Existem pessoas que, perante o abismo, dão um sorriso; em seus olhos, a luz de quem viu na queda uma dança. São aqueles que mergulham sem hesitação no labirinto, que caminham sobre a linha da navalha sem o receio de se ferir, pois cada corte é um prêmio e cada cicatriz, um canto que só eles compreendem. Para esses indivíduos, o fardo do mundo é um passatempo, e a dor, um instrumento a carne se torna dura, a alma se afia. Eles procuram no desafio o prazer da vitória, não em relação aos demais, mas em relação a si mesmos, naquela constante e acirrada batalha de superação.
Eles reverenciam a ascese como se respirasse, não para negar a vida, mas para absorvê-la integralmente, em sua dor e sua beleza.
São aqueles que veem na autossuperação uma alegria sagrada, os mais leves sob as mais pesadas responsabilidades, e os mais felizes mesmo perante as sombras. O conhecimento é seu campo de batalha, e a conquista de si mesmo, sua dádiva.
"Os homens mais inteligentes, sendo os mais fortes, encontram sua felicidade onde outros encontrariam apenas desastre: no labirinto, na dureza para consigo e para com os outros, nas experiências, no esforço; seu prazer está na autossuperação. Sua alegria é a autoconquista: o ascetismo se torna natureza, necessidade e instinto. Tarefas difíceis são um privilégio para eles; brincar com cargas que esmagam os outros, uma recreação. Conhecimento: uma forma de ascetismo. Eles são o tipo de homem mais venerável: isso não os impede de serem os mais alegres e os mais bondosos."
Friedrich W. Nietzsche, In 'O Anticristo e Ditirambos de Dionísio'.
Nenhum comentário:
Postar um comentário