quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Solene retorno

One Late Summer Evening, 2019. Anne Magill

Não me incomodaria em descansar mais um dia, mesmo tendo dormido metade de ontem e hoje durante toda a tarde. Me encontro incomodado com o simples fato de precisar sair de casa para me cansar brutalmente pelos próximos dias sem ganhar nada em troca.

Sei que existe toda uma filosofia moral pro trás do trabalho, e até uma teologia, que o vê como um meio de santificação, um serviço prestado ao outro e, portanto, um ato de amor ao próximo. Mas todo que sinto é que por nada, a cada dia, minhas forças vão embora, sendo que parece que eu sou completamente inútil não importando o que faça, o que reforça a ideia de que, embora possa ser um meio de santificação, é também de perdição... Mas a verdade é que eu simplesmente estou expressando minha habitual raiva contida pelo fato de me cansar e não ter disposição para nada mais.

Foram mais dois dias dormindo direto sem ânimo para colocar sequer o pé para fora. De uns amigos estou distante, quem eu gosto continua me ignorando, sou obrigado a voltar cansado e chateado para casa e ainda ouvir o incômodo choro de uma criança que não é minha porque todos os aspectos da minha minha visa estão desalinhados e eu não tenho como mudar isso sozinho. 

Me refugio então no estudo e no sono, principalmente neste último, sem me importar muito com o dano que isso causa no meu corpo, aliás, se isso significar que vou morrer mais cedo, tanto melhor pois, hoje, tudo o que sinto é incômodo, aquele pêndulo, como disse o filósofo, entre o tédio e a dor. 

Sinto dor quando meu amor não é correspondido, ao passo que tudo mais é tédio. O tédio de conversas superficiais, de não ser respondido, de uma liturgia banalizada, de uma moralidade vazia e tosca, de ansiedades inúteis em preocupações. E então sou tomado dessa completa desesperança. Melancólica, entediada, que espera apenas pelo findar, dos dias, da vida, dos séculos... Oh que graça seria ver o universo desfazer, o retornar solene ao nada!

"Pois, para um homem, a tomada de consciência de seu presente significa já não esperar mais nada." (Albert Camus)

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