terça-feira, 5 de novembro de 2019

A voz do vento


Quando você ler esse bilhete, 
já estarei na rodoviária, 
quem sabe até na auto estrada
viajei pra uma cidade
chamada solitária...

(Solitária - A Banda Mais Bonita da Cidade)

Me sinto assim, viajando, por estradas desconhecidas, agrestes escarpados, altas montanhas e grandes pradarias... Me sinto numa excursão cujo destino ainda não conheço, mas já vislumbro diferentes mundos que antes não podia ver.

Há pouco anoiteceu, e o campo em que estou sentado se estende infinitamente à minha frente, com cores escuras que revelam um mistério audacioso. Por sobre minha cabeça um oceano de estrelas num manto azul escuro me hipnotizam, as luzes no céu são como uma miríade de fogos de artifício. Não sei o que são aquelas luzes mas a beleza delas é algo de um idílio sem igual. 

Fico aqui, deitado sozinho, na companhia apenas das estrelas e das luzes que ressoam até os cantos mais longínquos da terra. Não quero ir embora, está é uma paisagem que poderia observar para sempre, e olha que para sempre é muito tempo!

Não disse à ninguém que viria, e também não trouxe comigo nada que pudesse me fazer comunicar com eles. Estou na companhia de minha jornada de autoconhecimento, observando o céu estrelado e, ao mesmo tempo, o meu céu interior, tão cheio de estrelas quanto este que é sustentado pelos ombros fortes de Atlas. 

Será que sentem a minha falta? Eu acho que não. Nunca fui importante o suficiente para alguém me querer por perto e, quando ainda assim insistia em ficar por perto o barulho que todos faziam era ensurdecedor demais para mim. O mundo é ensurdecedor demais, mas não esse mundo, não aqui, onde tudo o que escuto é a voz soprosa do vento.

Sinto uma brisa fresca soprar meus cabelos, um aroma doce de flores me inebria, são os campos de canola da Polônia que trouxeram aquele cheiro até aqui. O aroma me faz recordar de casa, uma memória doce e já bastante distante. Eu também me lembro dos motivos que me fizeram partir, das razões que tenho para estar aqui.

A vida que vivia já não mais me respondia as questões que tinha. Minhas companhias me faziam sentir ainda mais sozinho. E então percebi que deveria realmente conhecer a solidão de um peregrino que busca encontrar-se nessa terra sem respostas fáceis, nesse chão que pisa nossos sonhos e destrói nossas convicções como um moinho. 

As montanhas ao longe parecem ser a nascente daquelas luzes. Será que consigo chegar até lá? O que será que conseguirei ver ao chegar ao topo da montanha? Talvez um mundo visto de cima faça mais sentido, talvez a vida vista de fora seja mais vida do que a vivida de dentro. 

Bem, é isto, pego a minha mochila com meus poucos pertences, jogo às costas e me coloco a caminhar novamente. Nem sequer há uma estrada, apenas sigo aquelas luzes, ou o caminho das estrelas, ou quem sabe ainda o cheiro das flores... Sigo algo que me chama, em algum lugar, e que ainda não sei o nome, sigo e procuro encontrar, e preencher o vazio de meu coração. 

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