domingo, 27 de dezembro de 2020

Dias solenes

23 de Dezembro - Primeiro Dia

E dá-se o tiro de largada! Algumas épocas do ano são sempre mais intensas do que outras, em especial a Páscoa e o Natal são tempos de maior intensidade, e exigem mais do tempo e do esforço de quem prepara as celebrações na igreja. O dia 23 de dezembro é sempre marcado por essa ansiedade crescente, a espera pela vinda do Senhor que está logo ali, o Advento terminando e eu repassando cada detalhe das missas mentalmente, torcendo para não ter esquecido nada. 

Infelizmente nem tudo sai como planejado, e esse ano já desde o fim de semana passada as coisas não aconteceram com eu esperava. Alguns atrasos em serviços contratados me obrigaram a adiar a investidura dos novos coroinhas e até agora eu não consegui uma data ainda. Depender de prestadoras de serviço exige uma dose a mais de paciência, o que é bem difícil de se conseguir em dias assim. 

Ademais, as orações estão digitadas e impressas, o roteiro pronto e entregue a todos os responsáveis, as escalas feitas, os estoques refeitos e contados uma dezena de vezes, ensaios marcados. O que poderia ser feito já o foi. Agora é esperar para coordenar cada equipe na preparação imediata de cada celebração. E, como não poderia deixar de ser, uma ansiedade crescente vai tomando conta de mim. Sabe, uma insegurança, um medo de que algo não dê certo em cima da hora. 

Em dias assim a fadiga acaba cobrando uma taxa maior do meu corpo e da minha saúde e, geralmente, termino bem cansado quando finalmente acabam as celebrações principais. Já estou com o corpo quase no limite pelas noites insones, as constantes revisões dos ritos, as incontáveis mensagens trocadas entre coordenadores e líderes. Me sinto, muitas vezes, sozinho, mas eu sei que não estou. Também vejo muitos irmãos se esforçando em fazer a sua parte. Mas, ainda assim, quando me vejo sozinho na cama, com o corpo dolorido e a cabeça ainda alerta depois das três da manhã, é quase impossível não se deixar tomar por um leve sentimento de abandono, não com relação a mim, mas com relação ao sagrado. 

Parece-me que as pessoas fazem as coisas porque eu as peço para fazerem, dificilmente vejo alguém tomar a iniciativa de se preocupar com algum detalhe. A tolha está bem passada? As flores estão devidamente dispostas, as alfaias estão prontas? O incenso? Sabe, coisas que não me deixam dormir e que, ao meu ver são de grande importância, mas que passam desapercebidas aos demais. Claro, eu estou generalizando, mas ainda assim é o sentimento geral. 

Não posso deixar de traçar um paralelo com o mesmo abandono que a Sagrada Família, que vamos celebrar no próximo domingo, sentiu ao não conseguir encontrar lugar para ficar em Belém, tendo nascido o Salvador junto aos animais. É Cristo que nasce de novo, esquecido por muitos, mas adorado pela realeza que vem de longe sem poupar esforços para vê-lo.

27 de Dezembro - A Última Solenidade

Bem, é isso, depois de dias intensos finalmente deu-se o "Ide em paz" da última celebração. Depois de uma grande missa solene da Noite de Natal, com um coral cantando a Missa de Angelis, de uma celebração marcada pela ressaca geral das pessoas na manhã do Natal, de uma bela missa a noite, de uma celebração que começou com mais de vinte minutos de um atraso inadmissível e de uma Solenidade dos Patronos, a Sagrada Família de Jesus, Maria e José, cheia de correrias e adaptações, finalmente terminou. A próxima solenidade é apenas no dia 1° de janeiro, no fim da semana, mas nem de longe se compara com a dificuldade de todas essas celebrações, carregadas de responsabilidade pelo peso espiritual que cada uma delas para a comunidade cristã.

Eu estou absolutamente exausto, e isso porque tenho dormido os dias quase todos. Acontece que a ansiedade constante não me permite relaxar mesmo dormindo, e não é raro que eu fique até uma ou duas da madrugada pensando nesse ou naquele detalhe que poderia ter sido melhor ou no que eu terei de fazer. 

Nem tudo saiu perfeito. Houveram atrasos, pessoas sem compromisso que desapareceram jogando sob mim e outros uma responsabilidade extra, houveram momentos de tensão, broncas, mas também houveram coisas boas. Não posso deixar de me lembrar da emoção que foi ouvir uma missa cantada em latim pela primeira vez em minha comunidade. A solenidade dos cantos, dos gestos, a sobriedade que confere uma dignidade ímpar, a beleza das cores e das flores, o perfume do incenso, tudo isso me deixou extremamente satisfeito. 

E é assim, agora deitado eu posso finalmente relaxar. A noite muito provavelmente será de um sono pesado, finalmente descansando de toda tensão. Mais alguns dias e posso começar a pensar nas celebrações do próximo ano, mas isso daqui alguns dias, mereço ao menos alguns dias de férias. 

Me sinto leve, satisfeito, com algumas anotações para continuar melhorando nos próximos anos. Espero ter a graça de ainda poder celebrar muitos natais, com crescente solenidade e proveito para minha alma e a de minha família. Que assim seja!

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