sábado, 18 de setembro de 2021

Aforismos

Fiz de tudo para dormir hoje, numa necessidade que tinha de sumir, de perder a consciência, de ir pra um mundo diferente. Nada adiantou. Os remédios nem fizeram cócegas, e eu tomei bem mais do que eu estou acostumado. Tudo o que me aconteceu foi ficar um pouco grogue, nada demais. Em partes eu fui mantido acordado por um torrente de pensamentos, pensando em nada em particular mas ao mesmo tempo sem conseguir me desligar, e em partes pelo calor, incômodo, que não cessa, não diminui. E tudo que eu queria era poder ficar em off, me desligar completamente, quem sabe sonhar com um mundo sem preocupações, algo cor de rosa. Fiquei fritando na cama, incomodado, impaciente, desejando um silêncio profundo, a pele suada grudando na roupa, a mente sem foco, o coração angustiado.

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As vezes nos entristecemos com as pessoas queridas que se afastam de nós. É compreensível, elas fazem parte da nossa história, de certo modo fazem parte de quem somos, participaram da construção do nosso ser. Mas é preciso aceitar que algumas pessoas, senão todas, são pontes, elas vem, nos levam adiante tomando-nos pela mão e, a certo ponto, nos deixam seguindo o próprio caminho. Significa que ela cumpriu a missão que tinha em nossa vida e que nós cumprimos também nosso papel. É doloroso, principalmente porque queremos que, aqueles que amamos continuem conosco, mas as vezes é preciso abrir espaço pra outras pessoas. A vida é assim, é um pouco cruel, na verdade, mas é a pedagogia do mundo, pedagogia de ferro mas que, ao fim, nos ensina valiosas lições. 

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Uma parte difícil de lidar com as mudanças de humor são as variações na libido. Durante a depressão eu praticamente me torno uma alface, sem desejo algum, mas nas fases de mania é como se fosse tomado por um demônio luxurioso. Sonhos eróticos todas as noites, desejos quase irrefreáveis me consomem, e eu detesto isso, especialmente a carência que acompanha esses episódios, a necessidade de alguém ao meu lado que me deixa tão vulnerável, isso é péssimo, só queria me sentir autossuficiente, ao menos sem esse desejo luxurioso do outro em minha vida. Mas, pelo jeito, é algo que precisarei continuar suportando. Minha cruz, meus próprios desejos, minha própria carne...

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É impressionante como as coisas rapidamente se tornam melancólicas, como as cores vão se tornando opacas, se misturando, perdendo os contornos e adquirindo a fragilidade de uma folha seca. A melancolia se torna então uma lente com a qual se vê todas as coisas, os livros, as músicas, os amigos, tudo se torna sépia, na boca um gosto amargo, parece o fim, mas ainda não é o fim, é o apenas o início do fim. Saber que uma pessoa querida pra mim tentou exterminar a própria vida me deu um choque, me fez pensar, é claro, nas inúmeras vezes que pensei em fazer o mesmo e, com um amargor horrível, pensar em como as pessoas passam por lutas que sequer imaginamos. Quanta dor, quanto desespero ele não passou? E eu nada vi, nada percebi, nem eu e nem ninguém, Somos cegos, estamos cegos, cegos pela melancolia que nos cerca, por essa névoa que no entorpece os sentidos e nos priva da razão. Estamos cegos e caminhamos rumo ao abismo que ansiosamente arreganha seus dentes para nos devorar. 

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