terça-feira, 27 de agosto de 2024

Tipos de Pessoas

"Que critério adotar para julgar os homens? No fundo não havia uma só dessas pessoas conhecidas suas que não pudesse ser capaz de uma infâmia." (Marcel Proust)

Ainda tenho mais um dia de folga, mas é como se já pudesse sentir esse dia se esvaindo por entre meus dedos, já prevendo tudo que caíra sobre mim quando retornar. É como se esperassem que eu fosse feliz em dois dias da semana e no resto, como se minha alma tivesse sido vendida para o diabo sem minha permissão, e então sou obrigado a viver cada semana, e depois outra, e outra, e outra, numa tortura infernal, sem fim, preso num ciclo onde sempre há mais e mais que fazer, meu único pagamento é sempre mais o que fazer, mais o que argumentar, mais o que suportar em silêncio, a espera de um crescimento, de um progresso que nunca chega, nunca vem. Esses poucos dias de folga são apenas isso, uma breve pausa do inferno que são todos os dias. 

Não suporto os sorrisos, as falsidades, a obrigação de precisar ser simpático e parecer feliz com essas pessoas como se cada uma delas fosse importante por serem donas dessa ou daquela empresa. Eu desprezo essas pessoas, tenho um nojo real e genuíno por cada uma delas, por cada uma que espera que a vida seja sempre uma recepção regada a vinho e champanhe, com todos ao redor os servindo. E são todos assim, do funcionário ao visitante milionário tosco que é incapaz de entender o texto de uma criança mas que se acha o auge da realização humana por ter dinheiro, um dinheiro que ele conseguiu por não pagar as pessoas direito e por conseguir explorar várias brechas nas leis a ponto de ter algum lucro real. E são a essas pessoas que devemos respeito?

Não respeito ninguém que acha que, por ter mais dinheiro ou por estar comprando, se acha no direito de tratar o outro de qualquer jeito. São desprezíveis, e tenho um nojo real genuíno por essa gente. Não passam de pó, vidas que logo cessarão, e creem firmemente que o dinheiro deles vale de alguma coisa. 

Por isso prefiro dormir na minha folga, não pensar nessas pessoas, nesses lixos. Não pensar em como são desprezíveis e em como todos ao redor fazem o possível para tratar essa gente bem. Mas não passam de criaturas insignificantes, como eu, todos eles. 

X

Ia escrever num outro texto, tentando fugir da carga negativa que esse acabou criando. Em verdade eu realmente precisava colocar esse sentimento ruim para fora, já que amanhã precisarei voltar lá. Hoje estou descansando, e ignorando as mais de quinze mensagens que já recebi do trabalho. Enfim, assisti aos últimos episódios de Cosmetic Playlover que me deixaram inspirados, com o coração quentinho em meio aos 5° que têm feito esses dias por aqui. 

A atmosfera agradável, o companheirismo capaz de transmutar as ações: o apoio ao inseguro, a cumplicidade, a construção conjunta de uma vida lado a lado. Até mesmo a ambientação, os cenários calorosos em meio ao frio do outono japonês, os sorrisos de encorajamento. Enfim, o sonho do alguém que te acompanha, que fica ao seu lado, que se orgulha de suas vitórias, mesmo que sejam as mínimas. Percebe a diferença entre essas pessoas e aquelas que desprezo, sobre as quais me referi no conjunto passado?

Tentei, por breves instantes, assumir uma posição diferente, algo distante, sem me importar com o que sentem, sem buscar a ninguém. Cantei na missa de domingo de frente ao garoto que achava bonito e que me encantou por meses. Ainda continua bonito, mas estava ao lado da namorada, e eu não dei a mínima. Assim como sei, apesar dos dizeres de amor, a distância entre nós é mais do que apenas geográfica, também desisti de mudar isso. Apenas aceito, mas não sou indiferente: todo esse amor continua aqui, eu só não tenho mais a disposição para me declarar e me derramar como antes. 

Aliás, não tenho mais disposição para nada. Já é início de tarde. Minha folga está no fim. Engraçado como é normal trabalhar por semanas, mas folgar apenas por breves períodos de tempo. A vida é uma droga. Amanhã começa tudo de novo. 

Queria pintar as paredes, ou comprar uma máquina de café.

X

"Há alguma coisa em mim que não consigo controlar. Nunca dirijo meu carro por cima de uma ponte sem pensar em suicídio. 
Quero dizer, não fico pensando nisso. 
Mas passa pela minha cabeça: 
SUICÍDIO.
Como uma luz que pisca. 
No escuro. 
Alguma coisa que faz você continuar. 
Saca? 

De outra forma, seria apenas loucura. 
E não é engraçado, colega.
E cada vez que escrevo um bom poema, é mais uma muleta que me faz seguir em frente. 

Não sei quanto às outras pessoas, mas quando me abaixo para colocar os sapatos de manhã, penso, Deus Todo-Poderoso, o que mais agora?

A vida me fode, não nos damos bem. Tenho que comê-la pelas beiradas, não tudo de uma vez só. É como engolir baldes de merda.

Não me surpreende que os hospícios e as cadeias estejam cheios e que as ruas estejam cheias. 

Gosto de olhar os meus gatos. 
Eles me acalmam. 
Eles me fazem sentir bem. 

Mas não me coloque em uma sala 
cheia de humanos. 
Nunca faça isso comigo. 
Especialmente numa festa. 
Não faça isso."

(Charles Bukowski)

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