segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Brisa fria


Gosto da brisa fria dessa época do ano. O sol estava a pino pouco tempo atrás, mas agora deu lugar a pesadas nuvens de um cinza escuro. O céu se prepara para descarregar sua fúria sobre os homens. Ou talvez sejam suas lágrimas? 

Escuto os urros graves que fazem as janelas tremerem. Os relâmpagos iluminam o quarto por um instante, um flash roxo e amarelo. Ah quem há de ousar desafiar esse poder? Quando a tempestade grita, todo o mundo se cala para sentir na pele, ou nas filhas, as gotas pesadas e grossas. 

Como as gotas que escorrem do rosto daquela mãe preocupada com seu filho, que não vai mi voltar mesmo depois de tantos anos. Ou como aquele homem que vê sua amada partir de seus braços. Também não há como enfrentar essa força, essa mão invisível que nos guia de alguma forma, que une a todos num só rebanho de condenados, como disse o poeta.

Uma florzinha perdeu uma pétala, e chorou. A petalazinha voou, rodopiou ao vento frio, passou soprando na cabeça de uma criança e caiu, no chão, de onde nunca mais saiu. A flor que ficou sem pétalas, o piano que se silenciou, a águia que deixou de voar, a voz que não canta mais...

Me vejo nessa brisa, apenas um prenuncio de algo grande, a brisa que vem antes da tempestade. Mas eu nunca sou tempestade, sou brisa, brisa fria, sem entusiasmo, sem alegria.

Essa brisa fria também me lembra aquele sentimento amargo, de um amigo que um dia te abraçou com tanta força que suas pernas falharam. Mas que depois de foi, pra nunca mais voltar. Ou daquele que enterrou sua mãe, pranteando-a ao lado do caixão lustroso, triste pelo tempo em que ele fugiu de sua companhia, agora inalcançável. É, é uma brisa fria e triste, mas eu gosto dela. Não da dor, essa não, mas do simples soprar fresco em minha pele.

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