quinta-feira, 18 de março de 2021

Certeza da Morte

A sentença de morte foi escrita para todo o gênero humano: É homem, deves morrer. Dizia Santo Agostinho: “Só a morte é certa; os demais bens e males nossos são incertos”. É incerto se o recém-nascido será rico ou pobre, se terá boa ou má saúde, se morrerá moço ou velho. Tudo isto é incerto, mas é indubitavelmente certo que deve morrer. (Sto. Afonso Maria de Ligório)

Os dois últimos dias foram, especialmente, mais difíceis e, cheguei a questionar se conseguiria chegar ao final deles, tamanho o desespero que alguns acontecimentos injetaram em mim. 

Como minha mãe não apresentava nenhuma melhora a minha preocupação aumentou e então decidimos pressioná-la para ir ao médico. Qual não foi a surpresa quando o teste apontou positivo para a doença do vírus chinês. O pulmão dela foi bastante afetado, e isso somado a pouca alimentação dos últimos dias resultou na fraqueza que ela vinha sentindo e relutando em melhorar. 

Acho que isso foi um grande choque pra ela. A imagem que se seguiu foi a de minha mãe agarrada a própria existência, como se segurasse com força enfiando as unhas na madeira de um barco prestes a se desfazer em meio as águas revoltas de um oceano em fúria. Elas tinha os olhos marejados, e como sabe que eu sou depressivo tentou esconder, mas sou mais observador do que ela pensa.

Na verdade eu não fiquei triste com isso, pelo contrário, eu vi um brilho no olhar de quem queria viver, de alguém que ainda não tinha desistido. Isso me deixou feliz além da conta, afinal a minha mãe é a pessoa mais importante que eu tenho. 

Ela começou a tomar os remédios corretamente, e a melhora já é perceptível. A apatia lentamente dá lugar a um ânimo tímido mas crescente. Ela comeu bem mais hoje do que nos últimos dias todos, e está se sentindo claramente mais forte e bem humorada. É algo realmente notável. 

Claro que receber a notícia mexeu um pouco comigo, e eu retornei aqueles antigos exercícios espirituais de preparação para a morte. É importante uma visão firme da crença na vida eterna para não se deixar abalar numa situação como essa. O sofrimento humano é parte intrínseca da nossa existência, é consequência do pecado original. A morte, no entanto, não é uma punição, mas uma passagem, e enxergar esse fim é de uma maturidade cristã. Saber lidar com a morte é uma coisa boa, enxergá-la como uma velha amiga, sem desespero, mas com confiança, como ensina São Francisco de Assis. 

No mais agora é esperar que as coisas melhorem gradativamente. Rezar com confiança pois "aqueles que contam com o Senhor renovam suas forças; ele dá-lhes asas de águia. Correm sem se cansar, vão para a frente sem se fatigar." (Is 40, 31) E agarrar-se a vida, não desistir em meio a tempestade, agarrar-se como aquele náufrago que, abandonando tudo ao mar, se prende a única coisa que é verdadeiramente sua: a vida. 

Mesmo sendo eu um niilista que não tem quase apreço nenhum pela própria vida o mesmo não se dá com a vida do outro. O medo se dá em contraste com o medo de perder aqueles que amo, de causar neles alguma dor. Imagine se agora eu desistisse de tudo e desse cabo da minha vida? Minha mãe certamente morreria de desgosto. Ela é tudo o que tenho, e não posso, em hipótese alguma, machucar ainda mais quem tanto se sacrificou por mim. 

Permitir que vos ame, ó Deus digno de infinito amor! Recebei o traidor que, arrependido, se prostra a vossos pés e vos pede misericórdia. Amo-vos, meu Jesus, de todo o meu coração e mais que a mim mesmo. Sou vosso; disponde de mim e de tudo que me pertence, como vos aprouver. Concedei-me a perseverança em vos obedecer; dai-me vosso amor, e fazei de mim o que quiserdes. Maria, mãe, refúgio e esperança minha, a vós me recomendo; a vós entrego minha alma; rogai a Jesus por mim. (Sto. Afonso Maria de Ligório)

Nenhum comentário:

Postar um comentário