sexta-feira, 28 de abril de 2023

Agitação e silêncio

Músicas aleatórias. 

Dinheiro. 

Saudades. 

É engraçado, e aqui leia-se engraçado como absolutamente bizarro e cansativo, como se dá a dicotomia dos meus sentimentos nas fases do meu transtorno bipolar. Vinha pensando no ônibus, no caminho para o trabalho, como algumas coisas são tão contraditórias: durante a fase depressiva embora eu fique quase catatônico, é na fase da hipomania que aumentam em mim a desesperança e o silêncio proposital. Se normalmente u observo os homens bonitos que passam por mim com certo desejo e muitas vezes até uma lascívia silenciosa, em dias como hoje eu sou tomado de tédio absoluto. 

Abandono. 

Traição. 

Compromissos. 

Muito embora ainda admire e continue percebendo os anjos que caminham entre nós, mero mortais, eu não sinto nada além disso. Ainda ontem falava com uma amiga que já havia desistido de tentar encontrar alguém, e essas palavras que me saem assim de modo espontâneo são muito significativas porque justamente não passam por um filtro social, elas são um retrato mais fiel do meu interior e, nesses dias, eu incorporo a desesperança como minha mortalha. 

Agenda. 

Chefes. 

Risadas. 

E assim sigo pelos agrestes escarpados, com um olhar vazio e indolente, até mesmo meio idiota, mesmo que meu corpo tenha muito mais energia nesse episódio breve que nos dias escuros da depressão onde minha única alternativa é me agarrar aos sonhos, eles são tudo o que restam a um homem assim. Mas, em dias como hoje, nem mesmo sonhos me restam. Eu sou um corpo que anda por aí, decidido porém sem rumo. Até mesmo o belo homem que vejo, altivo e lânguido, de olhos azuis e expressão estoica e distante, é para mim não mais do que uma bela escultura animada, um deus que caminha entre pobres mortais mas que em nada me faz querer ser levado para sua alcova. Eu apenas quero caminhar tranquilamente, talvez cantar baixinho, sentir a brisa do outono na beira do mar perto de casa e adormecer silenciosamente. 

Sono. 

Corpo cansado e mente desperta. 

Consciente e inconsciente.

Por outro lado eu acabo sem saber como lidar com a compulsão. Gastei mais de dois mil reais essa semana com coisas que poderiam claramente ser adiadas ou compradas em menor quantidade. Uma promoção de livros, canecas personalizadas. Percebo também uma diferença grande na minha atitude, concordando com coisas que normalmente negaria, parece que esses dias eu perco o filtro e acabo vazando pra todos os lados, fico dizendo besteiras, anormalmente bobo pra tudo, pensamentos rápidos demais pra me fixar no que quer que seja, inclusive no bom senso. O problema é que a razão me faz cair em mim depois, mas aí as decisões erradas já foram tomadas. E então sinto esse frenesi quase o tempo todo, essa eletricidade passando por baixo da minha pele... Odeio o fato de ficar assim, sempre flutuando entre uma coisa e outra, ou completamente atônito ou assim, elétrico e idiota. De que adianta ter toda energia e só querer fazer besteira? Um monstro que saiu de seu túmulo para caçar e devorar a carne, deixando por onde passa um rastro de ódio e arrependimentos. 

Boas ideias. 

Péssimas escolhas. 

Álcool.

Roupas japonesas. 

A dor de cabeça é um incômodo. Mesmo com o corpo cansado eu ainda sinto a mente desperta. Quando tento dizer algo muitas vezes a língua enrola, me confundo em assuntos que sempre me foram tranquilos em falar. Preciso parar e respirar fundo várias vezes, recomeçar... 

Homens bonitos no ônibus.

Olhos alucinados.

Um encontro mais tarde.

Só uma coisa permanece igual independentemente do episódio, independente do silêncio ou da agitação: eu continuo sozinho. 

Sozinho.

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