terça-feira, 18 de junho de 2019

A fúria do estranho

Já há tempo demais me sentindo sozinho. Completamente sozinho. Abandonado. Sem encontrar nada mais do que exílio, no mundo. Já há tempo demais me roubam a solidão sem antes me oferecerem a verdadeira companhia, e isso não me oferecem. Apenas me oferecem barulho, barulho esse que, embora abafe os gemidos inefáveis de minha alma, não consegue fazer sumir as ânsias de amor que inflamam essa mesma alma.

As pessoas são para mim estranhas, todas elas. Não consigo compreender seus corações em absolutamente nada e, mesmo depois de anos de convivência, elas ainda me assustam com a sua incrível capacidade de nunca entender nada, por mais que seja dito. As pessoas são incapazes de enxergar algo que está bem a frente de seus olhos, e tenho certeza que eu também o sou. 

Algo escapa a minha percepção. Há algo que não consigo captar e por isso minha perspectiva é tão turva, incompleta, encoberta pela névoa da consciência que nos torna todos como estranhos desconhecidos numa terra de irmão. Minha visão desse limite de consciência não é mais do que absolutamente negativo. É essa consciência, é essa separação entre o eu e o outro, que me faz sofrer, sentir dor, em contato com o outro. 

Todas as minhas relações são, no mínimo, fugidias. As pessoas vem e vão, entram e saem, deixam marcas e levam consigo um pouco de mim, mas isso é tudo muito caótico. No fim do dia não há sequer um vislumbre de compreensão, no fim do dia não outra impressão senão a da mais profunda solidão. É horrível olhar como a um estranho a pessoa que caminha ao seu lado, que passa horas e horas debaixo do mesmo teto e que ri das mesmas piadas. É horrível saber que, a qualquer momento,  posso ser morto simplesmente porque não compreendem a minha existência. E pior ainda é saber que posso eu ser o assassino, por não compreender a existência do outro. 

E as pessoas vem e vão. Entram a passam. E todos usam máscaras. E eu não consigo ver mais do que as camadas de cerâmica sobre as suas faces. Nenhum contato com as suas almas. Será que eles as têm? Não consigo ver, muitas vezes, sequer traços de humanidade nestes, senão que a cada dia mais me convenço de que sim, viemos dos animais mas, ao contrário do que pensam, não evoluímos tanto assim. senão que aprendemos, algumas vezes como o faço agora, a dizer o quão aflitivo é saber que o outro, embora do meu lado, não é mais do que um estranho que caminha comigo. Caminha comigo mas não está comigo. Caminha comigo mas não me conhece. Caminha comigo mas não se deixa conhecer. 

Já há tempo demais venho me sentindo sozinho, e não vislumbro, no horizonte distante, nada que possa aplacar a fúria dessa realidade cruel. 

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