sexta-feira, 2 de maio de 2025

Tempo e Compreensão

"(...) Na solidão o solitário devora a si mesmo, na multidão o devoram muitos. Agora escolha." (Friedrich W. Nietzsche)

Me desculpei por sair rápido de lá, ou melhor, não tão rápido assim, depois de contar essa história para a mãe de um belo rapaz que, aparentemente, sentiu algo em relação a sua vocação. Ela foi contada por um dos bispos de Maputo, Moçambique, o qual infelizmente eu não sei precisar o nome, numa das catequeses promovidas durante a Jornada Mundial da Juventude.

Um jovem vivia numa tribo, pagã, e era filho do chefe e sacerdote. Em algumas ocasiões em que seu pai tinha contato com o mundo exterior, ele recebia algumas coisas escritas, pedidos de pessoas, comunicações de outras tribos... Isso despertou no jovem o interesse pelas letras. Ao dizer isso ao pai, este lhe respondeu dizendo não ser necessário aprender, bastando-lhe conservar os ritos e costumes de seu povo. Mas ele persistiu e descobriu que, ali perto, havia um grupo de cristãos que promovia a alfabetização. 

Tratavam-se de missionário salesianos, que o receberam. Durante um tempo então ele estudou com eles e, sem pressão por parte dos religiosos, ele foi se aproximando daquela mística sublime que eles viviam. Como eles participavam da tal Missa com tanta devoção, a alegria que eles recebiam aqueles que pediam pelo batismo e que se juntavam a eles... Não demorou até que ele mesmo quisesse se converter. Ao expressar ao pai o desejo de ser batizado, ele recebeu a dura resposta "se for batizado, eu não o considerarei mais meu filho". Mas ele foi mesmo assim. Foi catequizado, passou pelo catecumenato e, aos vinte e um anos, recebeu o Santo Batismo. Sem família para retornar, continuou morando com os missionários.

Não demorou até que ele mesmo sentisse o chamado ao sacerdócio. O responsável pela missão, após discernimento com o jovem, o enviou para o seminário em Roma. Anos se passaram, ele formou-se, mas, quando chegou o tempo da ordenação, o bispo adiou a sua e ordenou todos os seus colegas, sem maiores explicações. Alguns meses se passaram e ele, apreensivo, não entendia, mas permaneceu firme até que recebeu do bispo a ligação marcando a data da ordenação.

No dia tão aguardado, após a consagração das mãos do sacerdote com o Óleo Santo o bispo segurou as mãos dele, de costas para o povo e lhe disse: "eis o motivo de ter adiado sua ordenação, você já tem sua primeira missão como sacerdote, vire-se e veja sua família que hoje, depois de mais de uma década longe de você, vem te pedir que sejam todos batizados!" E sua primeira ação sacerdotal foi batizar o pai que um dia lhe expulsara de casa por querer ser cristão.

É uma bela história, verdadeira, tratava-se da história do próprio bispo (pelo que me recordo), e é claro que chorei quando ouvi isso, a força transformadora que uma vida cristã tem, ainda que distante. É a força do Evangelho, o Espírito Santo que sopra sem que dependa do nosso tempo ou da nossa compreensão e nos atrai a Cristo.

Mas o que isso tem a ver com o fato de eu ter saído rápido após o fim da Missa do Sagrado Coração? Bem, eu estava lá para servir, e fiz o que me propus, mas aquela escuridão apareceu novamente, e me fechou os olhos e o meu coração. Eu contei para a mãe de um menino que achei bonito, mas nada além disso, não é como se quisesse me aproximar dela ou dele, pelo contrário. Ao ir embora eu sentia que, além de doente, eu preciso me abrir sempre mais para a graça, sem esperar as mãos humanas, sem querer que seja ao meu tempo ou sem querer compreender sozinho. Fiquei muitas semanas sem tocar no livro dos documentos de Leão XIII, mas eu não conseguiria entender mesmo, então precisei esperar e, essa semana, eu consegui ler vários deles de uma vez. Tempo…  

Algo disso tem a ver com meu coração, com a necessidade sim de sair do quarto, de rezar para o Sagrado Coração, mas também de me recolher, de dormir, de ficar em silêncio ou ouvir música, de ver meu sobrinho sorrir, de chorar quietinho mais uma vez ao perceber a verdade contida nas mensagens que deixam claro que ele não gosta de mim. Essas coisas estão todas interligadas, e elas seguem um tempo que não é meu, uma compreensão que não é minha. É de Deus. 

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