quinta-feira, 4 de junho de 2020

Sobre ver

Queria poder ver, quem é você de verdade, ver o que há por detrás do seu olhar, saber aquilo que esconde no seu íntimo. Mas eu consigo mais ver, não consigo mais olhar para as pessoas como antes. Agora eu só quero distância, só quero estar seguro e a salvo de toda malícia que me podem fazer. 

Mesmo que o que eu veja seja belo, mesmo que tenha toda essa doçura e delicadeza, que sua empatia seja algo a se valorizar eu não consigo ver mais do que isso. A verdade é que eu agora tenho medo das pessoas. A visão do homem cansa, mas também assusta. De perto todos podemos ser frios e assustadores, e eu não quero mais ver ninguém de perto. Não quero mais ter nenhum contato com o íntimo que me pode me queimar, com as espadas que podem me ferir, com os escudos que podem me afastar. 

É uma contradição, eu sei. Mas é isso, essa é a tensão que há em mim. O desejo puro de me aproximar de alguém, de tocar um coração. E o medo de me aproximar e ver de novo aquele olhar, que guarda maldade e ambição, que eu via e fingia não saber. 

Acho que passei tempo demais tentando entrar onde não era bem vindo. Agora eu não mais procuro abrigo nos corações, e nem de porta em porta desejo entrar. Eu apenas aguardo, sentado no meu jardim fechado, o dia que alguém de bom grado abra seu coração para mim. E se não acontecer, ficarei para sempre a observar essa fonte lacrada, essas águas prateadas que esboçam o que, no meu íntimo, eu realmente desejo. 

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