Piso o concreto frio com os pés sangrentos,
ao invés de cânticos, saem apenas espuma de meus lábios.
uma expressão fria, vazia.
um sono que se repete, dia após dia.
Começamos o Tríduo Pascal e, com exceção dos dias em que preciso cantar, eu vou me forçar a ir. Porque não quero ver as pessoas que lá estarão, não quero ver ninguém. Estou tentando não me incomodar com tudo que será feito. E tenho falhado.
Muito se diz sobre a simplicidade ou sobriedade da liturgia, o que em si já é um conceito autocontraditório, mas, fingindo que possa ser viável, vejo que a simplicidade é aplicada apenas aquilo que é tradicional. Não usamos a palavra "ofício", é muito antiga, as pessoas não vão saber do que estão falando. Mas no ofício, que interpolamos teatralmente de tal modo que o presbitério facilmente poderia ser confundido com o salão de uma casa da luz vermelha. Qualquer música tradicional é difícil, desconhecida. Gregoriano é complicado demais para aprender. Mas desgastam as pregas vocais até a exaustão para cantar as músicas estúpidas atuais, que repetem um único refrão dez vezes e passam a ideia de uma catolicidade inexistente. Por isso eu prefiro ir e sair o mais rápido possível.
Até em casa, prefiro assistir durante a noite, sozinho, do que aguentar a loucura do entra e sai, das vozes altas, de uma dinâmica demoníaca. Porque a vida humana tornou-se isso, e apenas isso.
Queria caminhar um pouco, e ver como ficou a vegetação do mangue no outono, há tempos não passo por aqueles lugares, e ficam apenas alguns minutos a pé daqui. Também queria sentir a brisa do mar nessa época, ainda que ela chegue até minha casa, não é o mesmo que sentir sentado no trapiche, olhando o céu azul se estendendo infinitamente, alguns pássaros voando aqui e ali, e as vozes das pessoas, conversando baixinho enquanto passam.
Vi muitos meninos bonitos hoje, e alguns deles me abraçaram e seguraram a minha mão. De algum modo isso faz valer a pena sair de casa. Ainda que eu não tenha nenhuma pretensão real de me aproximar de qualquer um deles. Aliás, alguns estavam com suas namoradas, as beijaram na minha frente, mas não importa, a beleza deles tem fim em si mesma para mim. Queria ter algo mais interessante para dizer, além disso. Não vou descrever nenhum deles, seria perda de tempo escrevendo e lendo também.
É, acho que realmente esgotei o que tinha para dizer.
Um poeta que perdeu a palavra,
miserável.
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