sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Busca

Preciso encontrar algo que me traga alguma certa alegria. Os dias têm estado todos muito cinzas, e não no bom sentido. Mas, parece que depois do fim de Your Sky não venho tendo vontade de ver muita coisa. E sei que a culpa não é da qualidade das produções. 

Sei também que é um pouco dos resquícios do trabalho, quando eu só podia rever séries mais curtas. Talvez por isso esteja relutante em me aprofundar de novo em coisas mais sérias, talvez eu deva começar por aqui. Por exemplo, em se tratando de profundidade narrativa, pensei logo de cara em 180 Degree Longitude Passes through Us, talvez o ápice do roteiro nesse meio BL. Talvez exija um esforço. Eu sei, mas é necessário recuperar o brilho mesmo tendo recursos limitados. 

A série trata de elementos complexos. Embora diferentes, também lido com os meus, especialmente aquele limitador, que nos faz ficar paralisados ente verdades, sozinhos, isolados, sem criar pontes. Talvez eu deva pensar quais as pontes eu preciso construir e quais muros derrubar. O que é estranho, pois, para alguém sempre aberto, me ver hoje querendo ficar distante de todos, é complicado.

Outra opção é uma série maior, mas de qualidade intelectual bem inferior, mas que, no entanto, conta com a presença de um dos meus atores favoritos, Mick Monthon, em seu primeiro trabalho, fofo, ingênuo e meigo. 

Por fim, também quero rever Twelve Kingdoms, que há muito eu revi, com a história de uma colegial que, indo parar num estranho mundo, acaba por descobrir que é uma rainha e que deve lutar por seu lugar ao trono para trazer justiça ao seu povo.

Isso mostra minha alma clamando pela fecundidade das histórias. Cântaro vazio, eu desejo ser preenchido das possibilidades humanas. Esvaziado, eu quero ser de novo cheio daquilo que nos torna homens: "litterae, arma et sapientes homines." E sei que são as únicas coisas que podem me despertar de novo algum interesse.

Percebi, depois de uma inesperada longa conversa com um amigo distante, que preciso priorizar esse tempo para diminuir o ritmo. Se antes eu não estava aproveitando mais nada, era porque meu corpo, e mente, estavam sempre em estado de alerta, sempre precisando apagar algum incêndio, o tempo todo. Agora esse tempo serve para que, uma vez retornando meu corpo a outro clima, eu possa, depois, reorganizar de modo a recomeçar de um modo mais saudável. Por isso eu estava sempre cansado, por mais que dormisse, por isso meu sono era leve e inquieto. 

Preciso justamente de momentos como esses: escrever na sacada, tomando cerveja, sentindo a brisa e olhando as luzes da rua, quase todos dormindo em silêncio. Aos poucos talvez eu recupere a graça, o brilho desses momentos. Mesmo que, quando volte, eu seja dispensando, creio que o mais importante seja me cuidar, ou não sobrará nada.

Abracei meu amigo com força quando nos despedimos, e nos beijamos duas ou três vezes. Eu apenas senti que deveria fazer isso, e que talvez devesse ter abraçado mais tempo. 

A única pergunta que faço, e queria ter ainda disposição para falar mais, é aquela de sempre: permanecerei sempre só? A solidão é uma condição própria minha? Por isso devia caminhar só, ir ao cinema só, sempre voltar para casa só?

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

No Calor Insuportável da Solidão

 Edward Hopper

"Quando a gente bebe, o mundo ainda continua aí, mas por um momento ele não te segura mais pela garganta." (Charles Bukowski)

Lembro vagamente de quando comecei a tomar esses remédios, primeiramente achando graça de um quadro da Grace Gianoukas na Terça Insana em que tudo se resolvia com Lexotan. A princípio eu tomava apenas quando ficava muito chateado. Era um jeito de fazer os dias passarem rápidos, de não ver a tristeza, nem os amigos indo embora, ou os namoros acabando. 

Depois eu descobri que, em combinação com essa tristeza da qual eu fugia, eles me ajudavam numa espécia de catarse dopada. O efeito hipnótico do Zolpidem me fazia divagar de modo que os textos fluíam, com uma dor e brutalidade que eu não alcançaria sóbrio. Tal qual faziam tantos outros com o ópio, o cigarro e o álcool. 

Agora, anos depois, quando já não encontro nessas substâncias um incentivo a escrever aquilo que sinto na minha alma, apenas o apagar do homem que já não quer viver. Encontrei prazer num breve momento, na bebida, nos momentos de melancolia provocados de encontro com as reflexões próprios da vida cotidiana.

Talvez os temas tenham sido usados tanto que se esgotaram, ou talvez eu precise de outras experiências sobre as quais falar, como ultimamente tem me tocado, mas ainda sem grande expressividade lírica, o explorar, o abandonar, a relação brutal que temos numa sociedade que busca o lucro e, assim, sacrifica o homem, como carne ao abatedouro. 

De algum modo relaciono isso com as buscas infindáveis por companhia. Todos querem alguém ao lado, mas não querem compromisso, se querem compromisso, que seja alguém esteticamente perfeita. Excluem-se da equação pessoas de verdade. E por ouro lado me sinto ainda patético, enquanto ouço a Sonata Patética de Beethoven, em pensar nessas coisas aos trinta anos. Cada arpejo ao piano, no entanto, é como um golpe, como se me dissesse que sim, é verdade, eu ficarei sozinho.

Acontece que aos trinta me vejo, viciado em remédios, estafado do trabalho que me exauriu e solitário, ainda solitário, sem dúvidas o tema que mais se repetiu em todos esses anos. Seja na forma poética dos meus infinitos amores que não deram certo, ou pelo estudo da Instrumentalidade Humana, buscando tratar desse sentimento num nível pouco ou mais existencialista, e, quando era de se esperar uma melhora ou salto qualitativo, mas me vejo aos trinta, pensando ainda como um adolescente, apaixonado pelo rapaz que me sorriu brevemente, mesmo sem saber o que desencadeou em mim, e logo vendo esse sentimento se esvair. Irritado por não ter tido nunca respostas daquele a quem devotei tanto amor, que parecem não me oferecer outra alternativa a não ser seguir em frente, deixando tudo para trás como se não fosse nada. Como se o amor devotado de anos não valesse nada. Como eu. Me recordo o verso de S. João da Cruz "De quem de meu amor se faz ausente, e não quer gozar de mim presente?"

Como me sugeriram, deveria caminhar ou correr um pouco, mas não queria fazer essas coisas sozinho. Fui ao cinema sozinho, e admito ter sido libertador. Mas cada vez que vejo as pessoas dizendo isso eu só me imagino fechando mais e mais... Me tornando mais e mais sozinho, porque talvez seja minha única opção.

Digo isso do meu apartamento imundo. O calor abafado pela umidade entrando pela janela em lufadas de ar quente e, raras vezes, brisa fresca. As paredes de madeira mostram marcas da umidade. Para onde quer que olhe tem algo bagunçado, muitos livros fora do lugar, logo devem começar a mofar, queria me deitar, mas o calor vai me incomodar, já estou todo suado e ainda estamos no meio da manhã. Por Deus, o que fizemos para merecer isso? Isso é horrível, por isso entendo velhos como o Buck, que bebiam até apagar, depois de transar com desconhecidas ou bater na cara de amigos. Pelo menos ainda tenho um pouco de cerveja na geladeira, barata, sim, mas é o bastante.

E agora, que o lampejo de inspiração se foi, costurando de qualquer jeito as ideias que tive, vou dormir, apagar. Pretendia assistir algumas coisas, mas, de repente, os títulos das séries se tornaram apenas isso, títulos, palavras vazias e meu ser se esvaziou completamente de qualquer vontade. Talvez reveja The Twelve Kingdoms depois de tantos anos. Mas não hoje. Tomei um último gole de cerveja meio quente. É só isso.

"Beber é uma coisa emotiva. É um ato que cria uma quebra na mesmice da rotina. Tira você do seu corpo e da sua mente e te joga contra a parede. Sinto que beber é como uma forma de suicídio em que você pode voltar à vida e começar tudo de novo no dia seguinte. É como se matar, e nascer outra vez. Acho que vivi umas dez ou quinze mil vidas até agora." (Charles Bukowski)

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

No Crepúsculo

"(...) No crepúsculo encantado da metrópole, sentia algumas vezes uma solidão assombrosa e percebia que outros também a sentiam, jovens pobres, que gastavam o tempo em frente às vitrinas, esperando a hora de um jantar solitário em qualquer restaurante; jovens funcionários de escritório perdidos no crepúsculo, desperdiçando em noites vazias os momentos mais pungentes de suas vidas." (F. Scott Fitzgerald)

Venho tentando me recuperar disso. É difícil. Me fizeram acreditar que aquele lugar, aquelas funções, aqueles eventos, eram importantes, e que eu era importante. Ilusão. Vaidade das vaidades. Era apenas uma forma de me manter preso, de me fazer ir ao meu limite, de novo e de novo, só pela próxima meta, só mais uma vez, até não sobrar mais nada, e então me tornei um pária, alguém que "não entendeu o quanto era importante", mas é sempre assim, quando se perde a serventia eles mostram quem são, não que já não soubesse antes. Raça de víboras. 

Me fizeram acreditar e já não acredito mais.

Mas ainda, na grande selva de pedras da vida, há aqueles momentos que nos fazem crer no amor. Que ele literalmente vai aparecer na sua frente enquanto se está deitado olhando as estrelas, depois de cair pela exaustão. É uma bela ilusão, admito. A conquista lenta pelo acolhimento, pela doçura, o preocupar-se com o outro. Mas na vida real nem isso pode ser considerado amor. Tenho isso, temos isso, mas é amor?

Me fizeram acreditar e já não acredito mais.

O amor de verdade não existe. Ele nem mesmo liga por todo o tempo em que você o chama de "meu amor" ou "minha vida". O amor de verdade não toca corações, porque não existe. Assim como não existe ética profissional. Só existe o interesse, o eu. Nunca o nós, nunca o amor. E é estúpido que eu ainda espere por isso, ou me irrite com essa constatação, quando já sabia disso há muito tempo. 

Mas é que agora 

que o amor acabou, 

que a festa acabou 

e que a luz apagou, 

eu me irrito ao ver que tudo que fiz

 não valeu nada.

As marcas de meus pés que deixei na areia das praias se foram com as marés, não há sequer sinal de que estive ali. E assim será com tudo o mais, não que isso seja um problema. Com exceção de alguns poucos homens, no momento escuto Shostakovich, toda nossa influência por essa terra desaparece em alguns poucos anos, muitas vezes antes mesmo disso. Tudo empalidece. O bater dos sinos emudece e até as copas das árvores, que vivem mais do que um homem, acabam perdendo suas folhas verdes e brilhantes e viram apenas um pedaço seco de madeira. É só que, diante da fragilidade e finitude do homem, nos perguntamos o que tem realmente valor. O que mantemos em nosso coração quando a dor se instala, o corpo já não responde e a mente já não distingue?

A quem devemos respeitar e a quem devemos amar?

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Lugar de Conforto

 

Tenho estanho apaixonado por ThomasKong nos últimos meses, de algum modo eles se tornaram uma espécie de válvula de escape do momento que estou/estava vivendo. Saber que, aos fins das tardes de domingo, veria os dois em situações meigas e fofas, aprendendo mais sobre amar, sobre demonstrar, sobre ter e impor limites, sobre confiar. Durante o tempo que ficou em exibição a série Your Sky se tornou esse momento para mim.

Mas também os atores principais, fora de cena, mas ainda em tela, continuam essa sensação, de tal modo que, não raramento, mesmo em meio aos trechos sem sentidos das lives ou dos desafios de TikTok, eu ainda encontro neles doce inspiração, breve alento. 

Kong, Kongjiro, com uma capacidade de mudança incrível. Muitos enxergam apenas mais um ator fofo e bobo, mas não, é artista completo, desenvolto, improvisa, sabe ser sexy, apoia o parceiro e os colegas no palco. O cabelinho esvoaçante, como no episódio da revelação dos parceiros do DMD Friendship, mostram esse frescor, o sorriso doce e meigo, mas o rebolado e o olhar podem ser atacantes.

Thomas encanta de primeira, um homem de beleza intimidante, que poderia ser arrogante, mas que, na verdade gosta de roupas folgadas e cantadas de tiozão. De fato sua aparência é uma pedra preciosa, de frente a câmera ele facilmente seria um deus, olhar que lembra o frescor dos leques de cedros, mas adora brincar, e perturbar o Kong, e logo volta ao seu lugar quando o parceiro manda. 

Ambos brancos e rosados, o corpo como de ouro puro, as faces são canteiros de rosas, os lábios lírios com mirra e os músculos torneados em ouro...

É fascinante essa relação de ambos. De parceiros, amigos, algo que já não se pode denominar, ao menos não para mim. Em tempos de desilusão, a luz pode brilhar de onde menos esperamos.

Força e Coragem

"O mundo é muito menos chato! Para muitos, beber não é uma doença, assim como as drogas, mas sim a cura para essa vida sem sentido; que parece que por mais que você se esforce nenhum resultado é satisfatório." (Charles Bukowski)

Queria não sentir vergonha, de chegar perto, de chamar as pessoas pra sair, incluindo os amigos, de sair sempre feio nas fotos, de ser como sou. E então é ai que eu apenas quero me esconder, fugir, porque acho que se ninguém me ver, vai realmente ser melhor para todos, afinal, quem gostaria de segurar minha mão?

É, acho que não... Há coisas e pessoas melhores por aí...

Foi assim que me senti. Ou melhor, é assim que ainda me sinto, depois de tanto tempo. Já não acredito mais que sou capaz de amar, ou ser amado, e nem mesmo de fazer amigos. É que se tomou conta de mim um pessimismo tão brutal com relação ao outro que eu simplesmente olho a todos, e principalmente para mim, com o mesmo sem vontade com que levo cada dia de minha vida: com uma absurda vontade de não ser. De simplesmente deixar minha essência se esvair, numa não existência, perene, a flutuar até se perder, até deixar de ser. 

Venho me sentindo assim também nas coisas que escrevo, cada vez menos palavras, cada vez menos pensamentos, cada vez mais pessimismo, mas dessa falta de vontade de vida, o que aparentemente é inaceitável, vejo pela força de todos ao meu redor. Deus, me dê coragem de viver, me dê força de viver! 

Caminhando pelo deserto, cansado, tudo o que posso fazer é clamar, uma voz sozinha no deserto. 

"(...) Parei de pensar e fui pegar outro café. A vida mesmo injusta continuava..." (Charles Bukowski)

sábado, 22 de fevereiro de 2025

Distrações

"Há sempre algo de ausente que me atormenta." (Camille Claudel)

Nada muito que dizer sobre meu aniversário, um dia que considero chato e dispensável, ainda mais do que todos os outros. Felizmente passou rápido e despercebido, tanto melhor assim do que qualquer atenção boba. Aliás, das convenções humanas essa é uma das que considero mais idiotas. Há tantas outras coisas mais dignas de celebração. 

Por exemplo, os novos anúncios da DMD pra esse e próximo ano, eu poderia fazer uma conferência inteira sobre isso, sobre como eles têm explorado ainda mais que os outros o ideal de beleza perfeita, desses amores que nascem de aparentes confusões, mas que, ao fim, tudo se torna perfeito. Gosto disso, é como uma pausa desse mundo real, onde as confusões são e a nada termina bem.

Uma pena, seria bom poder falar disso. Mas também nem sei se teria disposição, muito embora tenha ficado bem mais animado depois de ver tudo que anunciaram. Não sei. Espero recuperar, nos próximos dias, alguma disposição.

Gostava quando o Zolpidem me fazia escrever mais e mais páginas de cada vez. Tenho ficado cada vez mais lacônico. Ou talvez a depressão tenha me tirado isso também.

Bem, é assim que as coisas são. Um ou dois amigos perguntaram se eu estava bem. Uma amiga me visitou e saímos pra tomar uma caipirinha de Pitaya, amo caipirinha. 

Bem, já que os remédios já não me apagam mais depois de uma dopada inspiração, eu mesmo vou deitar pensando em Kong, Namping e Ohm vestidos de bruxinhos, a coisa mais fofa, em Keng e Namping numa trama xamânica lutando pela vida, e pelo amor, em Por e TeeTee esbanjando fofura e no Nunew saindo do estilo estrela e assumindo o papel do aldeão com sonhos, fofo, ingênuo e lindo. 

Espero que possa sonhar com isso. São minhas distrações.

"Quando você compreende que vai morrer qualquer dia desses e não vai restar nada, tudo se torna insignificante! Eu considero muito importantes as minhas ideias, mas, ainda que se concretizassem, elas me parecem tão insignificantes... Assim, a gente vai passando a vida, se distrai com a caça, com o trabalho, só para não pensar na morte." (Liev Tolstói)

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Mais do que palavras numa noite

Aproveitei a manhã fresca e fiquei um pouco mais na cama. Cobri a cabeça enquanto ouvia a chuva caindo fraquinha lá fora, enquanto aqui dentro tocava a voz suave do Eric Chow. Me senti, por um breve instante, consciente de todo o meu corpo, e me espreguicei algumas vezes, fechei e abri os olhos, me acostumando com a penumbra esverdeada da luz de um sol tímido e das cortinas. Foi um momento especial, não me lembro quando foi a última vez que estive tranquilo assim. 

Dormir de madrugada, depois de rever More Than Words e só concordar com as impressões que tive da primeira vez: a densidade psicológica apresentada simbolicamente nas formas mais sutis fazem dessa uma primorosa, ainda que dolorosa, obra de arte. Por um tempo eu exitei em assistir, sempre com a recordação melancólica que poderia me afetar, mas agora, em que me encontro na mesma frequência, eu consegui acompanhar bem o ritmo da narrativa. Confortável com os silêncios, com os espaços, familiarizado com as traições e a solidão, bem como a mesma melancolia, aquele vazio, e as lágrimas pesadas. Foi uma noite intensa. Fiquei um bom tempo quieto, em silêncio, apenas olhando as folhas se mexerem e a luz amarela dos postes brilhar, antes de finalmente me entregar ao sono. 

Ficou marcada a última cena, dos protagonistas se separando, seguindo caminhos diferentes, mas com um deles tomando uma ponte que cruzava o caminho dos outros, mostrando que, embora separados, não estariam jamais completamente distantes. Isso em contraste com uma das primeiras cenas em que ele a persegue num caminho parecido, mostrando justamente o momento em que se uniram. Belo. 

Ainda que mostre a dor do abandono, do amor que foi colocado em segundo plano, ignorado, substituído como se não tivesse nenhum valor, num quarto imundo, fétido e úmido, vivendo dia após dia. Disso eu entendo. E, embora terra enterrado aqueles sentimentos lá, no fundo, ainda dói saber que fui rejeitado sem nem ao menos ter respostas justas. Há beleza nessa dor também, ou apenas solidão?

"De quem de meu amor se faz ausente, e não quer gozar de mim presente?" (São João da Cruz)

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Aforismos

Que bom que tenha dado certo, que as armas não precisarão ser empunhadas, nem gritos de guerra pelas ruas da cidade cansada e chuvosa,sem esforço desmedido num objetivo inexistente. A sensação: liberdade, suspiro profundo de alívio, o ar que sai por entre lábios repletos de partículas que, antes, eram de preocupada apreensão. meu abraço, sem jeito, deve ter te deixado brevemente confuso, mas sei que a confusão que estava em sua mente era ainda maior, então tão logo meus braços o soltaram, as coisas devem ter voltado ao normal.

X

Me entristeci que permitiu que seu pecado o dominasse. Goethe já dizia que o que os demônios mais gostam é que aumentemos o seu poder, e é verdade. Diante da queda, a atitude cristã deve ser a da esperança do perdão e o propósito de emendar, não a culpa autoinfligida que pode ser vaidade. Era para ter aproveitado aqueles dias, independente do pecado, e não permitido que ele o dominasse. Isso porque ainda falta entender que, na realidade, devemos sempre manter alinhados nosso senso de proporções, isto é, saber o lugar de cada coisa, processo que leva uma vida, é claro, mas a conversão leva uma vida e, não raras, vem apenas ao cabo dela. 

Como já disse tantas vezes, esse senso das proporções é enriquecido com a formação do imaginário, aquilo que nos instala na realidade, que coloca nossos pés no chão, que nos faz diferenciar não o santo do pecador, mas aqueles muitos homens que possuem em si virtudes santas e pecados coexistindo. Observando os extremos temos a impressão que apenas eles existem, mas não é verdade. Há uma imensidão de homens e mulheres que, cometendo pecados horríveis, se redimem por uma ação heroica, há pessoas de vida medíocre, piedosa e maliciosa, e há pessoas que vivendo santamente, de súbito num rompante de ódio, morrem como os piores dos pecadores. E muita complexidade envolvendo todas essas relações, alegria e dor, sonhos, desejos velados, malícias... Assim então vamos entendendo o peso real de nossos pecados. Não deixamos de ter culpa, mas a colocamos no lugar onde a contrição verdadeira não será ofuscada pela vaidade.

X

Foi uma oportunidade perdida: um dia inteiro reunindo as lideranças da igreja local e tudo que tivemos foram pregações sentimentais salpicadas de versículos bíblicos ao modo protestante. Falaram sobre aprofundar a vida de oração e superar as dificuldades dela, falaram sobre confiar no amor divino. Nenhuma citação ao Catecismo ou aos documentos da Igreja, ou ainda as obras dos santos. Era uma excelente chance de falar da Noite Escura de S. João da Cruz, ou a carta Deus Caritas Est de Bento XVI. E assim continuamos: líderes que não conhecem o que devem fazer ou anunciar, e que reclamam de não atingirem bons resultados. Enquanto isso, os Papas falam, os bispos falam, os santos falam, os teólogos falam. E ninguém escuta. 

X

"Mas advirto que as coisas não são como ao teu desejo parecem." (Dante Alighieri)

sábado, 15 de fevereiro de 2025

Santa Desesperança

Não venho tendo muito o que dizer. Apenas vejo os dias passarem, torcendo que cheguem ao fim ou que pelo menos o calor diminua. 

Estou tomado de desesperança. 

Não, isto não está certo. 

Não estou tomado por nada, 
é apenas e tão somente vazio.

Vazio completo 

e absoluto.

Estou num episódio misto, brutal, sinto a mente ao mesmo tempo, pesada e acelerada. Tive crises de pânico, fiquei catatônico, chorei de raiva e desespero, fui em vários médicos, psicólogos, gastei uma fortuna. 

Agora, que vou descansar ao menos por alguns dias, consigo parar brevemente, sentir a brisa no rosto aqui na sacada, observar o farfalhar das folhas em vários tons de esmeralda, bem como o céu, de um delicado azul riscado de branco.

É Valentine's Day, e as imagens pululam na internet. Ensaios de casais ou com essa temática, maquiagens perfeitas fazendo peles sem nenhum defeito, bochechas rosadinhas de blush, detalhes nos olhos com sombras em tom coral, cenários, flores, rosas e tulipas, sorrisos, abraços, posados ou não. Um mundo perfeito. E mais uma vez eu pensei em fazer o mesmo, e mais uma vez aconteceu aquilo, eu simplesmente perdi a vontade. Os produtos me parecem estranhos, pinceis são instrumentos complicados e pesam como pedras, os cenários de repente perderam a cor.

Sei que amigos criam ships para nesses dias conseguirem seguidores e oportunidades de trabalho, mas vivemos em mundos diferentes, quem faria isso comigo? Além disso, em meus desequilíbrios, eu provavelmente estragaria tudo. 

E de novo me vejo pensando no amar, nessa possibilidade que sempre se mostrou tão bela, tão forte, capaz de tudo superar, inclusive a distância e as diferenças. Mas era uma mentira, essa celebração é uma mentira, porque se alguém procurar pelo amor, não vai encontrar senão decepção, e silêncio. Quando Khalil Gibran disse "quando o amor vos chamar, segui-o", não sabia o que estava dizendo. O amor não chama, tampouco dá uma resposta sequer. O amante jaz no vazio e mergulha na própria solidão até à loucura. Amar é atar o próprio pescoço com as mãos de outrem.

Já perdi a conta de quantas vezes reclamei disso, mas ainda mexe comigo. As imagens bonitas e o contraste com o que vejo no espelho. Isso me destrói. E então não quero mais ler, ouvir música ou assistir, ou me apaixonar, quero apenas o silêncio. Foi tomada de mim a inspiração e restou apenas ele

o vazio

absoluto.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Aforismos

"Alegre era a gente viver devagarinho, miudinho, não se importando demais com coisa nenhuma." (João Guimarães Rosa)

Me preparei para dormir de novo, mas meu coração palpitava, queria dizer algo, e eu sabia que quando me sentasse para escrever isso sumiria, e assim foi. Apenas uma breve inquietude do amor, aquele sentimento de ida e volta, do querer e do fugir, a dicotomia de um coração ferido que não quer mais se machucar, mas que ainda lida com as ânsias inflamadas das noites escuras.

Estava cercado por algumas centenas de pessoas, e fazia um trabalho mais ou menos importante, que me rendeu várias ligações e mensagens nos últimos tempos. Mas, em dado momento, eu só conseguia olhar o nada, olhava pra frente sem pensar em nada. Não, não é verdade. Eu pensava que não queria voltar. Queria poder ficar mais uma semana afastado, quinze dias, um mês, ou que nem mesmo voltasse para aquele inferno comandado por demônios. 

Não deveria fazer compromissos aos quais eu não vou querer ir. Mas, eu acho que no atual estado, eu não iria querer nada, e nem ir a lugar algum. 

Senti faíscas? Não sei bem dizer. Mas eu queria um abraço, e atravessei o salão e todas aqueles bancos, e o abracei sem me importar que nos vissem. Não viram, não somos importantes. Mas, nos pequenos toques, no ombro, no braço, nas espáduas enquanto saíamos sozinhos, eu percebi uma pequena luz, amarela, viva, brilhando rapidamente depois de sumir por entre a sua pele rosada. Estava confortável, foi uma noite agradável, até mesmo o breve abraço de despedida, calor repentino. Mas não estou apaixonado. Talvez eu esteja descobrindo uma amizade, mais uma que provavelmente estragarei. 

Gosto de andar de modo que me sinta bem, apesar de não ter dinheiro o bastante para comprar tudo que que quero, mas ainda posso pintar as unhas ou usar os cabelos grandes, batom nos lábios. No entanto, para além da aparência, atualmente gordo e cansado, acho que gostar de mim, ou até me amar, é algo para se envergonhar. É, deve ser isso.

Um toque muitas vezes pode ser simples como a pétala de uma rosa-branca, delicada, bela, simples. 

E ainda me resguardo o direito de me irritar, ainda que seja com pouca coisa, pois essas coisas não são raramente os únicos momentos, nem digo de alegria mas, da menor distração nessa vida desgraçada enquanto os restante dos meus dias eu passo naquele inferno. E digo restantes porque sinto que a cada dia naquele Círculo da Colina de Fogo, é como se me restassem poucos dias sobre a terra. E com isso, nessa ira final eu só queria conseguir um médico que me afastasse por mais dias, que pudesse realmente mudar de ares, já que nos últimos meses eu vou dormir com uma única prece em mente: a de que não acorde no dia seguinte. 

Mas eu sempre acordo.

E lá estou eu, sem Virgílio a me conduzir, às nove da manhã, suportando o peso de um mundo ridículo.

Fico pensando no quanto eu já desisti depois de tudo, como na música "faça uma lista dos sonhos que tinha, quantos você desistiu de sonhar?"

Muitos, muitos sonhos, muitos amores. Hoje apenas vagueio por aí, sem rumo, paz, sem lar, sem morada.

X

"O indivíduo pode vislumbrar numerosos objetivos pessoais, finalidades, esperanças, perspectivas, que lhe deem impulso para grandes esforços e elevadas atividades; mas, quando o elemento impessoal que o rodeia, quando o próprio tempo, não obstante toda a agitação exterior, carece de esperanças e perspectivas fundamentais e se lhe revela como desesperador, desorientado e falto de saída, e quando responde com um silêncio vazio à pergunta que de qualquer modo se faz, consciente ou inconscientemente, acerca do sentido supremo, ultrapessoal e absoluto, acerca de toda atividade e de todo esforço — então se tornará inevitável, justamente entre as naturezas mais retas, o efeito paralisador desse estado de coisas, e esse efeito será capaz de ir além do domínio da alma e da moral, e de afetar a própria parte física e orgânica do indivíduo." (Thomas Mann)

sábado, 8 de fevereiro de 2025

Aforismos sobre solidão e... Amor

A coisa piora, já sinto dores pelo corpo todo, é aquela fase em que cada fibra do meu ser implora pelo não-ser. E tem sido assim, olhos baixos e cansados, disposição em frangalhos, o mundo que passa sem que o note. Ele que passa sem me notar. Eu me recusando a notar o outro. O outro cansa. O outro é um inferno, dizia o psicanalista. E eu, também inferno, preciso dormir, preciso esquecer, apagar, não me comunicar, não me cansar. E tudo me cansa. As pequenas intrigas, as grandes burrices, a política internacional, a louça suja e as garrafas vazias, o fato de que sem mim as pessoas não conseguem encontrar um maldito boleto ou enviar uma mensagem para o correspondente certo. Isso me deixa, faz eu pensar que estou aqui acorrentado, mas não estou, a vida de todos pode correr bem sem mim. Eu só queria que me deixassem ir. Eu só queria ser livre. 

Pouco a pouco fui vendo mais claramente o defeito mais difundido de nossa maneira de ensinar e de educar. Ninguém aprende, ninguém aspira, ninguém ensina — “a suportar a solidão”. (Friedrich W. Nietzsche)

Gostei daquelas imagens, de um amor ganhando seu espaço, não nas imagens toscas e superficiais da relação carnal e imediata, mas da gradual aproximação, do espaço modificado. Espaço de intimidade, que se desfez em espaço vazio, com as coisas do antigo amo ocupando espaço, no armário e no coração. As coisas, sozinhas e a dois, adquirem significado profundo. As roupas colocadas no armário, bem ao meio daquelas que estava ali antes, mostrando como, a partir daquele momento, eles estariam unidos, quase confundidos. Também pequenos detalhes, como as canecas com os nomes de ambos, para momentos de singela intimidade, um café antes do trabalho, uma bebida quente antes de dormir, acalmando corpo e mente. Skincare e banheiro, momentos compartilhados, também os sabores, agora eram os sabores deles, dali para frente, e assim o seu amor foi ganhando forma, contornos, mesmo nos encontros escondidos, nas noites a sós, no apoio mútuo. É assim que as coisas, essas coisas de amor, de amor de verdade, desses que deixam o rosto vermelho e o coração quentinho. 

"Leve, leve, muito leve,
Um vento muito leve passa,
E vai-se, sempre muito leve.
E eu não sei o que penso
Nem procuro sabê-lo."
(Alberto Caeiro)

Também aquelas outras, imagens da construção, ou melhor, da reconstrução da crença no amor. Algo difícil de se conseguir depois que foi quebrado, como um cristal em mil pedaços minúsculos. Mas aos poucos, o cuidado, a atenção, o carinho, rompem até as barreiras mais sólidas dos traumas que os amores partidos geraram. Destino ou livre arbítrio? Não importa, o amor pode operar onde quiser, até mesmo na linha tênue entre ambos, e então transformar, o ódio, a indiferença, o silêncio de anos de chuva intensa, em momentos de construção da vida de dois como um só. 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Sobre a Melancolia

Não gosto dos dias que me sinto assim, mas cá estou eu de novo, mente pesada, o mundo ao redor passando como que em câmera lenta. Eu preciso de um descanso, simplesmente preciso. Cheguei a conclusão que esse ambiente tem me matado. Claro, com uma boa dose de predisposição da minha cabeça perturbada. Eu preciso de um descanso. Aquela voz me irrita profundamente, ainda que distante, ainda que apenas seu nome seja dito, eu já amaldiçoo dez a cada menção. E eu tento ter ideias, e buscar alternativas, e só me vejo perdido. E é horrível. E o tempo não passa, e eu me perco, simplesmente me perco. É como estar sentado numa sala vazia, todas as paredes de um cinza triste, a melancolia tomando conta do ser enquanto passam dias, passam meses, passam anos... É uma vida tão profundamente ausente de significado que eu simplesmente não consigo descrever, senão que de meus lábios saem apenas balbucios e eu entoo o pequeno trecho daquele hino de Simeão, clamando ao céu "deixai agora vosso servo ir em paz, ó Senhor". E então sinto-me desfazer, como pó, ou melhor, como cinzas ao vento, lançadas diante de imenso precipício. Ecoam em mim os compassos da 2° Sinfonia de Mahler, algo como uma repetição demoníaca, ainda longe da ressurreição, se é que chegarei lá. Pois cada vez mais vejo que apenas me aproximo do fim, e um fim que não acaba. Não acaba nunca. Nunca. Nunca. Realmente um ciclo infernal.

Descansa
O homem já se fez
O escuro cego raivoso animal
Que pretendias

(Hilda Hilst)

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Aforismos


Em alguns dias, como hoje, sinto um gosto amargo na boca, um presságio do amanhã, incômodo e barulhento, corrido e mentiroso, repleto de ganância e de malícia... Olho as pessoas ao meu redor cansadas, exaustas, na verdade, assumindo mil compromissos pra chegar até o fim do mês. Vejo que mesmo com planejamento o armário sempre fica vazio nessa época do mês, vejo os olhos envelhecidos, a pele maltratada pelo tempo. E é por isso, pela enésima vez, que eu prefiro simplesmente dormir e apagar. 

É minha forma de desistir. Porque eu já vi que não há recompensa, não há nada que valha a pena o esforço de viver. No fim somos só pessoas esgotadas e pessoas que deram a sorte de ter uma vida com mais dinheiro, mas não menos vazia. Somos parte de uma existência desgraçada. É o meu manifesto silencioso contra o ser, é quando me torno a fera que gritou "Eu" no coração do mundo, um eu que já que não quer ser.

De que adiantarian os esforços? Não vamos ganhar dinheiro assim. Mas como eles conseguiram? 
De que adiantariam os esforços? Não vamos ter peles perfeitas, lábios desenhados, sorrisos fofos. O mundo já definiu quem serão os seus belos favoritos. E não seremos nós. 

Nós ficaremos aqui, deixados e esquecidos, num quarto e sala mofado, abafado, deitados num sofá velho, sem vinho barato e sem vontade de levantar, o maldito sol entra pela janela queimando nosso rosto, viramos de costas, mais um dia infernal numa semana infernal, numa vida infernal e sem sentido. 

"Como vão vocês? Estão na carência ou na fartura?" (Clarice Lispector)

domingo, 2 de fevereiro de 2025

Mundos Diferentes

Um assunto bem recorrente aqui é justamente as diversas visões de mundo que temos, sempre ressaltando a minha visão que é, não por escolha, essencialmente pessimista. Mas também, não raramente, me vejo encantado com a visão de mundo dos outros, não apenas a visão que eles têm, mas a que eles conseguem criar. 

Estou nesse momento mesmo silenciado de encanto pelo final brilhante Your Sky, a produção da Mandee estrelada por "Kong" Kongpob Jirojmontri e "Thomas" Teetut Chugmanirat e que, há vários meses, havia viralizado na internet, deixando grandes expectativas e atendendo a todas elas. Mas isso não é uma resenha, é, antes de tudo, um manifesto.

O que posso dizer é que, num mundo cinza, nublado e pessimista como o meu, obras como essa, e também ThamePo que está sendo lançada ao mesmo tempo, se tornam uma espécie de espelho, ou portal, que me levam a uma outra dimensão, um universo onde o amor não só é real como pode ser encontrado por todos, os casais se multiplicam, andam de mãos dadas, sorriem e se provocam, fazem surpresas, encontros lindos e encantadores, se amam e se entregam. 

Um universo onde se banha no mar, onde se faz amor ao pôr do sol, onde os corpos são iluminados por diversas luzes que nunca se apagam, antes disso, se multiplicam, aumentando e brilhando cada vez mais. Onde o dizer "eu te amo" não é uma convenção social antes de dormir, nem palavras ditas aleatoriamente, são uma confissão real, de olhos marejados que traduzem o oceano de significados que expressão contém, podendo ser condensados em "eu quero passar todo o sempre ao seu lado." 

É claro que muitos, inclusive eu, do alto de arrogante cátedra de ossos secos e brancos, dirão que é uma visão extremamente infantil, ingênua, da realidade, em especial do amor, e que essas coisas podem até existir, mas não na força e constância que são mostradas ali. E talvez seja verdade. Mas se homens como nós podem se dar ao trabalho de gastar tantas palavras descrevendo as desgraças, mazelas e maldições desse mundo, também outros homens podem criar esses mundos onde cores, amores e músicas se misturam numa sinfonia, cada elemento compondo o todo de beleza inigualável, cada sorriso tímido, cada toque, cada lágrima, cada lábio vermelho ou olhar apaixonado, todos num mundo para onde nós podemos fugir, por alguns minutos, antes de voltar para cá.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Aforismos

"Quem ama quer e aquele que quer relampeja e cintila. A resolução enche os olhos de fogo; admirável fogo que se compõe da combustão de pensamentos tímidos." (Victor Hugo)

Espero conseguir descansar, ainda que brevemente, na noite de hoje. Acho que estou com vontade de comer algo doce, pode ser que vá dormir mais tarde, se bem que não decidi o que assistir, lembro que já faz um tempo que não bebo na sacada olhando o tempo lá fora, talvez isso. Tenho passado por outro episódio depressivo, na verdade, parece que não tenho vontade de nada. As noites não têm sido exatamente desagradáveis, e tenho conseguido aproveitar um pouco mais esses momentos. Mas sinto aquele indiferentismo querendo voltar. 

Assim como o amor quer voltar. 
Assim como a tendência suicida quer voltar. 
Assim como a desesperança quer voltar. 

Talvez eu desejasse que as noites fossem desagradáveis, ou que fossem qualquer coisa. Sei que seria demais desejar que fossem alegres. Talvez eu termine aquele vinho hoje, vendo uma série triste, mas aí eu não conseguiria acordar amanhã cedo, ou talvez eu compre um bolo e só assista um pouco antes de dormir, ou melhor, ficar acordado mesmo, ver algo triste e depois dormir o dia inteiro, ou algo mais alegre, com pitadas de melancolia. Talvez eu mereça um dia assim... Mas assim como? 

As perguntas que fazemos dizem muito sobre nós, revelam, como dizia S. Agostinho, pelo menos aquilo que não sabemos, e eu sempre penso naquilo que pergunto, e atualmente percebo o quanto minhas perguntas revelam um vazio, e uma imensa angústia partindo desse vazio. 

"Cada um de nós tem a sua própria morte, transporta-a consigo num lugar secreto desde que nasceu, ela pertence-te, tu pertence-lhe." (José Saramago)