sábado, 3 de julho de 2021

Ideias que se esvaem

Odeio quando as ideias demoram a ser transportadas para as palavras e acabam se esvaindo da minha mente como fumaça. Parece-me que até mesmo no mundo das ideias as coisas dão errado para mim. Parece que meu mundo das ideias perfeitas e imutáveis não são tão imutáveis assim e são tão palpáveis quanto a água, podendo ser destrutivas quanto um tsunami implacável mas ainda assim impossível de se pegar com as mãos. 

É por essas, e outras, que eu vejo o mundo ao meu redor com impassível pessimismo. É por essas e outras que eu não consigo ver as coisas dando certo, é por isso que numa pequena plataforma fixa eu vejo um mundo de permanente caos, onde todas as coisas conspiram contra, senão o homem, pelo menos a mim. É quando o mundo mostra suas garras de aço, afiadas como espadas prestes a transpassar o alma e rasgar o coração com a mesma facilidade com que rasgaria uma folha. É o mundo onde mesmo quando se faz algo certo, quando se denuncia o que há de errado no mundo, o mundo se volta contra você, o mundo faz você pensar que o errado está em querer ser certo. 

E o erro se encontra em toda parte, assim como o bem mas, ao contrário do bem, o erro não é difícil de se encontrar, o erro, a mentira, eles sempre se apresentam com clareza ao homem, como se fosse a melhor e primeira opção. O bem, por outro lado, é sempre complexo, sempre se esconde por várias camadas de erros, é difícil de desvendar e, mesmo assim, acaba por ter consequências complexas. 

Odeio quando a forma das minhas ideias se perdem, deixando em mim a forte impressão de que é tudo assim tão frágil, vazio e sem contorno. Mas é tudo assim. E olho o mundo com o ceticismo de quem já não crê mais no amor, na esperança, na bondade, na caridade... Já não creio que alguma coisa possa dar certo para mim, não creio que exista beleza em alguma verdade, é tudo cruel, tudo feio, tudo horrendo e assustador. 

Como poderia ser de outra forma? A alegria que estampa as redes sociais é apenas uma ilusão, é apenas uma fuga da realidade maléfica que faz o homem ser nada mais do que o mais miserável dos seres. Como poderia ser de outra forma? O amor é apenas um mentira contada para os homens, é apenas algo em que eles se apegam acreditando ser a razão pela qual lutam ou vivem, mas é apenas e nada mais do que mentira. E há como melhorar? Não, tudo apenas piora, tudo cada vez decai e para onde quer que olhe só há sujeira e decaimento. 

E assim as ideias se esvaem, se perdem como areia no vento, e o mundo continua mergulhado no caos, continua repleto de dor, sofrimento, de crueldade, desamor, desesperança, o horror crescente que a tudo domina até que me perca num oceano de escuridão... 

X

É desapontador, ter vontade fazer algo simples e ainda assim não ter forças pra levantar o braço. É triste não conseguir manter uma conversa, não ter ânimo pra dizer nada e dificuldade pra ouvir e entender. As pessoas falam e eu logo me perco nas palavras, num mundo de fumaça, viajo num torpor e com dor sou arrancado de lá e colocado de volta na fria realidade. Algo consome meu vigor, algo me suga... 

Eu só queria fazer uma maquiagem simples, me livrar dos pelos grosseiros no meu rosto e deixar mais limpo, mas não consegui. Me sentei na frente do espelho e não consegui, de repente um cansaço se abateu como se tivesse corrido duas maratonas inteiras, e cada fibra do meu corpo implorou para que voltasse a dormir. E dormindo eu achei que poderia acordar mais desperto, o que foi um erro, pois agora desperto e me encontro na mesma situação, ainda cansado de uma corrida que não participei. 

Continuo a navegar na internet, e ver tantas pessoas bonitas, tantos sorrisos, tantas peles perfeitas, cabelos lisos, tudo isso me faz a vontade de ficar assim também, mas dada a impossibilidade física da depressão que não me deixa sair da cama bem como a impossibilidade da forma mesma das coisas, sou tomado de mais e mais tristeza, uma decepção que, se é que se pode chamar assim porque eu não esperava muito de mim, mas um sentimento de completa incapacidade. A dor da insuficiência ocupa o espaço deixado pelas ideias que se foram ontem, hoje eu já não sou mais apenas vazio, sou também um saco cheio de coisas inúteis, esperando o dia que alguém terá o bom senso de me jogar fora, ou de me atear fogo, e não apenas se afastar... 

E assim as ideias se esvaem, se perdem como areia no vento, e o mundo continua mergulhado no caos, continua repleto de dor, sofrimento, de crueldade, desamor, desesperança, e a lembrança do horror da noite passada... 

X

Novamente uma onda de desânimo avança sobre mim, me impedindo de respirar, me fazendo afundar, levando-me para o mais profundo dos oceanos, como se o próprio oceano em braço titânico me levasse para seus abismos, como se os tentáculos gelados da morte levemente rodeassem a minha mente, meu corpo e meu ser...

O que fica em mim, já que a depressão parece ter levado tudo o que um dia eu tive de valioso, é apenas uma sensação amarga de um grande vazio, de uma insuficiência total, e uma voz repete continuamente em minha cabeça que eu falhei, falhei em absolutamente tudo o que tentei, falhei em ser eu mesmo, a única coisa dentre todas as coisas que eu deveria ser, falhei em em me encontrar e agora me encontro como uma bolha navegando no imenso ápeiron, num oceano desconhecido.

Me sinto como se não devesse existir, e não dormindo, sendo forçado a contemplar acordado essa mediocridade eu me sinto cada vez mais horrorizado com o fato de que, não sabendo o que devo ser, eu continuo sofrendo por ser, e ser é justamente aquilo que eu menos queria ser. E eu não queria ver ninguém, encontrando nessa existência miserável uma glória mínima em não acompanhar ninguém. Mas nem isso me posso ser senão que estou rodeado de pessoas, e ainda assim me sentindo só. 

Queria então desaparecer, como farrapo ao vento, como areia que se perde na praia, queria sumir como uma única gota se perde na imensidão azul. Mas o ser me obriga a ser, e me impede até mesmo de dormir onde posso esquecer que sou, onde não sendo sou mais feliz, e não sendo esqueço do incômodo que é ser eu mesmo, mesmo sem ser, mesmo sem querer. 

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