terça-feira, 25 de junho de 2019

Declaração

Eu não quero mais, cheguei no que acredito ser o meu limite. Todos os dias eu me deito na esperança de dormir e esquecer o vazio que me sufoca, e todos os dias eu permaneço acordado, horas e horas, sem que o vazio me deixe dormir. Todos os dias, já perdi a conta de quantas vezes, eu tenho pensando em deixar essa existência, pois ver o mundo girar ao meu redor e eu não saber o que estou fazendo da minha vida, não saber o que esperar do futuro, não saber sequer quem eu sou, me deixa em desespero. 

Fiquei olhando o pé de goiaba pela janela da sala por alguns minutos, enquanto procrastinava a enfadonha tarefa de corrigir gabaritos, e deveria me encantar com a bela visão que tinha. O sol brilhava intensamente nas folhas verdes, o vento soprava fresco sob meu rosto... Mas nada disso me conquistou, eu apenas fiquei ali, olhando aquilo, sem entender em nada qual o meu propósito nesse mundo. Claro que não estou fazendo as perguntas certas. Ora, esperava encontrar o sentido da minha existência num pé de goiaba? Não, não esperava, mas esperava que, no mínimo, o pé de goiabas não me ofendesse por saber e fazer exatamente o que ele é e foi feito para fazer: dar goiabas!

Kierkegaard disse que “se é uma vantagem, por exemplo, poder-se ser o que se deseja, maior ainda é sê-lo, ou seja, a passagem do possível ao real é um progresso, uma ascensão.” Mas eu não sei o que eu desejo, não consigo expressar o anseio que grita desesperadamente do meu âmago. Não consigo compreender o que quero tão loucamente que sinto-me curvar sob o peso de minhas próprias aspirações.

Enquanto isso continuo buscando, em qualquer lugar, significado, e nada tenho achado além de desespero...

Escuto músicas, e elas me fazem chorar, pois tenho me identificado com qualquer drama humano agora. Já que não compreendo os meus dramas eu busco nos dramas dos outros algum significado. Mas essas lágrimas não dão conta de me fazer sentir melhor, tenho chorado quase todos os dias, seja sozinho, no meio da rua, na loja de copos ou do lado da minha mãe, e nada de me sentir aliviado. 

Tenho buscado satisfações, e nada. Estourei o limite do meu orçamento várias vezes, só pra me sentir ainda mais vazio quando olho para meu armário ou para a estante de livros e vejo que nada ali pode me completar. Durante as noites, me tornei uma fera luxuriosa, mas nem as companhias da noite tem me feito sentir essa completude. 

E eu sou tomado por esse vazio, e passo a crer que o nada existe, e não só existe como oprime todo meu ser. Há em mim um vazio, e esse vazio me angustia, me sufoca, me pesa como se fosse uma bola de ferro quente sob meu peito. Esse vazio me aterroriza desde o primeiro pensamento do dia até o último, antes de ser tomado pela exaustão do trabalho e cair num limbo sem sonhos, pois até meu sono se tornou vazio. 

A única coisa que tem me feito sentir vivo atualmente é a dor. Tenho provocado a dor pois se posso sentir dor isso significa que estou vivo. Isso explica os cortes em meus braços, que se multiplicaram nos últimos dias, quando em cada vez sentia que começava a desaparecer provocava dor para me lembrar de que estou vivo. Cada gota que escorria de meu corpo era como uma declaração de existência. Sangue é vida e, se ainda há sangue a ser derramado, pode ser que ainda haja vida em mim, em algum lugar do meu coração apodrecido pelo vazio de uma solidão silenciosa, tenebrosa e maléfica. Cada gota de sangue foi usada para escrever em declaração "eu sou, eu existo" mas nem mesmo assim eu me convenci disso, aliás, me expressei de maneira equivocada, sei e estou consciente de minha existência, mas não sei qual o significado dela, não sei qual a razão de estar existindo e, principalmente, existindo de maneira tão patética. 

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