quarta-feira, 23 de abril de 2025

Silêncio e Luz

Era a Páscoa dos Judeus, ou melhor, a Páscoa daqueles que estavam próximos de Cristo. Ele manda preparar um lugar adequado para a instituição de tão grandes mistérios. O Jesus que falou às claras, sempre candente, agora sério, assume a posição que deve ser imitada pelos seus: a do sacerdote que guia ao povo e realiza o sacrifício.

A Quinta-Feira Santa é, para mim, por essa razão, uma reflexão ao nosso modo de servir. Cristo manda preparar um lugar adequado, mas nós não fazemos isso: preparamos aquilo que queremos, que vai chamar atenção para nós, que vai ser bonito e grandioso, mas não de modo a glorificar aquele que nos enviou, mas de fazer crescer nossa fama. Vejo isso nas pessoas que ostentam nomes, cargos e vestes vistosas, mas que não preparam nada que não as faça aparecer. E o Cristo realiza sua ceia junto aos seus, de modo simples, porém solene, sério, com tudo preparado. Do mesmo modo, observo aqueles que, com vestes vistosas, elas apontam a grandiosidade de seu coração próximo de Cristo. Bento XVI usou os paramentos mais belos dos últimos anos, e em nada tinha a arrogância dos homens de estolas baratas e túnicas amplas que apenas ostentam discurso de pobreza, uma pobreza falta, superficial. 

Ao invés de se engrandecer naquela celebração, ele lava os pés dos outros, coisa que não fazemos, coisa que repudiamos. Não queremos aprender, não queremos ouvir. Somos como ovelhas sem pastor, não por falta do pastor, do Bom Pastor que nunca falta, mas porque nos recusamos a ouvir e ver o que está diante de nossos olhos. 

Quantos símbolos, quantos sinais, e tudo, embora fecunde nossa inteligência, pode ser que nunca venha dar frutos, pois encontra a barreira da nossa ignorância. Ao fim, com o hino que deveria ser cantado, a Eucaristia deixa o altar, o Cristo deixa a ceia e vai ao Monte das Oliveiras, e então, deveríamos ficar e vigiar. 

Mas ficamos em tremendo barulho, 

cantoria, 

gritaria. 

Nada de silêncio, é apenas no alto da cruz que o homem, confrontado com a brutalidade do sacrifício, silencia, não por contemplação, mas por espanto. 

Nada de silêncio, pois o silêncio nos revela aquilo que há de mais assustador em nós: nossos próprios pecados. Ficar em silêncio diante do Santíssimo Sacramento é colocar nossa imensa pequenez, esses mesmos pecados, nossas maiores fraquezas, aquele que é maior do que todos nós.

E que ainda assim escolheu padecer por nós, por aqueles incapazes de ficar e vigiar uma hora sequer.

Depois, 

traído, 

caçado, 

preso, 

esbofeteado, 

ele caminha, 

calmo e sereno, rumo a cruz. 

De novo fazemos o caminho da Divina Comédia. Se na Missa de Ceia do Senhor cantamos o Glória, ornamos a igreja com flores, preparamos um belo tabernáculo, na Sexta-Feira da Paixão a igreja se encontra despojada de todas as suas glórias: santos cobertos, altar sem toalhas ou velas, lembrando a desolação do homem: do povo no exílio, dos discípulos sem poder diante dos judeus, de Maria junto a Cruz e, finalmente do homem diante da própria miséria. Como bem cantou, ou lamentou, Jeremias, não consigo encontrar melhor descrição desse dia:

"Ah, como está tão deserta, 
quem já foi tão povoada. 
Parece pobre viúva, 
quem antes se orgulhava. 
Rainha entre as nações, 
hoje ao imposto obrigada."

A Igreja, das glórias, dos hinos, se despe de tudo isso como Cristo foi despido de suas vestes e açoitado, humilhado. Beijamos a cruz. Finalmente reconhecemos nosso lugar. Adoramos aquele que nos salvou em sua morte. Há também a contraposição daqueles hinos, os Lamentos do Senhor e o Fiel Madeiro da Santa Cruz. Cristo lamenta que precise ser assim, porque Deus nunca desejou a queda, mas pelo Lenho da Cruz ele nos dá prêmio ainda maior que aquela vida longeva que tinham nossos pais.

A cena de ultrajes de novo e, também de novo, o silêncio. 

Um grande silêncio que reina sobre a terra.

E esse silêncio é acompanhado de trevas.

E da profundidade dessas trevas, ressurgindo da mansão dos mortos, brilha uma luz, uma pequena luz, uma única luz. E essa luz começa a dividir-se. E o que era trevas agora brilha mais do que o dia. E o que era uma única luz agora é multidão, é Igreja, povo santo e pecador, caminhando com Cristo. Ao ouvir a História da Salvação, acompanhamos a humanidade, da queda ao reerguimento, atravessando o Mar Vermelho a pé enxuto, passando pelas profecias. Caminho longo, arduíssimo, que nós ainda não contemplamos, mas que já vemos na divina liturgia, como que por antecipação. 

E então, finalmente, tornamos a cantar alegres: Cantai Cristãos, afinal! A dor não ficou para trás, mas a alegria a venceu. Duelam forte e mais forte, é o Cristo que vence a morte. E então essa vitória traz consigo aquela solenidade perdida, infelizmente ainda incompreendida, é verdade, mas Cristo também o foi. 

Mas, assim como Cristo continuou a ensinar mesmo que seus discípulos ainda não entendessem, a mãe Igreja alegra-se igualmente ao oferecer esses tesouros aos seus filhos rebeldes. Cristo ressurge em sua glória. A alegria das flores, o perfume do incenso, os cantos, os sorrisos, me recordo, em meio a toda essa movimentação, da alegria sublime de Maria ao rever seu filho. Episódio que não é narrado nos Evangelhos, mas que podemos imaginar, a Divina Mãe e o Eterno Filho, a se abraçar. Ela, não mais mãe apenas dele, mas de todos nós. Ele, a abraçar, consolando as dores da espada que lhe transpassou a alma, como a lança lhe transpassou o coração. 

Resurrexit, sicut dixit, alleluia

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