domingo, 21 de março de 2021

Profundidades

Observar, nomear, dar sentido as coisas, essas me parecem algumas das atribuições mais básicas do homem. Desde Adão no jardim que teve como missão dar o nome aos animais a humanidade continua dando nomes e sentido as coisas que a cercam. Eu me pego muitas e muitas vezes tentando entender a razão por trás do ser, claro, quase sempre sem algum sucesso, parece que as coisas existem porque sim e isso é tudo o que eu posso dizer sobre elas. Mas ainda assim não há como evitar esse ímpeto de querer entender, como uma criança que importuna a mãe de perguntas também o simples ato de abrir os olhos me enche de perguntas. 

Me pergunto, nesse momento, da razão para escrever. Mesmo sabendo que pouquíssimas pessoas leem o que eu escrevo, e que deveria investir em algum técnica de compartilhamento pra alcançar mais pessoas, eu ainda continuo sentindo essa vontade. Parece que as coisas se acumulam, de algum modo, dentro de mim. Eu vou observando, meditando, guardando, mas logo transborda, e a única forma que eu conheço para colocar tudo isso para fora é escrevendo. Ainda que minha habilidade seja limitadíssima, e eu sempre repita os mesmos giros de linguagem na tentativa de que eles consigam expressar com a maior verossimilhança possível o que se passa dentro de mim eu continuo precisando me expressar por palavras, cada sentimento que me vem, seja a alegria singela de conseguir uma pequena vitória, como fazer uma maquiagem ou dançar no TikTok, ou as experiências mais cruéis, como sentir-se traído e esquecido. 

Essas coisas se juntam em mim, e parece que só as palavras têm o poder de, como um cálice, pegar um pouco disso e derramar fora do meu coração. As palavras são aquilo que transborda da minha alma e parece que, se não escrever, eu ficaria paralisado com tantas coisas para sentir. 

Muitas vezes é difícil conseguir dizer o que se passa aqui dentro, e me vejo como uma criança balbuciando sem conseguir dizer o que realmente se quer dizer, mas ainda assim é alguma coisa. Ao menos quando leio ou estudo aprendo novas formas de dizer e, pouco a pouco, vou formando minha própria forma de contar ao mundo o que se passa em mim. 

Talvez daqui alguns anos eu consiga expressar melhor a solidão que me acompanha diariamente, o sentimento de vazio e insuficiência, os medos infantis que guardo, a carência que me consome. Mas, por hoje pelo menos, o que me vem é isso: falar sobre a necessidade que tenho de falar, não sobre banalidades o tempo todo, mas sobre as profundidades que há no meu abismo interior. 

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