quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Um ano depois

Um ano. Cheguei, sonolento depois da viagem de ônibus de Curitiba até aqui, numa Joinville úmida e que me prometia muita chuva e, poucas horas depois de chegar já começava a ficar o céu cinza e a chover, pelo menos não mentiram. E então foram três semanas sem que eu visse a luz do sol, amando esse clima bem diferente daquela secura do centro-oeste.

E claro que, depois de um ano eu consigo traçar mais ou menos o que se passou comigo. Depois de meses de profunda escuridão, de uma infindável depressão em que muitos dias eu só conseguia assistir séries e comer macarrão instantâneo, em que minha barba crescia sem controle e eu não tinha força nenhuma para apará-la, em que eu abandonei as roupas que ficaram apertadas pelos mais de vinte quilos que eu engordei, e passei a andar também maltrapilho, ficando fora de casa por apenas umas poucas horas na missa de domingo. 

Me lembro de, quando minha família decidiu se mudar, e eu chorava muito, e muitas vezes disse isso aqui, que não conseguiria. Como alguém que já nem conseguia mais tomar banho sozinho ou se barbear teria forças para ir para o outro lado do país tentar uma vida nova?

Mas eu consegui. Consegui forças para colocar dezenas de caixas naquele caminhão enorme, consegui forças para comprar passagens de avião e, quando cheguei aqui, antes de me deslumbrar com o que quer que fosse, tive forças para contatar algumas imobiliárias, visitar a cidade toda atrás de uma casa que coubesse a todos nós, fechar contrato em um dia e meio e descarregar o caminhão todo na casa nova. Além de contratar um serviço de internet e, sem deixar atrasar as séries, já começar a procurar um emprego, que me chamou em menos de uma semana, sem que eu sequer tivesse roupa adequada para vestir, mas tinha o conhecimento de anos de estudo, e onde em algumas semanas completo um ano de serviço, duas vezes promovido e com grande aprovação. 

Consegui, e visitei lugares incríveis, conheci pessoas interessantes e continuo lutando para fazer amigos. E nada disso eu imaginava ser possível para mim, eu achava que tudo estava acabado ali, naquela cama que já tinha um fedor insuportável de suor das muitas horas que eu passava lá. Eu não podia sequer imaginar ser possível. E não estou dizendo que o que tenho aqui é perfeito, até mesmo porque nem procuro isso, mas o que eu tenho eu nem mesmo achava possível. Mas eu consegui, alguma coisa eu consegui. 

Hoje tenho vinhos, séries, skincare, séries, café e energético, séries, muitas responsabilidades, meninos bonitos em todo lugar (que nem olham para mim mas são um deleite aos olhos assim mesmo) e mais séries. Hoje eu consigo levantar cedo, tomar três ônibus até o trabalho, ler nesse meio tempo, resolver vários problemas, atender centenas de crianças numa semana, voltar pra casa, estudar, preparar aulas, ajudar na pastoral, e ainda levantar no outro dia, incluindo passar por grandes maratonas como foi nas última semanas. Eu o eu daqueles tempos nem mesmo sonhava ter forças para isso.

E mesmo que eu continue imerso em melancolia ainda reconheço. É, as coisas melhoraram sim. 

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