sábado, 15 de fevereiro de 2020

Durante éons

Toda epopeia traz tantos elementos que poderiam ser discutidos num livro inteiro, ou numa noite de vinhos e risadas. Mas a forma como abordaram coisas como o desconhecido, o universo como ponto de chegada e de partida, o homem como salvador de si mesmo ou um grande herói divino, a dor, o medo, a saudade... A perspectiva da morte, do esquecimento, o envelhecer, o que pode ser feito durante uma vida e o que está acima de cada um de nós e o que está sob nosso alcance mas ainda não sabemos...

O homem almeja explorar a vastidão do universo, mas nós mesmos já somos, per si, universos, ora distantes, ora conexos, mas que independentemente da distância nunca coexistem sozinhos. A solidão gera a loucura, a desesperança. A união, o estar junto de quem se ama mesmo sob a distância de anos, é o que torna os nossos universos particulares capazes de tocarem uns aos outros. Das mais diferentes maneiras.

Esses momentos, raros e únicos em toda a existência, fazem com que nós, meros observadores, nos sintamos cada vez mais desejosos deles participar. Desejamos compreender, desde dentro, os laços de amor e afeto que ligam as pessoas. Entender até onde vai seu medo, suas aspirações, até onde seriam capazes de ir para satisfazerem seus desejos mais profundos de conhecimento, de desbravar as areias inexploradas das praias, os anéis nunca vistos ao redor de distantes planetas, e o brilho de poeira cósmica de tantas galáxias... 

Mas o que coisas a tantos milhares de anos-luz daqui têm a ver comigo? Dentro de mim há justamente um mundo igualmente vasto e igualmente inexplorado. Dentro de cada um de nós. E eu vejo algumas pessoas, elas me atraem como a inexpugnável força de um centro gravitacional. Isso me incomoda, é como se estivesse, de algum modo, preso a elas. 

Mesmo depois de tantos anos, uma foto, um sorriso qualquer, ainda desperta uma cascata de sentimentos, explosões de supernovas, estrelas cadentes que pintam o céu de centenas de traços luminescentes. Meu universo particular é repleto de beleza e caos, como o mesmo inexplorado que agora eu observo pela janela da sala. Me encho de fúria, como as colisões de asteroides com as superfícies de planetas habitados, destruindo a vida de bilhões. Me encho da contemplação do nascimento da vida, lenta e timidamente, durante eras que se estendem para muito além da existência simples do homem. Como pode, a beleza, ser ao mesmo tempo tão inebriante e hipnotizante e assustadoramente destruidora? 

Parece, às vezes, que minha história também segue assim, ininterruptamente durante éons, sempre perdido em meio a este universo mas igualmente preso a ele, fascinado pelos universos próximos mas igualmente incapaz de tocá-los por alguns instantes que seja. 

Daí o medo, a insegurança, a solidão diante da vastidão de estrelas e sistemas que há rodeando o nosso ínfimo e insignificante poeira, onde somos menos do que um grão de areia no deserto. Que poderia nossa limitada inteligência fazer diante de tão grandiosa existência? A realidade é, absoluta e irrevogavelmente implacável em sua própria existências. 

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