segunda-feira, 19 de setembro de 2022

Asfódelos e o Anjo

Eis que entram na sua morada mais íntima e lhe arrancam da alcova com a delicadeza com que um pugilista acaricia seu adversário, verdadeiro inimigo, a quem deseja a morte eterna. E, roubando-lhe a voz, sopram sobre ti a sua lei com a calma de um tornado que varre a terra e lança aos céus e depois debaixo dos escombros a vontade que antes se escondia embaixo dos lençóis. E embaixo de cinco palmos lhe arrancam o corpo, expondo-o a execração, mas ele já não se abala - ora, está morto!- e morto continua ainda que lhe coloque o garboso terno para dizer ao mundo que os que o criticam não aceitam crítica e, afirmando não haver verdade o obrigam a tomar isso por verdade, e ele só dormia sua morte, expondo agora a podridão da sua carne e o incômodo dos vermes que lhe reviram o túmulo. 

X

Um domingo tranquilo depois de uma semana agitada. Não precisei me virar para fugir do sol, mas aproveitei o dia fresco e um sono revigorante durante a tarde, bem como um breve passeio na baía e alguns momentos reflexivos no trapiche, olhando a água, hoje menos cinza por causa do céu ligeiramente mais iluminado por um sol tímido, e aceitando meus cabelos ao vento sem me importar com a aparência de confusão. Aceitei também com isso a confusão intrínseca da existência, bem como o fundo de ordem onde ela se apoia mas que minha razão e meus sentidos podem se confundir mas que eu sei que está lá em algum lugar. 

Pensei nos longos anos em que fiquei praticamente vegetando em cima de uma cama, saindo em breves e raras ocasiões com os amigos e, depois, nem isso. Eu achei que ia acabar ali, que não ia sair daquele limbo escuro jamais. E, embora eu não esteja feliz e saltitante por aí como um lebrílope, mas conseguir caminhar e ver uma bela paisagem e homens bonitos, acordar cedo e pegar três ônibus até a galeria de arte onde consegui trabalhar me parece agora não um antigo sonho distante, mas algo que, se me dissessem a meio ano atrás, eu jamais acreditaria que seria capaz de algo assim. 

Bom, algumas mudanças já são visíveis, e pode ser que sejam passageiras, como ter de me readaptar com o tempo reduzido para estudar e assistir, e ainda descansar. Essa semana mesmo eu passei bem menos tempo estudando, embora o continue fazendo, e ainda menos tempo escrevendo, mas é apenas sinal de que preciso me esforçar um pouco para continuar mantendo essas áreas numa qualidade aceitável. A começar pelos estudos contanto que a qualidade não caia a quantidade pode ser realocada a medida que eu for adaptando meu corpo a nova rotina. Não deve demorar a começar novos ciclos também e eu vou precisar aprender a administrar os episódios depressivos durante o trabalho. 

São novos tempos, novos ares, mais frescos, em dias nublados, e eu agora tenho uma bela vista para olhar, e vejo que tudo isso é muito bom. 

X

Pensando brevemente em fantasmas distantes que ressurgem da morada dos mortos, com olhos famintos e me fazendo tremer diante de seus olhos frios que tantas e tantas vezes me causaram paralisante temor. Felizmente a existência deles na minha memória é evanescente, como a vida daqueles mortais que iam parar nos Campos Asfódelos, pairando sobre o ser como uma fumaça sem muita substância, mas ainda permanecem lá, em algum lugar, no fundo dos recessos da minha mente e nos pesadelos desconfortáveis sobre a sua indiferença inorgânica quanto a mim. Ficaram no passado, naquela terra distante, mas a sua figura ainda permanece e vai desaparecendo aos poucos...

X

Dew Jirawat me chamou a atenção desde o primeiro episódio de F4 que, por ser um romance que pouco me chamou a atenção eu não dei importância no início mas, foi apenas dada a partida ansiosa e com a temática de clara apelação psicológica para os personagens eu fiquei encantado com esse ator, até então desconhecido senão em uma outra publicação que passava nas redes sociais, um ator que passava, assim como seu personagem, uma energia calma em meio ao caos dos seus amigos, pensando em coisas distantes dali, não sendo violento como os outros e interferindo para ajudar a protagonista indefesa quando necessário, aliás, numa belíssima cena onde ele ativa o alarme de incêndio molhando a sala toda e fazendo os garotos que a incomodavam saírem correndo. 

Desde então tenho dedicado atenção a ele, sempre calmo, algumas vezes com um sorriso discreto no rosto. Mas não parece desinteressado, é apenas na dele, um homem simples, que diverte-se vendo os outros sorrirem. Muito alto, chama a atenção por onde passa e fica incrivelmente elegantes com tons sóbrios, como beges, branco, mais uma vez discreto porém elegante e isso lhe dá seu charme especial. A sensação maior que fica é a da plena tranquilidade que ele transmite, alguém que pode ficar ao seu lado por horas sem conversar e ainda te fazer sentir tranquilo e confortável. 

Vejo ele assim: calmo,calado, com um sorriso simples no rosto, mas presente, e algo nessa atitude dele me deixa a impressão de que ele tem um coração caloroso, como Ren foi com Gorya em F4. Me sinto bem ao ver esse belo anjo pairar por cima das nuvens cinzas dos Campos Asfódelos. É como a imagem do anjo que desperta no homem o temor reverencial mas também o desejo profundo de tornar-se tão divinamente elevado como aquele que parece não ser como nós, mas melhor, e é nesse melhor que eu quero me inspirar.

Não estou dizendo que ele especificamente é o melhor, apenas que seu comportamento e beleza me fazem lembrar da beleza verdadeira e, essa sim, me convida a ser melhor. Ele é instrumento da beleza verdadeira para. 

"Se você não tem nada de valioso para falar, fique quieto. Eu acho que é inteiramente normal pessoas que são amigas, que gostam muito um da outra, ficarem quietas. Essa ansiedade por falar, esse temor pelo silêncio, isto corrompe as pessoas." (Olavo de Carvalho)

Nenhum comentário:

Postar um comentário