terça-feira, 22 de maio de 2018

Do Vazio

Uma certa dor se alastra pelo meu corpo, a começar pelos músculos dos braços e pernas, e depois seguindo como uma chama até as pontas de meus dedos, retornando como um fluxo perdido ao meu coração, explodindo por fim às costas, como um shunko miserável que, ao invés de me dar força e poder, suga a minha existência, preenchendo o meu ser de desespero e da mais profunda sensação de incapacidade. 

Mais uma vez eu sinto a constatação de que meu amor é incapaz de tocar o coração de quem quer que seja ser impressa no meu corpo com fogo, ficando marcada em minha alma de forma mais profunda do que estão minhas tatuagens em minha pele. 

A antiga crença infantil e débil de que o amor tudo pode, tudo alcança, é hoje para minha consciência solitária um mito fantástico, onde o amor é como uma criatura que nunca existiu senão no imaginário fértil de um povo que não sabia como justificar aos seus as desgraças que lhe ocorriam constantemente. E ninguém nunca aceitou dizer o quanto essa crença pode destruir sonhos e esperanças, mesmo que todos tenham sido abandonados por esse mesmo amor um dia. 

Parecem desejar então que todos passem pelo mesmo sofrimento, de serem abandonados a própria sorte, a própria morte, em nome de um amor que nunca existiu senão nas páginas escritas por poetas e enamorados de todos os tempos, que o fizeram por estarem ainda iludidos, cegos, pelo amor que outrora os embriagava. 

O homem é solitário, e seguirá solitário até o dia em que a humanidade desaparecer do mundo, deixando apenas as marcas desesperadas de suas invencionices feitas para suprir o vazio deixando por essa mesma solidão inerente ao nosso coração e que perturba nossos ancestrais desde o primeiro pensamento. 

O que tem mais me incomodado é a falta de finais. Assim como as coisas que escrevo parecem terminam abruptamente, como se ficasse ainda uma lacuna no coração de quem lê, também há uma lacuna na historicidade dos amores. Talvez seja uma forma de mostrar o vazio que o tal amor deixa em nossas almas. Talvez seja só uma falha minha, ou talvez seja ainda parte da estrutura vazia que nós inventamos e demos o nome de amor.

Seja o que for, não passa de um grande buraco negro, que aos poucos vai crescendo e consumindo tudo o que há ao redor do nosso peito, até que  transforme o ser num imenso abismo, sem que haja algo lá no fundo, além do chão frio, onde repousaram os restos dos amantes carcomidos pelos vermes das ruínas.

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