sexta-feira, 17 de abril de 2020

Ex nihilo


Eu tentei, realmente tentei, olhar o céu claro do dia e me sentir bem com isso, afagado que fosse pelo calor do sol a beijar a minha face. Mas não foi possível, não tive outra reação a não ser a de voltar a escuridão do fundo do meu quarto, escondendo-me não somente aqui mas também no fundo da minha própria mente, com medo daquela claridade, daquele calor. 

"A visão do homem agora cansa - o que é hoje o niilismo, se não isto?... 
Estamos cansados do homem..."
(Nietzsche)

Cansado de mim, dos barulhos do vizinho, do que vejo na rua e do que vejo quando fecho a porta e os olhos. Não há mais coisa que me dê aquela sensação de esperança, de que as coisas podem melhorar. Tudo o que vejo é uma decadência que parece nunca ter fim, a lixeira da miséria humana que parece cercar a todos nós. 

Minha única reação então é esta, a de me isolar e fugir, como o grande covarde que sou, e de esperar pelo dia que consiga sair ao sol, olhar nos olhos das pessoas, sem sentir que todos caminhamos apenas para o fim silencioso do nada, extinguindo nossa existência no último suspiro de nossas vidas patéticas, sem as respostas que tanto procuramos, sem entender ou receber o amor que um dia sonhamos e que não existe fora das telas e das páginas dos livros, senão que é uma mentira contada com o objetivo de nos fazer crer que existe esperança, quando na verdade, só existe o fim.

E tudo retorna ao nada, e tudo vai se desmoronando. Vislumbro não mais uma paisagem, como as que costumeiramente gosto de descrever, mas apenas um grande vazio. É como se caísse cada vez mais fundo, numa escuridão total que me envolve e me abarca de tal modo que não vejo como poderia sair dela. É frio e silencioso, um verdadeiro nada. Já não sinto dor, medo ou alegria, não sinto nada, é apenas isso, o nada. 

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