sexta-feira, 30 de setembro de 2022

Perspectiva de Sentido

Gostei da proposta de não trabalhar na segunda, posso aproveitar a preguiça na cama enquanto a cidade em polvorosa retoma as atividades, já que no domingo tudo praticamente para. Hoje eu estou me recuperando da eletricidade que percorreu meu corpo ontem o dia todo, num episódio de mania mais forte do que o habitual. 

Na verdade, embora seja bem melhor do que ficar deitado querendo desaparecer, esses episódios também trazem alguns problemas. Em primeiro lugar as pessoas pensam que esse é meu estado normal, quando não é. E fato ele representa um acréscimo de disposição, mas essa não é nem de longe minha condição normal. Eu não sou de falar tanto e, mesmo que seja de postar com frequência nas redes sociais, qualquer um pode notar que passei dos limites. Acontece que eu também fico um pouco inconsequente. Tampouco podia tomar meu coquetel pra dormir, já que o efeito do zolpidem ia com certeza me fazer falar alguma besteira antes de dormir. 

Muito embora eu não me importe com o que pensam de mim a ponto de me arrepender de me expor demais eu sinto que também não queria me mostrar tanto porque é normal depois disso acharem que eu vou ficar assim de modo permanente, e me obrigarem a ter uma energia que eu não consigo acessar. Embora os episódios tenham gatilhos eu não consigo acessar essa parte assim, como quem liga um interruptor, e eu continuo apenas flutuando lentamente de um lado pro outro, às vezes chegando aos extremos.

No outro dia me vem aquela ressaca, felizmente meu corpo não perdeu toda a disposição ainda e eu não me sinto tão cansado, mas certamente algum dia essa semana, quando a energia sumir de uma vez, eu vou sentir um vazio e um peso fora do comum. Me incomoda também, não pelo que vão pensar de mim, mas ver que isso só mostra um grande descontrole, em como parece que eu sou alguém completamente governado por vontades e impulsos incoercíveis, uma besta irracional. 

X

E foi exatamente como eu disse que seria. Apenas dois dias depois e eu já estou não exausto, mas simplesmente sem forças, como se a energia que havia em mim e que se agitava como um mar revolto tivesse simplesmente evaporado deixando apenas uma grande cratera no lugar. Não é cansaço. Quando estou cansado eu sei que preciso deitar e dormir por algumas horas, e só, mas isso é ausência total de disposição, é um estado de existência diminuída, é apenas um grande vazio que parece crescer mais e mais e tapar toda a visão do sol com uma neblina que vai se tornando mais e mais densa. 

Agora, ouvindo uma música melancólica, a qual eu nem sei o nome, eu fecho os olhos e me sinto impaciente. Incomodado, com o barulho da criança no ônibus cheio, com a superficialidade de algumas pessoas, com idealizações idiotas. Mais uma vez eu preciso fechar os olhos e me concentrar no que eu quero conhecer, no que preciso aprender pra dar sentido a minha vida. E a trilha sonora apenas me confirma que isso não é algo facilmente encontrado ao meu redor. Embora eu me refugie nesse mundo onde quero chegar, hoje e, apenas hoje, eu queria poder dormir e sonhar com ele.

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A semana acabou, ou quase já que eu ainda trabalho amanhã, e esse texto que foi escrito em três dias diferentes mostra bem o que aconteceu comigo, ou pelo menos eu tentei mostrar. De absolutamente elétrico até querer deitar e dormir assim que eu chego em casa. Mas eu não posso deixar ser vencido desse jeito, se o fizer logo eu não terei mais vida, vou trabalhar e dormir apenas, e por isso mesmo preciso me forçar a estudar e assistir todos os dias, ainda que indisposto, para conseguir manter o mínimo de uma rotina que sirva pra alguma coisa. 

Amanhã será o dia mais puxado e eu já estou exausto hoje, claramente sentindo os efeitos desse episódio depressivo e também do cansaço propriamente dito, maximizado pela depressão. Minha vontade é de chegar em casa e dormir, direto, mas eu não posso fazer isso. Também tenho mentido, dito que estou bem e feliz, apenas por preguiça de dizer a verdade, e tenho ficado bom nisso, não me fazem perguntas se digo o que querem ouvir. Não exigem muito de um homem além de um trabalho e um espírito de mediocridade. Na verdade, mesmo aqui tendo mais beleza do que onde eu morava, posso perceber que as pessoas não vão muito além de trabalho e divertimentos medíocres, e não parecem nem imaginar algo melhor do que isso. Alguns tem mais acesso a cultura, claro, mas também parecem ver isso apenas como um adorno superficial, não muito além disso. 

A essa altura fica claro que o trabalho é necessário porém exige um sacrifício por parte do intelectual que muitas vezes se vê exaurido e não pode examinar corretamente as suas questões. É por isso mesmo que devemos nos apegar a essas questões para conseguir manter uma busca constante, ecoando o conselho do Professor Olavo: "Não parar, não precipitar e não retroceder." Mesmo que eu diminua o ritmo não posso parar, é o apéiron que vem me dando alguma perspectiva de sentido nessa vida, apenas isso. 

Já percebi que, para perseguir a verdade, preciso me acostumar com esse Trabalho de Sísifo, as coisas são assim, mais uma vez torna-se urgente ter paciência. 

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