bobas, mas que me explicam a razão de estar sozinho esta noite. Talvez seja a pressão para que hoje seja um dia para sair e ficar com os amigos. Mas para isso é necessário tê-los. Meus amigos serão os personagens das séries de hoje.
Aquelas pessoas do mundo real são apenas incômodos. Sim, incômodos. Não quero mais ir a nenhum dos compromissos do fim de semana. De novo essa sensação amarga da ingratidão. Os homens são realmente criaturas irritantes. Seus discursos e valores valem apenas até aparecer uma menina bonita. Malditos, todos eles. Maldita raça humana. Estirpe desgraçada pelo desejo.
Acho que tanto pedi a mim que não mais amasse, que toda e qualquer sombra de uma alegria provocada por esse sentimento se desfez completamente. Sinto apenas que restou em meu peito os pedaços quebrados de um coração, como uma peça de cerâmica quase reduzida a pó.
Talvez tenha pedido tanto para não amar que hoje me foi tirado todo o amor.
Não só com relação ao mundo ao meu redor, mas também ao meu coração. Fechei os olhos sentindo o aroma do chá que fiz, a imagem dele veio a minha mente, tudo que senti foi uma leve tristeza, sutil como a fumaça que levantava da xícara, e desaparecendo no ar lentamente. Algo de uma aceitação. Embora soubesse que, se naquele momento colocasse o chá na boca me queimaria, fiquei esperando que ficasse morno. A imagem dele foi desaparecendo.
As palavras que queria dizer a ele aos poucos se perderam no ar. Restou-me apenas o calor da xícara em minhas mãos, a fumaça pouco a pouco cessou. Ele dormiu sem nem se lembrar de mim. O chá estava frio.
"No primeiro dia pensei em me matar. No segundo, em virar padre. No terceiro, em beber até cair. No quarto, pensei em escrever uma carta para Marcela. No quinto, comecei a pensar na Europa e no sexto comecei a sonhar com as noites em Lisboa. Em seis dias Deus fez o mundo e eu refiz o meu." (José Roberto Torero)

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