quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

O Roteiro Real


Ó caríssimos poetas, indivualidades subjetivas e demais homens de sensibilidade aflorada, permitam que sente com vocês para tomar de alguns copos, mas sem tomar partido das rodas de declamação que se seguem. Permitam que eu contribua com a minha apatia, que eu traga apenas em mãos a profundidade de não sentir nada por algum tempo. 

Vinha me sentindo orgulhoso por não imitar Balzac como acabo fazendo toda vez que mergulho em algum livro mais denso por um tempo maior. Preciso apenas fazer um breve excurso e dizer que "Curso público e gratuito das contas de recâmbio para os que não estão em condições de pagar as suas promissórias" é o melhor nome para um capítulo que esse verme endividado por besteiras consegue se lembrar. Um brinde aos gastos inúteis que eu achei absolutamente úteis, justos e necessários e que algum bom deus da generosidade pague a conta! 

São já 2h55 da madrugada, numa cidade que não está bêbada, mas que dorme profundamente seu cansaço infindável. Eu aproveito os últimos dias de um episódio eufórico e da energia extra de um energético, que já não faz efeito como alguns meses atrás. Assim como meus remédios já não funcionam como antes. Já vi um filme inteiro, vários episódios de série, sem realmente prestar atenção em nenhum deles. Li alguns capítulos do Evangelho mais cedo, contos eróticos, posts idiotas... Nada disso conseguiu capturar minha atenção, a única coisa em que consigo pensar é num tesão crescente e nas minhas hemorróidas. Talvez hoje eu conseguisse acompanhar aquele garoto louro e com um alto nível de TDAH, e eu talvez eu implorasse pra ele me comer até que me cansasse. 

X

Novamente lutando para não ser engolido pela profusão de palavras que me rodeiam. Minha música interior carece de ficar mais alta do que nunca. Não posso deixar que o mero cansaço mental me faça desistir de tudo o mais.

Bom, isso não ficou claro o suficiente. Não é que eu tenha medo de perder alguma esperança elevada, não, mas digo também referente as pequenas coisas. Não quero deixar que o cansaço apenas me faça querer chegar em casa e dormir, quero ao menos conseguir caminhar um pouco antes disso, para que, ao fim, a noite não seja tão simples e sem graça, já que tudo o mais parece triste e sem graça. 

Acabo sempre cansado demais, ansioso por finalmente consegui relaxar, na minha cama, tomando uma taça de vinho ou sei lá o que mais... Perdi a conta de quantos remédios tomei ontem, sei que, lá pelas tantas, já estava tonto e não conseguia dizer nada, mas ainda prestava atenção na música e com a mente desperta, um inferno. 

X

Hoje já me veio uma necessidade de tranquilidade, de me sentar na varanda, com uma bebida ao lado e sentir a brisa antes de dormir. Não tenho conseguido fazer isso, ao fim do dia o cansaço é demais, nem consigo mais raciocinar direito sobre as séries ou as aulas que assisto, o corpo e a mente em estado permanente de exaustão e, com isso se vai embora toda e qualquer vontade de relaxar, já que o corpo necessita de um tipo de descanso desesperado que, por mais horas que durma, nunca o descansa realmente. 

Num paralelo bobo mas que me veio nesse momento é foi o sentimento que tive ao ver uma série japonesa que estreou recentemente. Perfect Propose apresenta um protagonista que se encontra em estado de completa exaustão há anos. Sua primeira cena é final conseguindo um tempo pra observar o belo céu noturno, deitado no chão no meio da rua. Ao reencontrar um antigo amigo que ele não via há mais de dez anos e que se convida para morar com ele, invocando uma antiga promessa que ambos fizeram na infância de se casarem um dia. 

Depois desse absurdo argumento inicial eles começam a morar juntos e, em pouco tempo, a qualidade de vida do protgonista dá um salto. Antes ele sofria de uma insonia que o deixava sempre cansado, o que já impactava diretamente no seu rendimento no trabalho. Sua alimentação sempre fora precária: com pouco tempo e disposição ele apelava para comidas prontas e suplementes que, logo perderam o sabor e o efeito, mas agora ele tem um parceiro que cozinha todas as refeições que ele mais gosta. Que conversa com ele, que o apoia. Esse ambiente acolhedor o torna mais caloroso também. 

É bonito ver como ele recupera a cor, como passa a se cuidar mais, e vai então deixando de lado aquela apatia de antes, quando prestes a sofrer um burnout. 

Mas é claro que eu sou maduro o suficiente para saber que isso não passa de um roteiro, e que a vida encontra sim o seu fim na exaustão. 

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