Clarice Lispector podia ter dito "se alguém não te quer, parte pra outra" mas ela preferiu dizer:
"Quando fazemos tudo para que nos amem... e não conseguimos, resta-nos um último recurso, não fazer mais nada. Por isto digo, quando não obtivermos o amor, o afeto ou a ternura que havíamos solicitado... melhor será desistirmos e procurar mais adiante os sentimentos que nos negaram. Não façamos esforços inúteis, pois o amor nasce ou não espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes é inútil esforçar-se demais... nada se consegue; outras vezes, nada damos e o amor se rende a nossos pés. Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido. Quase sempre amamos a quem nos ama mal, e desprezamos quem melhor nos quer. Assim, repito, quando tivermos feito tudo para conseguir um amor, e falhado, resta-nos um só caminho... o de nada mais fazer"
Já acordei decidido a não viver esse dia. E sei que fiz isso a semana toda, mas quem se importa. Até me levanto por alguns instantes, atualizo as redes sociais da paróquia, mas de que adianta? Volto a dormir.
Falei sobre isso com minha família algumas semanas atrás, e disseram que iam me ajudar. Mas tudo continua igual. Se passo o dia acordado, me sinto irritado demais com cada pequena coisa. Se durmo demais, fazem com que me sinta culpado por não ajudar. Ainda não comecei a procurar emprego, e já devia, mas cada vez que penso nisso, a única coisa que me vem à cabeça é enrolar uma corda no meu pescoço.
Tenho tomado então um punhado de remédios, uns goles de vinho barato e dormido. Hoje é sexta, poderia dormir até mais tarde, mas amanhã tenho evento e, como sempre, primeiro eu marco as coisas e, depois, prefiro morrer a ter que ir. Isso porque não quero ver ninguém, nem falar com ninguém. Qualquer visão do outro me cansa.
Mais uma vez pensei em sentar e escrever, mas acabei sem inspiração. Talvez tente ler um pouco, e depois volte a dormir.
O barulho sempre me incomoda. Pude ter um brevíssimo momento de tranquilidade enquanto algumas pessoas dormiam e outras não estavam em casa. Me deitei no sofá e coloquei uma gravação da "Sinfonia dos Mil" de Mahler. Não cheguei ao intermezzo orquestral, mas valeu.
Fiquei um bom tempo deitado ouvindo a tempestade ao meu redor. E não me refiro à chuva. Mas quero assistir hoje, até um pouco mais tarde. Não sei como vou organizar meu sono, é impossível ficar acordado o dia todo. Queria pintar as unhas. Fazer a barba. Não sei se vou conseguir.
Assim como acordei decidido a não fazer nada quanto a este dia, também estou decidido a não dar nenhum passo mais em direção a ninguém. Bem sei que não costumo ter uma vontade firme nesse campo e, não raras vezes, acabo cedendo ao primeiro sinal de atenção e carinho. No entanto, os dessabores das últimas decepções deixaram em mim tão profunda descrença que, penso não ser capaz de amar novamente.
Quando fecho meus olhos e examino meu coração, tudo que vejo é como um jardim ressecado, abandonado, num dia que se findou, iluminado por apenas uma pequena arandela que pisca, sinalizando que, como aquelas flores, logo também será apenas um fantasma. Bom, mas o que posso fazer? Não hei de fazer nada.
"Eu escrevia visceralmente, alguns odiavam, outros amavam. Eu não estava nem aí. Apenas bebia mais e escrevia mais poemas. Minha máquina de escrever era uma metralhadora e estava carregada." (Charles Bukowski)

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