quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Viver segundo a Natureza

Maybe they just don't give a damn...

Já há algumas semanas que ele nem sequer olhar para, mas eu sei que ele me reconhece. Parece que mais uma vez eu fui rejeitado antes mesmo de demonstrar que poderia fazer bem a ele. Por várias vezes ele passou sério, em sua túnica branca, e nem pareceu perceber minha existência, quanto durante toda a celebração o meu olhar se fixava no dele.

Eu não quero mais fazer as coisas para agradar aos outros e passar uma imagem feliz ou bem sucedida. Eles não dão a mínima. Se tem algo que eu aprendi com anos de depressão e meses de relativo sucesso após a mudança é que eles não dão a mínima, ninguém tá nem ai realmente pro fato de você estar bem ou não. 

Por isso eu quero fazer o que quiser, quero ficar na sacada ouvindo música e tomando um vinho barato enquanto vejo as nuvens passarem pela lua, quero continuar vendo meus BLs e sorrindo com os belos casais de meninos tailandeses, quero chorar de vez em quando com alguma coisa emocionante, tomar café e tirar umas fotos legais... Quero estudar e tentar entender um pouco da situação ao meu redor, do mundo em que vivo e das pessoas que fazem as coisas serem como elas são. Eu só quero isso. E o mais que faço não vale nada.

Também quero me envergonhar das minhas ações ao ver que tenho sido apenas um animal atrás de satisfazer vontades baixas e mesquinhas, de ver que quero poluir a pureza com minhas próprias mãos, que eu tenho sido causa de queda para aqueles que eu deveria erguer, e tudo isso por culpa das minhas paixões desordenadas, do meu impulso incoercível para tudo aquilo que é baixo, vazio e fechado em si mesmo. 

Sou um homem cego pelas minhas paixões e pelos meus vícios. Alguém que, como um poste de luz, não consegue trilhar o caminho que indica. Vivo de modo desregrado, aspirando a malícia e a luxúria sem limites, espargindo os clarões do fogo que arde minha carne e consome minha fibra até as cinzas. Me envergonho profundamente dos pensamentos imundos e torpes com as pessoas mais claras e puras que, muito diferente de mim, lutam para melhorar e vencer seus ímpetos demoníacos. 

Quero me envergonhar de minhas ações porque meu julgamento não decorre de outros homens, mas de um juiz eterno.

Oh que existência baixa e vazia aquela que não aspira nada superior e continua como serpente a rastejar o ventre pela terra e a morder o calcanhar da alva criatura. Não olha aos céus e não tenta alçar voo como a águia que, do alto, a tudo vigia. Águia não sou e dela não trago nem sequer o olhar. Estremeço com as coisas que nós percebemos e que não dizemos justamente por medo de torná-las reais. 

Por fim deixo um trecho referente justamente ao que não tenho vivido, que consegue descrever com mais eficiência do que eu, a essa experiência de baixeza moral e espiritual:

"Agostinho também retoma a ideia de uma transgressão da natureza própria como critério do mal. Ser virtuoso e conduzir uma vida exitosa significa para ele, tanto quanto para Platão e os estoicos, viver segundo a natureza (secundum naturam vivere). Ele, no entanto, fundamenta a determinação da natureza do homem, por exemplo como ser vivo racional, pela noção da condição de criatura. Fundamentalmente, a natureza do homem consiste em ser criado por Deus. O homem que reconhece isso vive segundo a natureza. Ele concebe Deus como sumo bem e se torna feliz na obtenção desse bem. Em contrapartida, o homem que deseja ser como Deus e, em conformidade com isso, procura a quietude e a felicidade em si mesmo cai numa contradição com sua própria essência, que provoca desordem da alma, conduz a equívocos a respeito da verdadeira hierarquia dos bens e, por fim, à infelicidade." (Johannes Brachtendorf – Confissões de Agostinho p.81)

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