sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Lutas inúteis

"A vida é atroz, nós o sabemos. Mas precisamente porque espero pouca coisa da condição humana, os períodos de felicidade, os progressos parciais, os esforços para recomeçar e para continuar parecem-me tão prodigiosos que chegam a compensar a massa imensa de males, fracassos, incúria e erros." (Marguerite Yourcenar)

Tentando não sucumbir ao clima de intensa ansiedade que cerca nossa contemporaneidade. Já desde bem cedo as pessoa se bombardeiam com uma quantidade imensa de informações e estímulos, nos ônibus já penduradas nos aparelhos se colocando por dentro das últimas novidades sobre qualquer coisa, o último curso, o último divórcio ou traição, o próximo show com as mesmas músicas e mesmas pessoas, os últimos episódios daquela série em trechos recortados... As mensagens devem ser respondidas logo, os prazos cumpridos logo, as demandas imediatas. E todos acham normal, normal viver se sobrecarregando, normal querer atender imediatamente, e então se corroem em ansiedade, em estresse acumulado, se matam e aí? O que resta? Ser trocado por incompetência.

De que adianta toda essa peleja? De que adianta correr, se apressar, não permitir que as coisas se assentem. E não percebem que assim estão se matando! Não que essa vida valha de alguma coisa, mas justamente por isso eu não consigo entender o motivo pelo qual deveríamos nos esforçar tanto em morrer na miséria de um corpo exausto por coisas que, tão logo partiremos dessa vida, serão esquecidas. 

Os corpos dos maiores reis, das pessoas mais importantes que viveram cercadas de tantas outras, se corrompem na mesma velocidade, e aí há um prazo que não aceita prorrogação. Todos vamos apodrecer e nossa memória não será feliz, senão que imediatamente os mais próximos de nós evitarão até mesmo olhar nosso corpo sem vida. A simples menção ao nosso nome uma dor a ser evitada, muitos ainda se alegrarão brevemente com a morte antes de nos esquecer por completo. E assim se acaba a China! E assim se acaba a vida para todos nós. Então, de que vale juntar tantos contatos, no fim se ninguém houver que carregue nosso caixão ao menos os funcionários de algum cemitério o farão, ou ainda os próprios vermes se encarregam de dar um fim a essa carne inútil, e de que adianta se formos esquecidos rapidamente? Não sabemos nem mesmo quem foram os grandes reis de outros tempos que tiveram ao seu redor todas as cortes do mundo... De nada adianta, é tudo assim tão frágil, vazio e sem contorno. Essa é a condição do homem. 

Do mesmo modo tento sobreviver as disputas, desafetos, aos sentimentos e reações exageradas, sabendo que eu mesmo reajo desse jeito muitas vezes. Inclusive ainda ontem deixei algumas lágrimas rolarem enquanto ia embora, cansado, chateado, magoado e esmagado pelo peso da ansiedade generalizada que as pessoas não controlam e acabam jogando em cima de mim, de modo até cruel. E também a disputa por atenção e espaço que eu não concordei em participar e que eu não estou interessado em participar. 

Voltei para casa, depois de um longo dia, de uma longa missa, de não conseguir conversar com aquele moço por estar socialmente exausto, quando nem chorar mais eu conseguia... Voltei para casa e fui dormir. "Sem paz, sem lar, sem pousadas..."

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