segunda-feira, 5 de agosto de 2024

Um pouco de caos

Um bom tempo olhando a página em branco, sem conseguir fazer a mente se concentrar em algo extático o suficiente, por um instante infinitesimal que seja, para registrar em palavras. Mas nada permaneceu, tudo se moveu, como um rio poderoso carregando tudo. Antes das nove da manhã já tinha feito uma conferência inteira sobre o sucesso do Fourth Nattawat e do Gemini Norawit do ponto de vista executivo da GMM TV e de como eles devem ser explorados daqui pra frente e as possibilidades para eles na indústria do entretenimento. Mesmo que ninguém tenha me perguntado nada disso. 

Marcel Proust descrevia as paragens de Combray na vinda para cá, fiquei tonto com a riqueza de detalhes de uma consciência infantil e apaixonada daquele modo. Ele, no entanto, não parece tomado da burrice própria dos apaixonados como eu. Por isso enquanto ele descrevia as paisagens, depois de certamente ter se alimentado delas, assim como se alimentou das consciências que descreve, eu apenas fazia minha conferência a um público imaginário.

Sábado é sempre um dia desgraçado. 

As pessoas se apinham nos ônibus apertados, de cara feia porque só uma pequena parcela da cidade trabalha no último dia da criação. Não sei se torço para que tenha algum movimento aqui ou para ficar quieto, as duas opções me parecem chatas. Uma é cansativa e a outra tediosa. Schopenhauer teria orgulho de mim. 

Ou talvez ficasse entediado.

Me sinto também despelado, naquela definição de Roland Barthes, no livro "Fragmentos de um discurso amoroso": "Sensibilidade especial do sujeito apaixonado, que o torna vulnerável, a mercê das mais leves feridas." 

Esse foi outro pensamento que me ocorreu. 

No player o caos de Stray Kids: eles mesmo dizem não é "chaos, we so catastrophic"?

Os vizinhos preparam uma festa que logo deve começar, já inflaram um castelo para as crianças pularem, o que é basicamente uma declaração de "não aguentamos crianças então contratamos um serviço tosco o bastante para distrair elas e não nos encherem o saco o dia todo."

Estão de cara feia para mim, ou talvez não, não sei ao certo, estou perdido demais para entender. 

Não importa. 

Talvez eu assista algo. 

Talvez tome um pouco daquela cachaça de Butiá que deixaram na cozinha. 

Espero que esse dia acabe logo, talvez amanhã eu posso tomar meus remédios e dormir um bocado em paz.

Paz.

Acho que é um dos poucos desejos que ainda tenho, e que me negam veementemente.

Trabalhe, seja saudável, seja inteligente, faça amigos, mas não seja intrometido, não faça amigos de mais porque isso é ser falso, seja recompensado com traições, solidão, ingratidão. Esteja disponível, "vista a camisa da empresa", seja pago com gratidão, mas não dinheiro, trabalhe aos sábados com um sorriso no rosto, participe de reuniões e responda mensagens em dia de folga. 

O trabalho dignifica o homem. Mas qual homem? Como não se revoltar com esses homens?

O sábado é sempre um dia desgraçado. 

"Em algum lugar dentro 
de mim
uma estranha 
confiança 
se erguia. 
as outras pessoas apenas não 
pareciam 
valer muita coisa 
para mim. 
eu circulava 
com esse
leve ar de desprezo 
no rosto..."

(Charles Bukowski)

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