quinta-feira, 28 de novembro de 2019

O caos e o torpor

Senti-me no direito de me recompensar, marcando eu meu próprio corpo um símbolo da persistência, por estar ainda insistindo nessa existência. Assim como todas as minhas outras tatuagens essa foi feita de modo a marcar uma fase. Mas essa não é uma fase boa, essa mostra que eu sobrevivo em meio ao caos, não foi feita após a tempestade mas durante a própria tempestade. 

Aos poucos eu vejo o pouco de ordem se esvaindo novamente de minhas mãos. Mais uma vez olho no espelho e vejo o descuido se manifestando outra vez mais... Meu cabelo está sem forma, oleoso, feio. Meus lábios estão rachados mesmo que eu tenha uma dezena de produtos para cuidar deles. Minha pele continua seca e escura, muito embora boa parte do meu armário esteja ocupada com cremes. Não tenho, no entanto, forças para usar nada disso, e continuo comprando na esperança de que algo mude, de que consiga ser um pouco melhor... É sempre assim, a minha autoestima cai e eu paro de me cuidar, por parar minha aparência fica cada vez pior e isso detona ainda mais a minha já combalida autoestima. É um ciclo vicioso. 

Minha cama está por arrumar há semanas, a poeira cobre as minhas coisas e até mesmo as atividades do curso eu deixo todas para a última hora. Minhas obrigações do trabalho estão todas atrasadas, e não consigo me importar em corrigir nenhuma delas, tenho sido nada mais do que um professor relapso. Se resolvo fazer algo, sinto sono. Se deito para dormir me perco em pensamentos sem nexo algum. Meus dias tem sido monótomos e repetitivos, mas isso não faz com que eu tenha vontade de mudar. Não tenho forças para ser diferente. É um torpor absoluto. Não consigo me empolgar com nada além de algumas poucas sinfonias grandiosas, mas temo que até mesmo elas percam seu brilho com o passar do tempo. 

Como chafurdar na lama eu me sinto cada vez mais sujo, cada vez mais distante dos meus ideais e cada vez mais absorto em meus próprios pecados. Muito embora a minha lascívia tenha se esvaído como fumaça no vento eu ainda me sinto preso num mundo de luxúria bruxuleante. 

Me sinto sendo lançado numa água revoltosa que me sugou todas as forças, que me cansou de tal modo que já não consigo mais nadar. Vivo uma vida ao vento. Sem rumo, mudando a cada momento. Sem ordem alguma, apenas indo para todos os lados. Suportando as ondas e golpes mortais do destino. Suportando os abandonos, as risadas, as maledicências. Mesmo sem saber até quando conseguirei suportar, até quando farei valer o simbolo que agora estampa minha barriga. 

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