quarta-feira, 15 de abril de 2020

De visitas inesperadas


Um caráter levemente melancólico toma conta do ser.

Acontece de repente, sem nenhuma explicação. Talvez seja alguma variação hormonal, uma flutuação puramente randômica, ou eu simplesmente não saiba do que se trata... Ela simplesmente vem, aproximando-se lenta como a névoa matutina. Ela impede que a luz do sol passe, eu fico no frio e no escuro, no silêncio do meu próprio coração. 

Como explicar a eles a tristeza em nossos olhos? 
A falta de motivação em viver? 
O gosto pela solidão?

Nem mesmo eu entendo, não sei do que se trata, sequer sei de onde vem. Parece-me que as cores da existência se empalideceram bem diante meus olhos, escorrendo entre meus dedos, tornando-se opacas e cinzas. 

Sinto como se olhasse para um quadro, um belo quadro de uma linda paisagem, que fora coberta pela fuligem da guerra e perdeu a cor. Já não mostra mais as cores das flores, apenas a cinza fria e sem graça.

E então a melancolia uma vez mais toma conta de mim, sem que eu permita, sem que a veja chegar, sem dizer quando vai embora. Levou consigo minhas cores, meus amores e até os meus perfumes. Deixou-me a languidez mórbida do silêncio, como aquelas gotas após a chuva que preguiçosamente caem no chão escorrendo pelas dobras da casa, mas que ainda não foram iluminadas pela claridade do sol. Espalham-se pela frialdade inorgânica da terra. 

E eu também sei que não é apenas como se eu olhasse para esse quadro, eu mesmo torno-me esse quadro, triste e melancólico, ao qual os outros sentem o incômodo de ao menos tacar fogo para ser iluminado pelas chamas e pintando por alguns instantes do laranja avermelhado das labaredas. 

Já me acostumei, a essas visitas inesperadas. Essa melancolia não me é mais estranha. Já não olho mais para a névoa buscando uma saída desesperadamente, correndo sem conseguir respirar. Não, agora eu simplesmente me sento e aguardo que ela se vá. Pode demorar, um dia ou um mês, mas ela sempre se vai, para voltar novamente. É como um eterno ciclo, uma roda do destino que nunca para de girar. Uma morte lenta que termina não na completa escuridão, mas no despontar de uma nova vida, que nasce para novamente vir a morrer-se de amor. E eu morro porque não morro, como disse a pequena grande, vivo sem viver em mim. 

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