sábado, 7 de dezembro de 2019

Mais do nada


O silêncio de um dia triste e vazio. Nem sei por qual razão ainda me incomodo, todos os dias são vazios. Talvez não sejam os dias, apenas o meu próprio âmago, repleto de nada. E de novo cá estou eu, num dia frio, falando do vazio. Não fosse a centésima vez que me sento para falar do vazio não poderia dizer que, do vazio, eu entendo com profundidade. 

E essa pode ser a única coisa da qual entendo. Eu não sei mais nada, não entendo nem ao menos os compassos densos da música que toca ao fundo. Trata da noite, do mistério, da solidão, mas isso é tudo, todo é resto me é como um mistério inexpugnável. A vida não é outra coisa senão isto, um mistério que nos faz buscar por respostas sem cessar para, no fim de tudo, jogar- nos um punhado de terra em nossas bocas e dar-nos como alimento às ruínas. 

Olhei o céu, cinza, triste, e nada me veio. As folhas das arvores estavam paradas, nem mesmo brisa havia para lhes movimentar um pouco. E assim foi meu dia, numa frialdade parecida com aquela que vejo nos olhos das pessoas. 

Olhei-me no espelho e, dessa vez, me reconheci. Um rosto lânguido, macilento, uma expressão vazia. O olhar tão cheio quanto uma tela em branco de um pintor que já falecera. Nem um brilho senão o da oleosidade produzida por meus poros descontrolados. Destes poros não saem outra coisa senão óleo e sangue, vertido pela dor de viver em a uma humanidade tão baixa, tão mesquinha, tão fechada em si mesmo que torna todo monte de terra num horto das oliveiras onde chora o pobre inocente, incompreendido até por aqueles que o cercam.

Meu coração se encheu de ímpetos numa busca por algo que completasse esse vazio. Mas para onde quer que olhasse, nada parecia ser capaz disto. Queria beber, me embriagar, mas lembro-me que a sensação de vazio é ainda maior na ebriedade. De que adianta então fugir para uma breve sensação de torpor para logo ser lançado novamente num deserto de incertezas? 

Fugi então para debaixo de meus sentidos mais baixos, mais humanos. Mas o gosto dos doces não era capaz, tampouco, de me desviar desse verme que corrói as entranhas. É com um sorriso irônico no rosto que eu digo, então, que esta deve ser minha condenação por algum pecado: viver a contemplar o abismo de uma existência em que sou incapaz de enxergar uma razão de ser. 

Tudo o que vejo é decadência. Uma sociedade que desistiu de buscar sua completude nos altos ideais e desceu até o mais imundo dos lamaçais, chafurdando na imundície como animais, travestidos de razão. As luzes da razão não lançam raios por sobre nossas trevas, senão que apenas tornam mais visíveis as nossas misérias, cada uma de nossas feridas podres, exalando um cheiro forte de carne estragada, carcomida pelos bichos. 

E quem de vós há de me dizer aquilo que procuro entender? Se ao que busco saber nenhum de vós me responde não há razão para insistir. Melhor morrer no frio, sem a dor dos espinhos, lentamente matando o ouriço de Schopenhauer. Lentamente matando a vontade do coração corrompido do homem de preencher o vazio com o outro, que também não é muito mais do que uma casca vazia. 

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