segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Resenha - 180 Degree Longitude Passes Throug Us

Contém SPOILERS!

Essa série chamou atenção do pessoal quando foi anunciada porque traria a perspectiva de um tipo de casal ainda pouco abordado pelos BLs: um casal com uma grande diferença de idade. Prometendo então um drama com abordagens psicológicas intensas ela chegou com tudo e já arrebatou todo mundo que começou a ver logo nos primeiros minutos do primeiro episódio por ter uma perspectiva completamente diferente de tudo o que nós já vimos. 

A história gira ao redor de três personagens: a famosa diretora de séries Sasiwimol (Mam Kathaleeya) que, após o falecimento de seu ex-marido Siam, enviou o filho para um internato mas agora tem uma relação de amizade com ele. Wang (Pond Ponlawit) perdeu o pai ainda muito novo, e vive em meio a lembranças, a dor de não ter conhecido ele muito bem e um sonho herdado: o de viajar o mundo, que ele se recorda constantemente com um presente de seu pai, um pequeno globo terrestre de cristal que ele sempre carrega consigo. Ele tem o costume de ver as fotos da juventude de seus pais e nelas sempre aparecem a figura de um antigo amigo deles, Inthawut (Nike Nitidon) e é quando eles encontram esse homem e se hospedam na casa dele que começa uma jornada de descobrimento para o jovem Wang. 

Embora sua relação com a mãe seja íntima ela também é frágil e cheia de segredos, isso porque eles não falam muito sobre a morte de seu pai, apenas repetindo sempre que ele bebia muito e que morreu num acidente de carro. No entanto, quando eles chegam até a casa de In os três começam a ter diálogos que passam a indicar que a relação de Sasiwimol e Siam era mais complicada do que parece, bem como a amizade deles com In, a quem Wang chama de tio.

Não demora muito a série mostra a que veio: os episódios decorrem em sua maioria com apenas os três personagens em longos e poderosos diálogos. Os episódios se assemelham com uma peça de teatro, há poucas variações de cenário, tudo fica por conta da excelente atuação dos três protagonistas. E isso é o primeiro ponto positivo da série: nós somos engolidos por uma série que simplesmente arrebata quem assiste com atuações poderosas dos três. Os personagens são profundos e possuem muitas nuances de personalidade. Sasiwimol é decidida e muitas vezes arrogante, trazendo consigo um certo rancor nada reprimido que ela destila sempre que pode. In é pouco falador, mas sempre traz uma força de sentimentos reprimidos, um passado dolorido que vem à tona cada vez que ele olha para a antiga amiga ou seu filho e Wang, por sua vez, vem querendo saber mais sobre sue pai, além de trazer consigo os questionamentos de um jovem de espírito revolucionário que, no entanto, sente-se perdido. 

Ao redor dessas personalidades eles vão se conhecendo e se aprofundando nas dores do passado e nas do presente, bem como as fugas de cada um, seus medos e desejos mais profundos que acabam aparecendo sempre que alguém diz algo que toca suas feridas. 

Não preciso dizer que a tensão entre Wang e In é gritante desde o primeiro momento, mas o que torna tudo ainda mais difícil, além do preconceito de Sasiwimol e do fato de In ser bem mais velho e amigo de seus pais, é que a relação entre In e Siam logo aparece como sendo mais complexa do que parecia, bem como o jeito que isso afetou o casamento dele e a diretora. E então vemos a proximidade deles crescer, mesmo que a contragosto de In que sente culpa e remorso e o óbvio protesto da mãe.

Todos os episódios, sem exceção, são uma verdadeira obra de arte. Os diálogos são profundos, delicados, repletos de nuances e dão toda a dimensão das dores, medos e desejos deles. A atuação traz um simbolismo e completa com pequenos gestos e principalmente olhares o que é dito com palavras. A fotografia, escura e esverdeada, traz um tom melancólico, como os segredos que vão pouco a pouco sendo revelados. Toda a ação se desenrola na casa de In, no interior, cercada de vegetação, por isso parecendo uma peça de teatro, se passando num palco partilhado pelos três. Quem assiste se vê imerso por eles e deseja assistir mais e mais, querendo conhecer mais do passado e ver como irão superar isso agora. Até a trilha sonora, com a faixa título sendo cantada por Pond, ajuda na construção de uma aura dramática crescente, que culmina em intensas cenas de desvelo dos segredos e de vulnerabilidade.

Também acompanhamos pinceladas em debates importantes como a aceitação dos gays na comunidade tailandesa, a falsidade das pessoas envolvidas no entretenimento e a própria identidade, tudo isso de forma sutil e, ao mesmo tempo, de uma força impressionante.

Acontece que pouco a pouco o sentimento de Wang e In vai crescendo até que ambos se dão conta do que está acontecendo, tendo reações diferentes. O simbolismo é muito bem usado em vários momentos, e eu poderia falar sobre isso por muitas linhas, mas seria exagero. Importante notar, no entanto, a beleza do simbolismo da ponte, do aperto de mãos, da divisória no quarto, das linhas que aparecem em diversos planos (seja de uma parede ou apenas uma linha imaginária entre os personagens em tela) que vão compondo o imaginário do universo apresentado na série.

Não há outro modo de dizer senão que 180 Degree Longitude Passes Throug Us entrou para a lista dos melhores BLs de todos os tempos, apresentando uma produção muito superior a muitas que estamos acostumados, numa obra completa que entregou tudo e muito mais do que havia prometido. Simplesmente imperdível e sensacional!

Nota: 10/10

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