terça-feira, 6 de março de 2018

De hábitos e abismos

Já se tornou um hábito, e um péssimo hábito eu diria, ficar quieto, e deixar o pensamento fluir. No entanto ele não flutua de maneira randômica, por qualquer lugar, sejam eles agrestes escarpados ou campinas floridas, não, o único lugar para onde vai pensamento é aquele lugar onde se encontra aprisionado o meu coração: para o lado do Amado de minh'alma. 

Mas o Amado não acolhe o meu pensamento, nem tampouco meu coração, pois se encontra ocupado demais contemplando um abismo que se abre a sua frente. Dessa escuridão abissal uma voz doce o convida a se lançar para os braços abertos da Morte, que ansiosamente aguarda para o acolher em seus tentáculos gélidos e putrefatos, de onde ele não mais poderá escapar por toda a eternidade.

A Morte não necessita gritar, seu canto é inebriante demais para que precise usar de artimanhas menos sedutoras do que o canto das sereias. Eu, no entanto, não consigo mais sequer tocá-lo, e tudo o que posso fazer é sangrar a minha garganta desesperadamente, na vã e vazia esperança de que ele me escute e retorne antes de pular para nunca mais voltar. 

A constatação dessa realidade é um aço frio a cortar a minha alma, e sempre que meu pensamento não se prende a algo ele está a contemplar esse quadro maldito, que se encontra numa exposição macabra sobre a minha própria morte. 

E ele (meu pensamento) não consegue mais se libertar, por isso a imprecisão de dizer que meu pensamento vai livremente para aquele lugar. Ele se encontra preso pelo fardo pesado do meu amor. Será que depois que meu Amado se lançar para os braços de sua amada Morte eu também me lançarei para o abismo da não existência, usando esse mesmo julgo como uma âncora que me puxe mais rapidamente para os confins do Inferno?

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