terça-feira, 7 de abril de 2020

Do homem pueril

Deve-se ter cuidado, para quem ou como entregamos nosso coração. Corremos o risco, não raramente, de entregá-lo a quem nem de perto merecia tê-lo. É preciso cuidar com mais carinho daquilo que temos dentro de nós, do contrário poderemos apenas estar entregando ao inimigo a adaga de prata com que ele nos ferirá o peito pelas costas. 

Mas isso ainda é romantizar demais a coisa, erro meu. O que aconteceu não foi uma traição qualquer, mas uma abominação, uma covardia inominável. Aquele que um dia me procurou com solícita vontade de aprender agora vira-se para mim com risadas de superioridade afetada, um sinal mais do que claro de uma psicopatia adquirida. 

Pobre tolo! Não só não aprendeu nenhuma de minhas lições como ainda fez exatamente o que disse para não fazer. Entrou na cova do inimigo e fez dele seu amigo, agora sai por ai, desfiando rosários de pérolas de suas imbecilidades ornadas com vocabulário profissional. 

Olavo de Carvalho tinha razão, como sempre, ao dizer que uma pessoa sem alta cultura espiritual mas munida de um diploma superior é nada mais do que um risco para a humanidade. E é isto que ele se tornou: mais um a adotar a linguagem viciada e vazia daqueles que repetem os mesmos cacoetes mentais dos comunistas de quarenta anos atrás com ares de sublime erudição, como se fossem eles mesmos, aqueles incapazes de perceberem as incoerências lógicas, as mais óbvias e pueris da existência, o pináculo da inteligência humana. 

Distando milhares de quilômetros da inteligência que se consideraria razoável para um ser humano médio ele agora demonstra uma percepção ainda mais deficiente do que a de um interiorano iletrado que, ao menos ao seu modo, percebe a realidade como ela é e não como a sua classe de mentalidade corrompida e doentia gostaria que fosse. 

É inútil discutir, seria como tentar jogar xadrez com um pombo ou um macaco. O mesmo iria subir no tabuleiro, bagunçar as peças e sair andando como se tivesse entendido ao menos o propósito do jogo. A inteligência desses já nem deveria mais ser chamada assim, senão que trata-se de um abortivo de inteligência, algo que sequer chegou a formar-se no ventre da verdadeira sabedora, aquela sabedoria presente na realidade mesma, passível de ser reconhecida na presença total de que nos fala Louis Lavelle, que eles obviamente não leram. Não, a sabedoria que de que tanto se gabam é a de destruir sob o pretexto de reconstruir. Uma espécie de alquimia social. 

Mas se alquimia consiste no processo de compreensão, decomposição e recomposição da matéria ou, no caso, da sociedade e sua cultura, eles saltam a primeira etapa como se fosse dispensável e trivial e passam logo a destruição, decompondo tudo o que lhe vêem pela frente, sem se perguntarem, por um só instante que seja, se estão ou não destruindo algo que seja essencial a existência humana, ou ao menos de uma existência minimamente organizada antes do caos absoluto no qual pretendem nos fazer mergulhar. 

Ignoram, portanto, a verdadeira intelectualidade, ao passo que veneram com ares de devoção mais do que religiosa os currículos e diplomas. Um papel assinado por um imbecil dizendo que outro imbecil está apto a exercer tal ou qual profissão vale mais do que o conhecimento necessário para exercer a mesma. Mais valem os atestados intelectuais do que a intelectualidade em si, e essa ação é até mesmo compreensível. A exigência de ler ao menos oitenta livros por ano sobre a área de estudo na qual se pretende conhecer é um esforço demasiado grande se, por outro lado, pode-se ter o peso de um argumento de autoridade afirmado por um impresso emoldurado na parede assinado com letras itálicas de canetas tinteiro. 

Não percebem que suas engravatadas reuniões não passam de balbuciar de porcos vomitando a lavagem cerebral que chamam de formação acadêmica, e é isso que forçam as pessoas a creditarem sob o título honroso de ciência, ou jornalismo, ou pesquisa, ou o que quer que seja. A verdade é que chafurda no lamaçal da ignorância e, pelo pouco que posso apurar, é nele que serão enterrados, com a boca cheia não de terra, mas da podridão que consumiram durante toda sua vida pequena e limitada a impregnação auditiva das palavras de seus superiores, incapazes, que fizeram o brilhante trabalho de os tornarem ainda mais incapazes. 

A era do imbecil coletivo já passou, e talvez o novo imbecil coletivo também já tenha passado, o que vemos agora é a ignorância absoluta, de uma intelectualidade tão baixa e pueril que só pode comparada em termos históricos ao homem das cavernas que, ao menos, sabia que pau é pau e pedra é pedra, sem crer que segundo seus mestres pau é apenas uma construção social e a pedra só é pedra se assim ela se declarar pedra. Nesse sentido o homem das cavernas é ainda mais inteligente do que os jornalistas de nossa época. 

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