quarta-feira, 2 de agosto de 2023

Intimidade pura

Pouquíssimo restou daquela impressão, que começou logo cedo com as cenas de Sakurai Yuki e Takamatsu Aloha que me marcaram e emocionaram antes mesmo que o sol nascesse e eu começasse a me preparar para o trabalho. 

Enquanto aquele pobre, traumatizado por tantos anos, chorava sem forças de se debater contra o demônio que por sobre ele lhe ameaçava aquela pureza tão íntima que, aquele tempo todo, ele mostrara apenas ao seu primeiro amor. E em todo esse tempo ele jamais saiu de sua mente, tudo o que ele fez, desde o complicado aprendizado de uma nova língua até a construção de uma personalidade que o protegesse de todos os outros foi em função de se guardar unicamente aquele que ele queria se entregar verdadeiramente.

"Como era estranho aquele menino! Impenetrável. Absolutamente impenetrável. Insensível a tudo, censuras, elogios, afetos, bons tratos, castigos, não importa o quê." (Octavio de Faria)

Mas aquela imagem era apenas uma construção. Bem forte, é verdade. Forjada no aço e no concreto para esconder uma fragilidade pavorosa. Nesses anos ele até mesmo tentou ter algum tipo de intimidade com um amigo próximo, próximo mesmo, mas sempre fracassava. No entanto, quando finalmente encontrou seu antigo amor nos corredores claros da empresa, ele percebera que aquilo que ficara guardado durante tanto tempo, algo tão precioso e tão íntimo que ninguém sequer vira novamente, poderia uma vez mais ganhar vida e tornar a luz.

Mas aqueles demônios ameaçavam tudo isso. Monstros, verdadeiros monstros que, com olhares, sorrisos e rápidos gestos destruíam o frágil castelo em que ele se refugiara naqueles últimos meses. De longe os melhores de sua vida, acordando ao lado dele, se refugiando depois de um longo dia de trabalho em seu abraço quente e carinhoso, encontrando aconchego naquele sorriso doce e, nas noites longas de amor, naquelas costas e peitos largos, toque gentil e amor que nunca acabava. 

Suas lembranças naquele momento obscuro, sitiado por aquele general corrupto, era apenas seu belo quarto, com a luz da manhã a entrar por entre as cortinas brancas, banhando tudo de uma clareza limpa, singularmente pura, assim como era puro o sono do seu amigo, daquele que ele tanto amava e que, ao seu lado, experimentava a tranquilidade de um mundo que, nas paredes daquele apartamento, estava longe de todo e qualquer perigo, sem demônios a rodear, diferente daquela sala escura em que ele, caído ao chão e arfando ao peso dos golpes violentos daquele monstro, ele encontrava o seu triste fim, depois de uma breve vida da intimidade mais pura. 

Aquela visão, aquele abraço genuíno carregado de sentimento e cuidado, cada toque, cada momento de profundo respeito, todo aquele quadro branco sumia repentinamente na escuridão sob a voz estridente daquele que o machucava... 

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