quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Resposta

Eu não sei como conseguem pensar em tantas coisas, tantas bobagens sem sentido algum. Eu não sei como as pessoas conseguem olhar para o calendário, imaginando o fim de semana e, com isso, pensando na sua realização numa lata de cerveja e em alguns pedaços de carne assada. Eu não consigo. Não vejo sentido em nada disso e, não vendo sentido tudo se torna um incômodo, tudo se torna uma chateação sem fim. Eu não quero nada disso, eu não quero... Ah, mas o que eu quero? Eu quero descobrir o que eu quero, mas eu só sei que não quero isso, não quero ser como os outros que encontram nas pequenas alegrias da vida um sentido maior para tudo o mais. Não. Se o sentido da vida não for algo grandioso, algo que realmente faça valer a miséria que é ser obrigado, eu realmente não vejo porque deveria haver um sentido. 

E eu nem sei o que me deixou assim, simplesmente abateu-se sobre mim, simplesmente fui agarrado por tentáculos gelados que me levaram a uma contemplação horrenda do vazio existência, simplesmente fui tomado pelo peso absurdo de um jugo de mil toneladas, lançado sob minhas costas...

Não sei, mas ainda assim estou irritado, muito irritado. Qualquer um que olhe para mim acaba me estressando. São sorrisos bobos, histórias tolas, perguntas idiotas, e eu não quero isso, quero apenas poder ficar aqui, remoendo a inutilidade da minha existência. Eu não quero ver ninguém, responder ninguém, não quero tomar banho ou comer, não quero ter que responder se estou bem ou se estou com fome, não quero ter que sorrir, não quero... Eu só quero ficar aqui, até que se esqueçam que eu existo, até que eu mesmo esqueça que eu existo. Eu acho que não queria existir, existir é um saco, é um tormento atrás do outro, e é todo dia a mesma coisa. 

O nascer do sol, o início de um novo dia, de um novo dia terrível. O pôr do sol, o fim da vida. Mas não um fim rápido e limpo como o corte de um machado, não, um fim demorado como uma serra, que maltrata, rasga a carne e tritura os ossos antes de permitir a partida. É por isso que o dia é sempre horrível, porque prenuncia a noite mas com vagareza e, quando a noite finalmente chega, é só um breve intervalo até que o novo dia desponte, e as desgraças continuem, uma após a outra, marchando diabolicamente em nossa direção, punhos em riste, para cravar bem fundo em nossa carne as marcas de sua diversão sádica, diversão maldita. Ela ri-se de nós em cada uma das malícias que nos inflige, ela se diverte com cada lágrima, com cada gota de sangue derramada. 

Mas que inferno que não há resposta! Que inferno que parece termos sido jogados aqui sem motivo algum! E se de fato o fomos, e se o sentido da existência for simplesmente existir, por qual razão simplesmente não nos disseram isso? Se pensaram que seria óbvio, existir porque existimos, não o é, não me parece óbvio. A todo momento parece que queremos algo, que estamos em busca de algo, isso porque algo deve ter sido tirado de nós, e é isso que nós queremos, voltar aquele útero de perfeição que perdemos há muito tempo atrás. Mas nem sequer sabemos o que é isso, tateamos como cegos num quarto escuro à procura de um gato preto que nem sequer sabemos se está lá. Mas que raios de existência é essa que não há razão de ser e, se há, donde está que não conseguimos encontrá-la depois de tantos séculos de busca? Mas que inferno de existência é essa que não há resposta? 

E, sendo condenado a ver tudo isso, eu não consigo me comprazer nos divertimentos dos homens. Não é um alívio, não é um momento de relaxamento, é apenas uma tortura sem fim... Mas o que é isso? Que vida é essa? Qual a razão de eu ter de estar aqui? Qual a razão de levantar cedo todos os dias, de ver família e amigos, de ser obrigado a conversar, conviver, me relacionar? Isso é tudo um saco, é tudo muito chato, e até mesmo o fato de escrever isso é um saco. Quem é que vai ler essa porcaria? Aliás, de que vale escrever essa porcaria? De que vale qualquer coisa ou qualquer um de nós? Nossa vida é só u grão, dura o tempo de um bipe, um aceno, não é mais do que um pequeno grão de areia na praia, nossa vida é, no máximo, um nada. E, no fim, quando finalmente deu-se o nosso tempo por esgotado, isso tudo, toda essa porcariada a que somos obrigados a encarar dia após dia, simplesmente acaba. E tudo retorna ao nada, e ainda bem. Só é uma pena que retorne logo. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário